Lembro que conheci a história em quadrinhos the walking dead (TWD) após ter assistido a primeira temporada da série de televisão de mesmo nome e ter achado extremamente interessante a proposta de um grupo de pessoas sobrevivendo a um apocalipse zumbi. Apesar de ter gostado das primeiras temporadas da série acho que a HQ é superior à série de televisão. A leitura será muito prazerosa para quem já gosta da série, além de servir como uma boa entrada para quem quer começar a ler quadrinhos.

Inicialmente gostaria de fazer a diferenciação de uma história que tem zumbis como tema principal com a história de TWD. Você pode estar se perguntando: mas TWD é uma série sobre zumbis, pois eles aparecem em todos os episódios da série além de possuírem papéis importantes em vários momentos da trama, matando personagens importantes além de moverem a história e … calma jovem…irei explicar o meu ponto comparando com os jogos e filmes do resident evil que possuem zumbis como tema principal de sua história. Quem jogou os jogos do resident evil sabe que uma das coisas mais legais dos jogos eram os zumbis em suas diferentes formas: humanos, cachorros, aranhas, corvos, vermes e etc… além do fato de um dos personagens mais icônicos da série ser o zumbi nemesis munido de sua bazuca.

S.T.A.R.S

S.T.A.R.S

Trazendo esse raciocínio para o TWD, qual é o zumbi marcante da série? Quais os diferentes tipos de zumbis que vemos no decorrer do plot? E eu respondo, não existe nenhum tipo de super morto-vivo na história, e não existe qualquer outro tipo de zumbi que não seja humano, e digo mais, o próprio traço usado para fazer os desenhos dos zumbis faz com que todos sejam muito parecidos para que não exista qualquer tipo de diferenciação ou destaque para qualquer um deles. Os mortos vivos de TWD só possuem a função de destruir a sociedade como a conhecemos para que a seguinte pergunta possa ser feita: quando tiramos o ser humano da civilização nós também tiramos a civilidade do mesmo? Ou em outras palavras, como os humanos se comportam em uma situação extrema e até onde estão dispostos a chegar para se manterem vivos. Esta é a verdadeira temática de TWD.

O fato de mudar os holofotes dos zumbis para as pessoas não faz da história necessariamente melhor, mas nos proporciona um ponto de vista diferente da maior parte de histórias presentes na cultura pop envolvendo zumbis. Robert Kirkman (escritor das HQs e produtor da série de televisão)  chegou a brincar com esse conceito no final de uma revista onde ele nos presenteia com algumas páginas mostrando como TWD seria se ao invés de zumbis a história mostrasse uma invasão extraterrestre, evidenciando assim que os zumbis não são essenciais para a história. O essencial é que exista um fator que deixe os personagens em uma situação extrema para sobreviver, ele poderia ter escolhido como fator uma guerra, uma invasão extraterrestre (como vimos em guerra dos mundos), ou qualquer outra coisa, porém ele preferiu usar mortos-vivos como pano de fundo para sua história.

ETs e zumbis

Entendendo a temática da série podemos entender melhor as escolhas narrativas feitas pelo autor. Utilizar Rick Grimes como um dos pontos focais da história se mostra uma escolha muito inteligente, pois estamos vendo um policial em ação que tem o treinamento certo para manusear armas de fogo além de possuir a habilidade de conduzir situações que deixariam a maior parte das pessoas desnorteadas, dando uma maior verossimilhança para a história quando Rick precisa fazer um grande feito para deixar os membros de seu grupo em segurança. Além do fato da escolha de um policial para conduzir a história acaba tendo um grande valor metafórico, pois Rick acaba sendo um símbolo que representa o ser humano provido de todos os traços da civilização (pagador de impostos, cumpridor da lei, protetor da sociedade contra criminosos) para mostrar que até as pessoas tidas como as mais virtuosas sofrem com dilemas morais e são capazes de fazer o impensável  quando a sua sobrevivência está em jogo.

Carl, filho de Rick, também é fundamental para a história, pois ele dá uma motivação extra para que Rick tente lutar por uma vida mais segura para as pessoas envolvidas na trama, além de mostrar o que um pai está disposto a fazer para que o seu filho fique em segurança. O que eu mais gosto em Carl é o fato de como ele amadurece rápido com o passar do tempo chegando a parecer um “pequeno adulto” em vários momentos da história, mostrando assim o que um ambiente extremamente perigoso pode fazer com a mente de uma criança, além de fazer nos indagar sobre que tipo de adulto uma criança nessas condições vai se tornar. Dessa forma temos a visão de alguém que cresceu em um ambiente “normal” (Rick) e a visão de alguém que quase não lembra mais como era esse mundo anterior aos zumbis e que cresceu em um ambiente em que a sobrevivência é um tema diário (Carl).

Criança comum do mundo pós apocaliptico

Criança comum do mundo pós apocaliptico

Depois de um tempo o ser humano vai se adaptando as condições desse novo mundo e os choques entre diferentes grupos de pessoas, por causa dos mais variados recursos, se torna algo inevitável. Acabamos por ver que o ser humano é o maior perigo deste novo mundo e que em muitas ocasiões eles são mais impiedosos que os próprios mortos-vivos. Eu sei que deixei quase todos os personagens da história de lado, porém o que eu queria era dar uma visão geral sobre a história e falar sobre os dois principais personagens.

TWD é um quadrinho muito adulto e trata de temas muito interessantes para a sociedade como um todo, então essa história é para você que nunca leu quadrinhos e achava que essa mídia se resume a turma da Mônica e a super seres com cueca por cima da calça. Também é muito indicada para as pessoas que já tem o hábito de ler HQs e que gostam de histórias com temáticas não tão convencionais. O grande ponto negativo fica por conta do desenho feito por Charlie Adlard que somado com o fato da revista ser toda em preto e branco faz com que em algumas cenas tenhamos dificuldade de identificar os personagens envolvidos em cada quadro da história além de gerar cenas esteticamente muito feias chegando a dar a impressão que o desenho foi feito com muito desleixo, porém este fator por si só não elimina todas as qualidades que a revista nos apresenta.