Richard H. Thaler é mais um a entrar para o seleto grupo de detentores de um prêmio Nobel. Grande nome na microeconomia, sua contribuição para o entendimento de economia comportamental (behavioral economics) é enorme. Quem não o conhece ainda pode procurar por seu nome no Google Acadêmico e dar de cara com o artigo Does the market overreact e sua impressionante marca de 7.807 citações, ou então com Mental Accounting and Consumer Choice citado 5.776 vezes (isso para mencionar as citações capturadas pelo Google Acadêmico). Não é pouco, mas também não surpreende dada a relevância de seu trabalho.

Três das teorias mais importantes que tiveram sua contribuição são mencionadas na divulgação do prêmio. Todas as três trazem consigo algo em comum: a psicologia em parceria com a economia. Mais uma vez, quase que repetindo o feito de 2002 quando um psicólogo esteve entre os ganhadores do prêmio, a economia comportamental mostra que a interação entre as diferentes disciplinas pode trazer grandes conquistas para a ciência. Abaixo, o resumo das três principais ideias mencionadas na premiação e algumas recomendações para o leitor interessado em entender o seu próprio comportamento.

A primeira ideia é a de limitação da racionalidade do ser humano e pode ser entendida através do artigo de 1985 (Mental Accounting and Consumer Choice) e também outros textos de uma série do autor chamados de Anomalies. Enquanto a premissa de grande parte dos modelos tinha como pressuposto um ser humano racional, Thaler explorou nossa irracionalidade (ou racionalidade parcial) em uma série de eventos cotidianos.

Apenas para mencionar um de tantos exemplos, pense em um casal com conta conjunta. Ainda que o marido acredite que gastar 200 reais em uma blusa seja muito, ao receber uma mesma blusa de presente com esse preço da mulher, ele dificilmente sente o peso desse gasto. Embora ele esteja abrindo mão dos mesmos 200 reais de sua conta.

Ainda na linha de limitação da racionalidade, seres humanos se demonstraram avessos ao risco, o chamado endowment effect. Essa teoria diz que damos muito mais valor ao que temos  do que o que não temos, ou seja, temos mais medo de perder algo do que desejo de adquirir – mesmo que ambos tenham o mesmo valor. Em um famoso experimento, estudantes recebiam uma caneca e depois tinham a opção de vendê-la ou trocá-la por um bem de mesmo valor. Curiosamente, uma vez que a posse da caneca era estabelecida, participantes exigiam na venda o dobro do valor que estavam dispostos a pagar pela caneca quando não a possuíam.

Outro conceito no qual o autor teve grandes feitos foi a ideia de preferência social. Esta pode ser compreendida em Fairness as a Constraint on Profit Seeking: Entitlements in the Market e também em Fairness and Assumptions of Economics. Thaler fez diversas pesquisas sobre a justiça do ponto de vista da economia e do mercado, demonstrando que empresas podem não elevar os preços mesmo com alta demanda, para não serem injustas com o consumidor.

Fonte da foto: https://upennsocialbook.files.wordpress.com/2011/03/dictator-game1.jpg

 

Além disso, o senso de justiça também aparece em seus experimentos com o Jogo do Ditador, no qual pessoas são generosas mesmo sem ter qualquer obrigação de ser. Em sua forma mais básica o jogo é formado por dois jogadores, sendo que um deles (o ditador) recebe uma quantia de dinheiro e deve determinar quanto ele deve oferecer ao segundo jogador. Partindo do pressuposto de que o indivíduo age somente em seu interesse, o jogo deveria resultar no ditador com 100% do montante. No entanto, nas execuções práticas, até 80% dos ditadores chegam a dar uma parte do dinheiro ao outro jogador. Confrontando mais uma vez a ideia de agir em próprio interesse e de forma injusta.

Por fim, o último conceito relevante mencionado na declaração do prêmio para o qual Thaler fez grandes contribuições foi a falta de autocontrole dos indivíduos. Em An Economic Theory of Self-Control, e também em artigos mais recentes como Save More Tomorrow: Using Behavioral Economics to Increase Employee Saving, Thaler explora o modelo planner-doer (planejador-realizados) que existe dentro dos seres humanos. Em outras palavras, o conflito entre programar ações e realizá-las. Thaler contribui para nosso entendimento de como sucumbimos às tentações de curto prazo e como planejamentos de longo prazo acabam fracassando. Além de seus artigos, Thaler escreveu o livro Nudge, no qual usa um termo que ele mesmo criou, nudging, para ajudar pessoas a cumprir planos de longo prazo.

Embora desta vez não tenhamos um psicólogo recebendo o prêmio, não dá para negar que o trabalho de Thaler é multidisciplinar e tem grandes contribuições da psicologia. O prêmio serve também como uma lição para todos nós de como é relevante abordar assuntos sob outra perspectiva. No final é a ciência quem sai ganhando.

Em tempo, para o leitor que acha interessante essa integração entre as duas disciplinas vale a pena ainda os trabalhos de Daniel Kahneman, que inclusive já trabalhou em parceria com Thaler em alguns momentos. Seu livro mais famoso, Rápido e Devagar, é repleto de jogos e pegadinhas que exploram nossas tomadas de decisões e fazem com que nós percebamos o quanto somos irracionais, ainda que gostemos de pensar o contrário.

Recomendação:

Rápido e Devagar: Duas formas de pensar

Nudge – Improving Decisions About Health, Wealth And Happiness

Anomalies

Anomalies: The Endowment Effect, Lo ss Aversion, and Status Quo Bias

Endowment Effect

Richard H. Thaler: Integrating Economics with Psychology

Dictator Game

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André Yukio

Matemático e mestre em Economia. Xbox One player. Viciado em séries. Gosta de cookies e jelly beans.