Um personagem muito comum das novelas e filmes mostrando os hábitos das classes altas, pelo menos até os anos 90, é o motorista da família. Comumente eles também são chamados de choffer que é derivada da palavra francesa “chauffeur”. Ainda que esta profissão exista apenas para um seleto grupo de pessoas, ela tem se tornado cada vez menos comum em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Ainda que a profissão esteja caindo no desuso, aparentemente podemos aprender certas particularidades de pessoas e famílias com motoristas particulares para prever o que pode ocorrer no futuro.

O motorista da família era um personagem comum em filmes antigos.

Parece estranho, não? Se está caindo em desuso por que seriam utilizados para prever o que ocorrerá no futuro?

Aqui começa a parte interessante. Certamente o grande assunto na área do transporte metropolitano são os veículos completamente automatizados ou autônomos, como já comentado em um texto anterior sobre este tema. Por um lado, é esperado que a inteligência e tecnologias embarcadas no veículo levarão a um uso mais eficiente das vias. Isto é, gastaremos menos tempo para que a mesma quantidade de pessoas e veículos consiga alcançar os seus respectivos destinos. Por outro lado, o congestionamento pode ficar muito maior porque as pessoas podem decidir realizar mais viagens, uma vez que as comodidades destes veículos farão viagens longas não parecerem tão longas assim.

Veja hoje em dia. Por mais que o carro nos dê uma flexibilidade (e claro, gostaríamos que o transporte público também nos desse), nós tomamos diversas decisões cotidianas que estão relacionadas a nossa capacidade de nos deslocarmos. Por exemplo, é interessante que a escola dos filhos ou o local de compra de alimentos seja no caminho do trabalho. Por vezes, mudamos de casa para estar conveniente no centro da cidade ou perto do local de trabalho e por aí vai. Certamente fazemos isso porque não é legal dirigir 1h30 para o trabalho todo dia.

No entanto, com veículos completamente autônomos, não precisamos nos preocupar em dirigir. Nós podemos trabalhar no caminho ao trabalho. Podemos até mandar o nosso carro buscar nossas compras no mercado ou buscar os filhos na escolha da mesma maneira que pessoas abastadas solicitam ao chofer da família. Opa, falei de chofer novamente. Aqui está o ponto de similaridade entre chofer e o que pode vir no futuro: os veículos autônomos servirão literalmente como um chofer para todos nós. 

Se é tão similar, não seria o caso de observar o que as pessoas fazem com e sem um chofer particular para tentar prever o que ocorrerá num futuro próximo? É nessa similaridade que pesquisadores nos Estados Unidos fizeram um experimento com chofer. Eles coletaram o padrão de viagens de um certo número de voluntários durante um período. Isto inclui a que horas e como vão ao trabalho, realizam compras, etc. Logo depois, um chofer particular foi oferecido a estas pessoas durante uma semana sem qualquer custo.

Eles poderiam solicitar o que quisessem para o chofer particular desde que fosse relacionado ao cotidiano deles. Isto incluía viagens que os voluntários não necessitavam estar no veículo como por exemplo buscar amigos na casa deles para uma festa em casa, buscar compras, dentre outros. Por sinal, este tipo de viagem é um dos grandes temas em torno dos veículos autônomos porque poderiam levar a um aumento brutal da demanda já que poderíamos colocar veículos nas ruas por motivos banais como, por exemplo, dirigir ao trabalho e estacionar o carro em casa, duplicando assim o total de distância percorrida.

E qual foi o resultado? Sim, aparentemente vamos viajar muito mais com veículos autônomos. As conclusões do estudo foram as seguintes:

  • a distância percorrida aumentou em 81%;
  • ainda que para algumas pessoas não houve aumento significativo da distância total percorrida (o mínimo aumento foi de 4%), o maior crescimento observado foi de uma pessoa aposentada cujo aumento foi de 341%. Isto pode dar uma de cenário de pior-caso relacionado a esta tecnologia;
  • em torno de 34% do aumento foi relacionado a viagens em que os voluntários não estavam presente. Isto inclui “enviar” o seu carro para buscar compras ou para buscar/levar outras pessoas para diferentes atividades (por exemplo, buscar convidados em suas respectivas casas para um jantar na casa dos voluntários);
  • 21% do aumento da distância total percorrida foi relacionada a viagens “sem passageiros” (isto é, só havia o motorista dentro do carro).

Em resumo, provavelmente vamos fazer mais viagens e estas viagens serão mais longas. Se esta tecnologia não prover melhorias ao funcionamento do tráfego, o congestionamento pode ficar muito maior. Neste caso, o aumento do tempo total de viagem seria bem maior do que o aumento de 81% na distância total. Portanto, não sabemos se dias melhores virão…

E você, leitor, o que faria se tivesse um chofer ou um carro autônomo que você pudesse usar como bem entendesse? 

O estudo está publicado neste link.

Figura no texto retirada desta página.

Figura de capa retirada desta página.