Uma das facetas mais interessantes na ciência é o potencial de descobrir coisas que vão contra a intuição e ao senso comum. No entanto, não deixam de ser interessante também estudos em que os resultados são esperados e atestam o que parece óbvio. Como tudo na vida, há sempre novos aprendizados que nos fazem entender melhor o problema.

Pelo título do texto o leitor já deve ter uma ideia do que está por vir. Sim, fatores que distraem o motorista causam mais acidentes – essa é uma das conclusões de um estudo recente que eu vou discutir um pouco neste texto. Ainda que seja conhecido os principais fatores associados aos acidentes de carro, ainda é um grande desafio quantificar o risco associado ao tipo e duração de distrações atrás do volante e de outros fatores de risco como fadiga e humor.

Existe um grande número de estudos que tentou quantificar esses diversos fatores, porém até pouco tempo atrás os dados disponíveis eram baseados nos relatos auto declarado dos envolvidos no acidente. Estes relatos sofrem dos seguintes problemas:

  • os envolvidos podem omitir ou deturpar informações por achar que o relato pode de alguma influenciar na resolução do incidente como de quem foi a culpa ou caso tenha outras consequências legais (beber e dirigir, por exemplo);
  • ainda que se garanta que o relato seja anônimo e sem consequência legal, em geral motoristas não consegue lembrar e descrever nos mínimos detalhes as condições do acidente;
  • ainda que os relatos sejam bem detalhados, é difícil codificar possíveis causas com uma métrica comum. Por exemplo, alguém pode dizer que olhar durante 3 segundos para o rádio do carro é uma distração média; outros podem achar uma distração leve e outros podem nem considerar que foi uma distração. Há também diferentes percepções de velocidade dos veículos e de imprudência.

Com câmeras e sensores é possível monitorar o comportamento dos motoristas.

Com o barateamento de câmeras e sensores, tornou possível fazer experimentos “naturalísticos”. Basicamente, se introduz câmeras e sensores em uma quantidade grande de veículos (centenas ou milhares) e passa-se a gravar dados o motorista em todas as situações de tráfego e não há apenas situações de acidentes. Como essa base de dados possui dados de situações em que ocorreram e não ocorreram acidentes, é possível analisar o que exatamente muda em caso de acidentes. 

E o que aprendemos a partir desses dados?

  •  dirigir com humor alterado (triste, raivoso, chorando ou emocionalmente agitado) aumenta em 9,8 vezes o risco de acidentes;
  • dirigir acima do limite de velocidade ou rápido demais para as condições prevalentes aumentam em 11,1 vezes o risco de acidentes;
  • interação com dispositivos no carro que não sejam padrões como rádio (isto inclui por exemplo, olhar as funções do touchscreen do carro), aumenta em 4,6 vezes a chance de acidentes;
  • interagir com celular aumenta em 3,6 vezes a chance acidente. No entanto, cabe notar que em 6% do tempo motoristas estão interagindo com o celular portanto apresentando um grande potencial de acidentes

Como comentado no início deste texto, todos os resultados são esperados; todos sabemos que dirigir distraído ou emocionalmente alterado eleva o potencial de acidente. A grande contribuição deste estudo é uma maior acurácia no potencial de acidentes. Estas informações são importantíssimas para balizar políticas públicas para redução de acidentes.

 

Referências:

link para a figura –  https://www.insurance.com/auto-insurance/claims/7-reasons-to-use-a-dash-cam.html

Referência para o estudo original

Referência da figura de capa.