Márcio Danelon apresenta, em “As características do educador: uma leitura nietzschiana à luz de Schopenhauer como educador”, a relação entre Filosofia e ensino como elemento central. Considera, assim, a importância da primeira para conferir sentido à segunda. Nesse sentido, destaca que a contribuição filosófica é dada pelos filósofos para que assim possamos pensar a educação.

Se adicionarmos o trabalho de Andrea Genis, “El gênio y lo genuino que hay em nosotros, vigencia del pensamiento educativo em Nietzsche”, essa ideia fica mais clara. Isso porque a autora sinaliza a existência de um certo grau de preocupação com a educação inserida nas obras do alemão além de ser possível encontrar em “Schopenhauer como educador” toda uma caracterização do gênio, aquele de onde tender toda a educação em seus níveis mais altos. Mas também, aquele que tem uma função social norteadora.

Um primeiro contato com essas afirmações pode produzir alguma repulsa e muito por conta do entendimento que a pós-modernidade e a contemporaneidade atribuíram à ideia de genialidade, mas também porque Nietzsche deixa transparecer a ideia de uma aristocracia espiritual que comporta somente poucos representantes. No entanto, esse lugar de poucos é passível de extensão a todos por intermédio da promoção da autenticidade, isto é, o genuíno em cada indivíduo. Assim, sua concepção sobre a educação ganha ares, grosso modo, de libertação. Reforçam essa ideia as críticas ao ensino de massas e ao papel do Estado como educador. A ele interessa justamente a singularidade, a qual deve ser ascendida pela educação, em detrimento da massificação. Em outras palavras, cultura e educação devem ser capazes de fazer aflorar a individualidade.

O século XIX figura como um ponto de inversão dos valores – os “pés de barro” citados por Nietzsche – na sociedade, inclusive do significado atribuído à Filosofia que perde o status de prática sendo reduzida a ferramenta científica. Em partes, isso se dá pelo fato de buscar sentido ao passo que as ciências buscam a verdade; e esse é um conceito em crise, especialmente no século XXI. De maneira análoga, os homens desse século não são diferentes dos homens do século anterior, dispendiosos do capital moral acumulado pelos antepassados oriundos dos séculos “das luzes” e “do cientificismo”. Nesse sentido, o homem contemporâneo é um filho pródigo.

A prodigalidade do homem contemporâneo se reflete justamente em tornar a encarar a Filosofia como fomentadora de liberdade. Assim, o ensino de filosofia mantém-se em constante atualização, haja vista ser sempre reconstruído pelo professor a partir da própria existência. E é nesse sentido que Nietzsche percebe Schopenhauer como um exemplo de educador, pois não apenas domina os conhecimentos, mas encarna a filosofia com sua vida como exemplo da prática filosófica. Ou seja, impulsiona a liberdade. E nesse movimento de libertação reside também a crítica nietzschiana ao Estado educador, haja vista ter como objetivo sua manutenção bem como ao eruditismo, o qual identifica como um metal impuro que reúne uma gama de impulsos excitados norteados pelo servilismo em busca de “verdades”.

Para tanto, o educador deve ser aquele cuja existência transcenda: a apatia da modernidade e, por extensão, da contemporaneidade também; o seu próprio tempo e a superficialidade que lhe define; e a massividade da educação moderna, caracterizada pela objetificação do indivíduo através de ideias que reforcem, por meio de caracteres econômicos e políticos, o estado de insumo. Logo, o elemento mais importante da tarefa educacional é a reflexão acerca dos sustentáculos da vida moderna.

Este cenário fornece, de acordo com Nietzsche, quatro formas de produção cultural onde: a primeira, a dos negociantes, tem a educação e a cultura como geradoras de lucro e felicidade; a segunda, do Estado, visa garantir sua perpetuação com homens subservientes; a terceira, valorizando a beleza e a aparência, é a da bela forma; e por último, a cultura dos eruditos, é a do egoísmo das ciências. Assim, educação e cultura, aparecem como mantenedoras da paz e da ordem por meio da formação de homens iguais. E é contra isso que o filósofo deve se levantar! A educação deve estar a serviço de formar homens singulares e do desenvolvimento de uma cultura nova, em recuperação do valor do humano.

A verdadeira cultura deve ser entendida como uma força de criação e, portanto, necessita de dúvidas. Ir além das inquietudes em busca da essência que alimenta o amor ao conhecimento. A filosofia da educação nietzschiana se concentra na criação da base para o humano de excelência que vem após a derrocada dos ídolos da cultura e da educação. A prática do professor de filosofia é a terra fértil a ser semeada para o nascimento do gênio.

A figura do personagem Hyuuga Neji, no decorrer de sua história e conflitos, permite vislumbrar essas questões numa espécie de realidade simulada. Como membro de um clã, cuja tradição é ramificar as famílias de forma que a secundária deve proteger com a vida os membros da principal, vê-se preso a esse compromisso inviolável e inegável que interfere diretamente na sua constituição como indivíduo, uma vez que pertence à linhagem secundária ao mesmo tempo que é visto como o gênio do clã. Eis o seu conflito essencial alimentado pelo seu desejo de mudar as estruturas familiares dos Hyuuga. Sua trajetória é marcada pela crença em destinos imutáveis em oposição ao desejo de liberdade do compromisso outorgado e para desenvolver suas habilidades.

A derrota sofrida pelas mãos do protagonista, a quem considerava um fracassado irreparável, determina uma mudança de postura. A visão do pássaro voando livre pelos céus enquanto assimila o golpe derradeiro de costas ao chão aliada à descoberta da verdade sobre a morte do pai – motivo que alimentara seu rancor pela família principal – constituem a metáfora perfeita para a história particular de Neji: liberdade ao gênio dos Hyuuga. Nesse sentido, Neji simboliza dois vieses: enquanto os elementos construtores de sua personalidade direcionam para aspectos enclausurantes como o Estado, a cultura e o eruditismo; a experiência epifânica vivenciada em seu duelo conduz diretamente ao papel libertador do espírito do gênio pela Filosofia e seu ensino.

Neji justificando seu sacrifício em razão do título de gênio