No começo de 2016, a Remedy Entertainment produtora de Max Payne e Alan Wake anunciou que o desenvolvimento de seu game mais ambicioso até então havia chegado ao fim, Quantum Break seria lançado em abril do mesmo ano com exclusividade para as plataformas da Microsoft (Xbox One e PC). O game é um shooter em terceira pessoa com algumas sessões de plataforma, quando foi lançado chamou a atenção por ser um projeto transmídia com nomes de peso de Hollywood e por contar com a orientação de um físico teórico na construção de sua trama baseada em viagens no tempo. Então não perca tempo, dê um stop no que esta fazendo e consiga uns minutos, pois vamos conhecer os conceitos científicos usados em Quantum Break.

Controlamos Jack Joyce (interpretado por Shawn Ashmore, o Homem de Gelo na franquia de cinema dos X-Men) que, depois de 6 anos, volta para sua cidade natal e se envolve em um acidente durante o teste de uma máquina do tempo criada por seu irmão William Joyce (Dominic Monaghan, o Charlie de Lost). O acidente causa a morte de seu irmão e expõe Jack às partículas cronons, que lhe conferem o poder de manipular o tempo ao seu redor. Também no acidente estava Paul Serene (Aidan Gillen, o Mindinho de Game of Thrones), ex-melhor amigo de Jack, que também ganha poderes de manipular o tempo, além de precognição. Paul tem uma visão do fim dos tempos desencadeado pelo acidente, o qual, segundo ele, ocasionou a “quebra do tempo”, com isso ele cria a Monarch Solutions, empresa que tem como objetivo salvar uma pequena parcela da humanidade, não importando os meios para isso. Paul diz que o fim de tudo no futuro é inevitável, não importando o que se altere no passado. Já Jack tem uma visão diferente e viaja pelo tempo fazendo alterações para mudar o futuro.

Durante o game acompanhamos o ponto de vista de Jack que viaja no tempo tentando mudar o futuro, sempre confrontando os soldados da Monarch com suas habilidades que incluem congelar o tempo, criar um escudo que evita danos, acelerar o tempo e ficar mais rápido, além do famoso bullet-time. Entre cada capitulo do game, assistimos a um episódio de 22 mins com os atores reais, em que temos o ponto de vista do vilão Paul e ao final precisamos tomar decisões que afetarão a narrativa do game.

Shawn Ashmore interpreta Jack Joyce, a melhor escolha do elenco eu diria, já que o protagonista pode “congelar” o tempo (Haha)

Em várias entrevistas os produtores do game falavam orgulhosamente que a trama teve consultoria de um físico teórico, nesse caso o físico é Syksy Räsänen que trabalhou no CERN (o maior laboratório de física de partículas do mundo) e atualmente é professor na Universidade de Helsínquia na Finlândia.  Com essa consultoria, os desenvolvedores se basearam em elementos da física para criar a história, mais especificamente, foram usados os conceitos de buracos negros, física de partículas e o principio da autoconsciência de Novikov, claro que um pouco mais extrapolados como em toda ficção-científica. Então vamos por partes, entendendo como cada conceito desses é aplicado no game.

O físico Syksy Räsänen (Aliens?)

O irmão de Jack, Wiliam, constrói uma máquina do tempo que basicamente possui um buraco negro como núcleo. Esse buraco negro distorce o tempo dentro da máquina, o que faz com que quem esteja dentro dela viaje no tempo, tanto para o passado como para o futuro. Primeiramente vamos esclarecer uma coisa, é possível sim viajar no tempo, mas só para o futuro, não para o passado. Mas como isso? Vamos conhecer um pouco da teoria da relatividade de Einstein.

Segundo essa teoria, o tempo é relativo, ou seja, ele pode “passar” mais rápido ou devagar se alguma coisa o influenciar (Seria essa a resposta do porquê aqueles últimos minutos no trabalho em uma sexta-feira parecerem nunca terminar?). A velocidade é uma delas, quanto mais rápido se está, mais o tempo passa devagar, claro que só sentiríamos uma grande diferença quando começássemos a chegar próximo a velocidade da luz, 300 mil km/s, velocidade bem acima do que já atingimos e principalmente bem mais do que um ser humano aguentaria. Diversos experimentos já provaram essa teoria, inclusive com humanos, foi o caso dos gêmeos Kelley, os dois, astronautas da NASA. Scott Kelley ficou na Estação Espacial Internacional (que se move a velocidade de 7,66 km/s) durante um ano enquanto seu irmão Mark ficou na Terra. Quando Scott retornou do espaço se observou que ele estava um centésimo de segundo (1/100) “mais novo” que Mark, ou seja, ele comprovadamente viajou para o futuro, foram apenas alguns milissegundos, mas que provaram a teoria.

Já vimos que o tempo não é absoluto, podendo ser influenciado por altas velocidades, porém a gravidade também pode influenciar o tempo. Corpos celestes com muita massa (matéria) geram campos gravitacionais que alteram o espaço e o tempo a sua volta. Buracos negros possuem um campo gravitacional tão forte que até mesmo a luz não consegue escapar desse campo. Em teoria, se alguém saísse da Terra e ficasse alguns minutos próximo a um buraco negro (evitando ser “engolido” por ele) o tempo passaria mais devagar para essa pessoa e assim que ela voltasse à Terra, anos teriam se passado, desse modo essa pessoa teria viajado para o futuro. Esse conceito foi muito bem usado no filme Interestelar (2014), mostrando como o tempo pode passar de forma diferente em diferentes gravidades. Porém, como o exemplo anterior, a viagem no tempo só é possível em direção ao futuro.

De volta ao game, a máquina construída por Wiliam possui um buraco negro que distorce a gravidade a sua volta, com isso o tempo dentro da máquina passa mais “devagar” do que o tempo de fora, fazendo com quem esteja dentro da máquina viaje para o futuro. Aqui os desenvolvedores tomaram uma liberdade e extrapolaram esse conceito, fazendo com que a viaja no tempo também fosse possível em direção ao passado, além do fato de que no game o buraco negro é “estabilizado”, já que na vida real esse buraco negro consumiria tudo a sua volta, inclusive a Terra. Essa viagem no tempo é mostrada no game com o personagem andando por um corredor, isso é simplesmente uma liberdade artística, pois a ação de uma buraco negro sobre alguma coisa é a mesma, estando essa coisa parada ou circulando ao seu redor.

Outro ponto interessante visto no game são as habilidades que os protagonistas ganham ao serem expostos as tais partículas cronons. Essas partículas são fictícias, os desenvolvedores foram encorajados a criar suas próprias partículas depois de ouvirem a explicação do físico Syksy Räsänen sobre o ramo da física que estuda os constituintes elementares da matéria e da radiação, além da interação entre elas, a física de partículas. Elétrons, prótons, nêutrons, fótons e neutrinos fazem parte das partículas estudas por esse ramo, porém foram nos bósons que os desenvolvedores se inspiração para criar as cronons, mais precisamente no bóson de Higgs.

Para tudo! Partículas cronons não existem?

No inicio do desenvolvimento do game, por volta de 2013, o bóson de Higgs estava em alta, pois recentemente havia sido comprovada sua existência através do LHC (Grande Colisor de Hádrons) no CERN. Mas, ao contrário das cronons, que conferem habilidades aos protagonistas do game, o bóson de Higgs respondeu a uma das grandes perguntas da física quântica: Por que certas partículas possuem massa, como o elétron e outras não possuem, como o fóton? E como elas ganham massa?

Após o Big Bang, parte da energia liberada se congelou e formou um éter que envolve o universo todo, chamado de campo de Higgs, do qual o bóson faz parte. Partículas dentro desse campo estão expostas a ação do bóson que, quando passa entre elas, gera efeitos de atração e repulsão, então as partículas com afinidade entre si se combinam, gerando os átomos, a unidade básica formadora de matéria. O bóson de Higgs pode não ter efeitos tão “legais” quanto as cronos, mas certamente não deixa de ser fantástico pela sua ação na criação de todo o universo. Se quiser se aprofundar no tema, recomendo o excelente SciCast #275 sobre Física de Partículas.

Durante o game, Paul Serene tenta convencer Jack de que nada do que ele mudar no passado irá alterar o futuro, já que, segundo ele, o tempo é imutável. E nas várias “fases” que controlamos Jack, realmente nada do que fazemos altera o futuro, na verdade, muitas das nossas próprias ações são o que desencadeiam o futuro que o protagonista tanto quer evitar, isso é baseado no Principio da Autoconsciência de Novikov.

O físico russo Igor Novikov propôs esse principio durante a década de 1980 para resolver os paradoxos gerados por uma possível viagem no tempo. Quando falamos de viagem no tempo, existem aquelas em que alterações no passado mudam o futuro, como vemos em De Volta Para o Futuro (1985), outras em que alterações do passado criam diversas linhas de tempo (realidade) como em X-Men: Dias de um Futuro Esquecido (2014) e há outras em que o futuro não pode ser mudado, O Exterminador do Futuro (1984) é um exemplo. No filme vimos Jonh Connor mandar Kyle Reese para proteger sua mãe Sarah Connor no passado, mas o que acontece é que Kyle e Sarah se relacionam, então Sarah engravida de  Jonh. Esse é o Principio da Autoconsciência de Novikov: se existe algum evento que possa criar um paradoxo, a chance de esse evento ocorrer é zero. Quantum Break explora bem esse principio e consegue passar os sentimentos de frustração e impotência, já que somos nós que controlamos as ações de Jack, as quais não surtem efeito no futuro.

Viagens no tempo ainda serão vistas novamente nessa coluna

Então é isso pessoal, chegamos ao fim de mais texto. Espero que tenham gostado. Quantum Break é mais um excelente game da Microsoft, recomendado para quem gosta de uma boa história de ficção-cientifica, além de uma boa dose de ação. O espaço dos comentários esta logo ai abaixo para criticas, elogios e sugestões. Até a próxima. Abraços.

Fontes: IGN, Wired, Wikipedia, Inquisitr, The Verge e The Washington Post