Oi. Sou o Leo. Talvez você já tenha visto alguns textos meus aqui no Deviante falando sobre Física. Neste texto, dividido em 2 partes, resolvi abordar historicamente o que chamamos de “Primórdios da Teoria Quântica”, ou “Velha Mecânica Quântica”, ou o início dessa teoria meio “bizarra” que estudamos, e que também já foi abordada em outros textos no portal (ver: Texto #6 de Kura Quântica (links para os demais no #6), Textos do Emerson Souza, Textos do Junior Koch). Portanto, minha ideia é mostrar alguns marcos históricos importantes para que esta teoria fosse construída.

Interessante notar que grande parte do que mostrarei não era de fato uma TEORIA, mas um apanhado de resultados, tanto experimentais quanto teóricos, sendo que estes últimos, em geral, eram “apenas” testes de hipóteses, tentando modelar (sem uma TEORIA de fato) os resultados experimentais que existiam.

Diferentemente de outros textos, este será feito em forma de tópicos, e ao final deixarei muitas (MUITAS) referências para que a pessoa que se interessar possa ir mais a fundo. Não sei se vai dar certo, mas vou testar este tipo de texto! :)

Ah sim, e o título está relacionado à música “Too old to rock and roll, too young to die”, de Jethro Tull.

Enfim, vamos lá! :)

  1. Mecânica Quântica: uma cronologia simplificada
    • A Teoria Quântica se iniciou com Max Planck, em 1900, com seus trabalhos sobre Radiação de Corpo Negro.
      • todos os corpos que possuem alguma temperatura emitem radiação. Por exemplo: você!
        • E sabe o que o TERMÔMETRO DE TESTA faz? Mede a radiação que VOCÊ emite. Então para com essa palhaçada de medir temperatura no pulso usando termômetro infravermelho e mede no lugar certo: NA TESTA. A radiação é você que está emitindo. Larga de bobagem (ver vídeo do manual do mundo no final do texto).
      • chamamos de ESPECTRO de radiação de um corpo a curva da Radiância pela frequência, ou seja, basicamente a quantidade de ENERGIA que um corpo emite como radiação em função da frequência dessa radiação.
      • mas existem alguns corpos (idealizados, mas talvez nem tanto) que exibem um tipo de curva de espectro que depende somente da frequência e da temperatura do corpo, estes são os chamados “corpos negros”.
      • exemplo: Sol, lâmpada incandescente, ferro aquecido, carvão em brasa ou uma cavidade com um buraquinho.
      • a teoria clássica retornava um resultado absurdo, que todos os corpos emitiriam energia infinita (o que seria bom para o problema energético, mas péssimo porque não existiria nada!): a catástrofe do UV (ultravioleta)! Um ótimo nome, mas um resultado horrível!
      • Planck sugeriu então que a interação da radiação (Luz) com a matéria (elétrons, por exemplo) não se dava de maneira contínua, mas que a Energia da radiação se comportava em “pacotes”: com isso Planck conseguiu “consertar” a catástrofe do UV.
    • Em 1905, o jovem Albert Einstein teve aí seu “annus mirabillis”, no qual, entre outros assuntos, estudou o Efeito Fotoelétrico.
      • Efeito fotoelétrico: a gente incide Luz numa placa de metal e observa a corrente que é gerada pela incidência dessa Luz.
      • Mas e daí? Placas solares funcionam assim, né? Pois é…
        • na teoria clássica, qualquer “cor” de Luz poderia ejetar elétron de uma placa, desde que o brilho (a intensidade) da Luz fosse forte o suficiente.
        • porém, foi observado que para algumas determinadas placas existe uma “cor” mínima, ou uma frequência mínima, da Luz incidente para que houvesse corrente sendo gerada.
      • Einstein então ampliou a hipótese de Planck, sugeriu que a radiação (Luz) era composta por quanta, partículas de Luz, resolvendo assim (fenomenologicamente) o problema do Efeito Fotoelétrico.
      • Por que fenomenologicamente? Pois era uma tentativa de hipóteses para resolver fenômenos sem uma TEORIA, sendo uma TEORIA, aqui, no sentido de dar uma descrição dinâmica para o problema.
    • Em 1913, Niels Bohr anuncia seu modelo atômico, baseado no modelo de Rutherford.
      • No modelo de Bohr (para o átomo de hidrogênio), os elétrons giram em órbitas circulares ao redor do núcleo.
      • As órbitas são quantizadas, somente algumas órbitas podem ser usadas pelo elétron (tipo no atletismo em provas de 400m em olimpíadas, os corredores não podem “mudar de raia”).
      • Um adendo técnico: na verdade, o que Bohr postulou foi a quantização do momento angular.
      • Para um elétron pular de uma órbita para a outra, ele deve emitir Luz (para pular de órbita mais externa para mais interna) ou absorver Luz (para pular de órbita mais interna para mais externa).
      • MAS, a quantidade de Luz que o elétron deve absorber também está relacionada aos pacotes de Planck.
      • Com essa teoria semi-clássica, Bohr conseguiu fornecer razoavelmente bem o espectro de emissão/absorção de radiação do Hidrogênio.
      • Semi-clássica: a teoria usava elementos de Mecânica Clássica, mas também hipóteses de quantização.
    • Em 1925, Werner Heisenberg, Pascual Jordan e Max Born introduziram um formalismo matemático novo (mas consistente lógica e formalmente) para descrever a nova mecânica dos átomos: a Mecânica Matricial.
      • A interpretação deste formalismo é que as quantidades fisicamente observáveis (Energia, Momentum, Posição, etc.) são descritas por MATRIZES que dependem do TEMPO (!!!).
      • Este formalismo, apesar de abstrato (MESMO PARA PADRÕES DE FÍSICA QUÂNTICA!!!) reproduz com muita precisão o espectro de radiação atômico.
      • Com essa Mecânica Matricial, Heisenberg propõe o seu famoso Princípio de Incerteza.
  2. Princípio de Incerteza (KATCHIN para um texto específico sobre Princípio de Incerteza)
    • Existe o que chamamos de Princípio de Correspondência, que nos diz como relacionar quantidades clássicas, tipo Energia, Momentum (Velocidade), Posição, etc. Com estas matrizes, ou operadores, que a turma do Heisenberg trabalhava.
    • Daí podemos associar a cada uma dessas matrizes, ou operadores, alguma dessas quantidades… chamamos estes operadores que são observáveis de Operadores Hermiteanos — este é um aspecto MUITO técnico… para quem (ainda) lê o texto, podemos pensar somente que há uma correspondência entre objetos matemáticos na Teoria de Heisenberg e também no que fazemos os experimentos.
    • Então, existe uma regrinha matemática (não comutação de matrizes) que nos fala que se multiplicarmos duas matrizes, a ordem dos fatores pode alterar o produto… ou seja, é diferente multiplicar a matriz A por B em relação a B por A.
    • Desta regra de comutação de matrizes, da multiplicação ser diferente se AB ou BA, é possível deduzir o famoso Princípio de Incerteza de Heisenberg, o mais famoso sendo o Princípio de Incerteza Posição-Momentum:

      Figura/Equação: a incerteza no Momentum (p) vezes a incerteza na Posição (x) é maior ou igual a h cortado dividido por 2. Onde h cortado, ou h barra, é a constante de Planck dividida por duas vezes pi.

    • Mas qual o significado do Princípio de Incerteza?
    • O Princípio de Incerteza NÃO quer dizer que é impossível saber a posição e a Velocidade, como é visto em muitos filmes/sites de pseudociência.
    • Quer dizer que: devido ao fato de os operadores não comutarem, ao tentarmos realizar a observação de Posição e Velocidade/Momentum, existe um limiar de incerteza em observações simultâneas dessas quantidades, dada basicamente pela constante de Planck por 4 Pi.
    • É possível medir a posição com precisão infinita, ou seja incerteza zero? SIM, desde que tenhamos precisão nula com relação ao observável Momentum (“Velocidade”).
      • Por exemplo, existe um tipo de Luz que se chama “Luz Comprimida”, com a qual se “fabrica” um tipo de laser, que tem uma incerteza muito pequena na “posição”, na verdade em uma das quadraturas do campos eletromagnético, mas se perde no Momentum. Este tipo de Luz Comprimida tem sido muito usada, por exemplo no LIGO para melhorar a detecção de ondas gravitacionais.
      • Podemos também medir a posição em x, por exemplo, com exatidão, e saber o Momentum em y. O que o Princípio de Incerteza te conta é sobre podermos medir o que a gente chama de variáveis conjugadas.
    • Em geral chamamos operadores que comutam de COMPATÍVEIS, e os que não comutam de… Não–compatíveis… faltou criatividade nessa aí.
    • Mais do que isso, o Princípio de Incerteza não nos IMPEDE de realizar medidas muito precisas em Física Quântica, pelo contrário, ele dá um caminho interessante até para interpretarmos alguns fenômenos.
    • Conclusão#1: o Princípio de Incerteza não tem NADA A VER com o que se fala, com “a Mecânica Quântica não te dar resultados exatos”, que “tudo é incerto”, blá blá blá. O que ele te diz é que não podemos medir SIMULTANEAMENTE e com precisão INFINITA, duas dessas quantidades, como posição e Momentum. Mas o que o Princípio de Incerteza nos diz é que, sim, é possível medir estas quantidades com um certo limite de precisão. Para quantidades observáveis que COMUTAM é possível medir simultaneamente e com precisão infinita (claaaaro, dadas as condições experimentais que se possui).
    • Sobre o Princípio de Incerteza Energia-Tempo:
      Figura/Equação: para realizar uma transição de Energia Delta E, num tempo Delta t, precisamos respeitar este Princípio de Incerteza.

      Figura/Equação: para realizar uma transição de Energia Delta E, num tempo Delta t, precisamos respeitar este Princípio de Incerteza.

      • Apesar do “formato” muito parecido, não podemos confundir com o Princípio de Incerteza Posição/Momentum, pois ele diz respeito ao tempo necessário para um certo sistema fazer uma transição de Energia de E.
      • Por exemplo, no modelo de Bohr para o átomo de Hidrogênio:
        • As órbitas são estáveis (ou mesmo para os orbitais no modelo de Schrödinger), e NÃO era para o elétron realizar um salto espontaneamente para a órbita mais interna (emissão espontânea).
        • Mas isso não vai contra o Princípio de Incerteza acima? Não, pois se a órbita é estável, E=0 e portanto t→ ∞.
        • De fato, ocorre emissão espontânea devido à interação do elétron com o vácuo quântico.
    • Observação final sobre Princípio de Incerteza: este princípio não vale só para posição, momentum, energia e tempo. Vale para qualquer coisa que podemos observar, desde que estes operadores não comutem.

E aqui decido parar com a Primeira Parte dessa cronologia. Parabéns se você conseguiu chegar até aqui, e se ficou curiosa ou curioso, peço pra aguardar a Parte 2! :)

Como eu disse no início, este texto seria em forma de tópicos, então não proponho uma conclusão, ou mesmo uma análise mais profunda de cada tópico. Deixo várias sugestões de livros, vídeos e até games no final do texto para caso alguém queira aprofundar mais.

O intuito deste texto era este: fazer uma cronologia do início da Mecânica Quântica até o Princípio de Incerteza, talvez mostrar o tanto que aparentou ser (e talvez foi?) bagunçado, mas que gerou e tem gerado muita tecnologia para a sociedade. E mais que isso, gerou uma quebra de paradigma completa na ciência.

Forte abraço.

Leo.

———————————-

Sugestões de literatura:

FEYNMAN, Richard Phillips. Física em 12 lições. Ediouro Publicações, 1999.
GREENE, Brian. The fabric of the cosmos: Space, time, and the texture of reality. Knopf, 2004.
HAROCHE, Serge; RAIMOND, J.-M. Exploring the quantum: atoms, cavities, and photons. Oxford university press, 2006.
ROVELLI, Carlo. A realidade não é o que parece: a estrutura elementar das coisas. Objetiva, 2017.
HAWKING, Stephen. Uma breve história do tempo. Editora Intrinseca, 2015.
HAWKING, Stephen. O universo numa casca de noz. Editora Intrinseca, 2016.
GLEISER, Marcelo. A dança do universo: dos mitos de criação ao Big-Bang. Editora Companhia das Letras, 2006.
JUNIOR, Osvaldo Pessoa. Conceitos de Física Quântica 1. Editora Livraria da Fisica, 2003.

———————————-

Sugestões de artigos científicos e de revisão:

Original de Planck (1)

Original de Planck (2)

Annus Mirabillis de Einstein

Artigo original de Bohr sobre seu modelo atômico

Mecânica Matricial

Artigo sobre Luz comprimida no LIGO(1)

Artigo sobre Luz comprimida no LIGO(2)

Artigo original de Schrödinger

Como pronunciar Schrödinger

Vídeo com experimento real de fenda dupla com elétrons

Sobre o Mar de Dirac

Artigo sobre a interpretação de Copenhagen: Balsas, Álvaro M. R., Videira A. (2013). “Truth by fiat: the Copenhagen Interpretation of Quantum Mechanics”, Revista Brasileira de História da Ciência 6, 2: 248 – 266.

Bringing home the atomic world: Quantum mysteries for anybody

Mapa das interpretações da Física Quântica (Osvaldo Pessoa Jr)

———————————-

Sugestões de filmes e série:

Dark, Netflix
Tenet, Christopher Nolan
Rick&Morty, desenho, Netflix
Cosmos (Sagan ou deGrasse Tyson), Netflix (???)

———————————-

Sugestões de vídeos:

Radiação de corpo negro
Manual do Mundo (termômetro de TESTA)
Princípio de Incerteza 1
Princípio de Incerteza 2
Princípio de Incerteza (Veritasium)
Princípio de Incerteza (Walter Lewin)

———————————-

Sugestões de podcasts:

Scicast #152 Física Quântica 1
Scicast #165 Física Quântica 2

———————————-

Sugestão de games:

The Quantum Game
Quantum moves 2
Sprace Game