Oi. Sou o Leo. Talvez você já tenha visto alguns textos meus aqui no Deviante falando sobre Física. Neste texto, dividido em 2 partes (se chegou neste texto só agora, VOLTE E VEJA A PARTE 1), resolvi abordar historicamente o que chamamos de “Primórdios da Teoria Quântica”, ou “Velha Mecânica Quântica”, ou o início dessa teoria meio “bizarra” que estudamos, e que também já foi abordada em outros textos no portal (ver: “Too old to be a theory, too young to die”, ou A velha Mecânica Quântica – Parte 1, Texto #6 de Kura Quântica (links para os demais no #6), Textos do Emerson Souza, Textos do Junior Koch). Portanto, minha ideia é mostrar alguns marcos históricos importantes para que esta teoria fosse construída.

Diferentemente de outros textos, este será feito em forma de tópicos, e ao final deixarei muitas (MUITAS) referências para que a pessoa que se interessar possa ir mais a fundo. Não sei se vai dar certo, mas vou testar este tipo de texto! :)

Ah sim, e o título está relacionado à música “Too old to rock and roll, too young to die”, de Jethro Tull.

Enfim, vamos lá! :)

Cronologia de novo: parte 2
    • Após a Mecânica Matricial (já avisei, uai!!! Volta na parte 1 deste texto AGORA!).
    • A Mecânica Matricial foi lançada em 1925 por Heisenberg, Jordan e Born e tinha dado vários resultados bacanas, precisos e rigorosos.
    • Na verdade, a Mecânica Matricial dava uma base matemática (e até lógica) muito rigorosa para a Mecânica Quântica.
    • Mas estava muito abstrata (É estranho né? Falar de “mais abstrata” quando falamos de quântica!!! Mas é assim que é!)
    • Em 1926, Erwin Schrödinger publicou um artigo que revolucionou não só a Mecânica Quântica, como também a Física, ou o pensamento científico (na verdade toda a Física Quântica mudou muito o pensamento científico).
      • A primeira dúvida é: COMO PRONUNCIAR SCHRÖDINGER? Tem vários links na internet sobre como pronunciar isso. Eu pronuncio: Xi-rei-din-ger.
      • Em seu artigo de 1926, Schrödinger (xóxó para os íntimos) propõe uma nova abordagem para se estudar sistemas Quânticos.
      • Esta abordagem NÃO estava baseada em matrizes, como a de Heisenberg, mas em uma equação diferencial (parcial), que levava em conta a Energia total do sistema.
      • Esta equação diferencial possuía características de uma equação de onda.
      • Conhecemos hoje a solução para esta equação, como Função de Onda ψ.
      • Esta função nos fornece TODA A INFORMAÇÃO POSSÍVEL para o sistema físico.
        • Ou seja: tudo o que quisermos saber sobre o sistema físico está lá, neste ψ.
      • O trabalho de Schrödinger, que depois se mostrou equivalente à Mecânica Matricial de Heisenberg, dava resultados muito interessantes para a estrutura eletrônica dos átomos (ver Figura abaixo, orbitais em química atômica/física).
        • É legal ver esses orbitais, quando a gente estuda a Equação de Xoxó direitinho. Os números quânticos que a gente estuda lá no Ensino Médio (n,l,m) são relacionados, na ordem, à: (Energia, Momento Angular, Momento Angular em “z”).
        • Dá até pra notar direitinho que todo orbital S é esférico, tem simetria esférica, porque ele tem momento angular nulo.

          Diagrama de Pauling

        • Diagrama “de Pauling” (ou de Madelung, ou de Klechkovski):
        • Cada número diz respeito ao nível de Energia.
        • Cada letra diz respeito ao momento angular:
          • S=Momento Angular nulo
          • P=Momento Angular 1
          • D=Momento Angular 2
          • F=Momento Angular 3
        • E o número de elétrons máximo em cada parte
          é devido tanto ao momento angular em “z”
          quanto ao Princípio de Exclusão de Pauli. Então, por exemplo, a gente lê o seguinte orbital dessa forma:

          • 3p6=nível 3 de Energia, momento angular 1
            • 2 elétrons no momento angular “z” = -1
            • 2 elétrons no momento angular “z” = 0
            • 2 elétrons no momento angular “z” = +1
      • Mas, essa função de onda ψ tem uma interpretação um pouco…  diferente… que nem o próprio Schrödinger curtia.
      • A interpretação da Função de onda ψ é que o MÓDULO QUADRADO DELA representa a PROBABILIDADE de encontrar a partícula em uma certa região do espaço.
      • E uma observação importante: esta probabilidade é inerente, intrínseca, da própria teoria. Ela NÃO está relacionada a alguma ignorância nossa com relação ao estado físico.
      • Exemplo clássico de probabilidades: imagina colocar um dado de 6 lados dentro de uma caixa; daí balança-se a caixa bastante; e depois você abre a caixa. Qual a probabilidade de se encontrar, sei lá, a face 3 virada para cima? É 1/6. Daí vamos supor que você abre a caixa e de fato encontra a face 3 virada para cima. Se eu te perguntar qual a face que estava virada ANTES de abrir a caixa, é meio claro que estaria a face 3, certo? Acho que todo mundo consegue compreender isso. Essa probabilidade de 1/6 no lance de dado é devida a nossa IGNORÂNCIA com relação a todas as colisões que o dado vai ter com a caixa, com tudo o que acontece com o dado. SE SOUBÉSSEMOS todas as coisas que acontecem com o dado, pelo menos em princípio, poderíamos saber qual face estaria virada para cima antes de abrir a caixa.
      • Exemplo quântico, com um suposto dado de 6 lados quântico: agora no caso de um dado de 6 lados quântico, MESMO SE SOUBERMOS EXATAMENTE TUDO O QUE ACONTECE COM O DADO, não é possível, por princípio, saber qual o lado que está para cima antes de abrir a caixa. Existe uma probabilidade já explícita dentro da teoria, que tem a ver com a função de onda ψ (ou com o módulo quadrado dela).
        • Podemos pensar também no seguinte: se estamos num carro a 100km/h e passamos num radar, ele vai nos multar e marcar lá 100km/h. É fácil pensar classicamente que logo antes do carro passar no radar ele tinha algo perto de 100km/h, certo? Na Quântica a gente NÃO consegue extrapolar que ele tinha 100km/h antes de medir sua velocidade.
      • Então, por exemplo quando a gente pensa nos orbitais atômicos, o que a função de onda ψ nos dá é a densidade de probabilidade de encontrarmos um elétron naquele orbital, os lugares mais possíveis de se encontrar o elétron.
      • Isso vale também para o experimento de fenda dupla (ver figuras abaixo): no experimento temos um canhão de elétrons que emite esses camaradas até um anteparo que possui duas fendas; o elétron é detectado numa tela; o que acontece: cada elétron é detectado um a um (como PARTÍCULAS). Por exemplo, vamos supor que o primeiro elétron foi detectado na posição x=-4cm (lembrar disso); inicialmente parece que não tem nenhum padrão na tela, mas depois que deixamos bastante tempo aparecem faixas em que muitos elétrons caíram e faixas em que pouquíssimos elétrons caíram. Este, sim, é um padrão muito conhecido, que aparece muito em experimentos com ONDAS, um padrão de interferência. O que a função de onda ψ te informa (lembre que ela tem TODA a informação sobre o sistema) é a probabilidade de um elétron bater em alguma parte da tela.
        • Agora, se “voltarmos no tempo” e pegarmos aquele primeiro elétron que tinha caído na posição x=-4cm, e tentarmos ver de novo, EXATAMENTE do mesmo jeito, qual a posição deste mesmo elétron, ele pode cair em qualquer outra posição onde haja alguma probabilidade (dada por ψ) para ele cair!!!
        • E note: isto não tem NADA A VER com a ignorância com relação ao estado, de fato. Sabemos exatamente qual o estado físico ((r, t)), mas não é possível saber exatamente um evento, mas somente a probabilidade deste evento ocorrer.
        • Isto é: a Mecânica Quântica é intrinsecamente indeterminista!!!
        • Vídeo com experimento de fenda dupla usando elétrons.

          Figura (gif animado): Resultado de um experimento de fenda dupla utilizando partículas quânticas. Note que as partículas são detectadas uma a uma, e depois de um certo tempo (no qual foi possível coletar dados estatísticos suficientes), um nítido padrão de interferência aparece.

           

          Figura: uma arma que atira (direções aleatórias) elétrons em um anteparo contendo duas fendas; os elétrons são então espalhados pelas fendas e detectados, um a um, numa tela; após vários elétrons serem coletados, fazemos um diagrama da posição de cada elétron detectado na tela, e traçamos um gráfico; os elétrons são detectados um a um, e apresentam interferência.

        • Um ÚLTIMO detalhe IMPORTANTE sobre a Equação de Xoxó e suas soluções: a equação de xoxó é linear, e então uma soma de soluções em princípio também é solução (superposição).
        • Algumas considerações importantes: a Equação de Schrödinger é não-relativística; mas existem várias abordagens de equações relativísticas para a mecânica quântica, como a equação de Proca (partículas massivas de spin 0), equação de Klein-Gordon (partículas massivas de spin 0), e a mais famosa a Equação de Dirac (partículas massivas de spin ½).
          • Quando a gente estuda a Equação de Schrödinger, a gente inclui Spin “na marra”, pois o spin é uma característica relativística das partículas elementares.
          • A interpretação de Dirac para sua equação é lindíssima, nela, ele introduz pela primeira vez o conceito de anti-partícula, pois no estudo da Equação que ele propôs “surge” um tipo de partícula com todas as características do elétron, mas de sinal oposto (ou de Energia Negativa, mesmo quando a partícula está livre).
            • Dirac então propõe (em 1930) que o vácuo quântico é um “mar de partículas”, que ao estudarmos um elétron estamos estudando uma partícula de energia positiva, que havia meio que “saído” de um mar CHEIO de partículas. Daí surgiria um “buraco” neste mar, que foi identificado como o pósitron em 1932, quando foi descoberto.
            • Hoje este “mar de Dirac” é menos usado, em contraste com o vácuo quântico como proposto por Feynman e outros.
    • Até aí estava tudo muito bem, obrigado. A Mecânica quântica vinha obtendo sucesso atrás de sucesso. VÁRIAS soluções de problemas envolvendo física estatística, física da matéria condensada/semicondutores, etc., foram descritos pela Mecânica Quântica até então.
    • Mas… algumas pessoas meio que não gostavam da interpretação… uns cientistas que pouca gente conhece, tipo:
      • Max von Laue (Nobel de Física de 1914 — Difração de raio-x)
      • Alfred Landé (também trabalhou com mecânica quântica, explicou parcialmente o efeito Zeeman)
      • Louis de Broglie (Nobel de Física de 1929 — quem primeiro propôs a dualidade onda-partícula, sendo que até hoje mede-se comprimento de onda de “partículas”, como a molécula de fulereno)
      • Max Planck (bem… a constante de Planck vem dele, quem iniciou a bagunça toda (Nobel 1918 — quem começou tudo)
      • Erwin Schrödinger, o Xoxó (Nobel de Física 1933 — Criou a equação que descreve a dinâmica da função de onda)
      • Albert Einstein (Nobel de 1921 — dispensa apresentações)
    • Daí chegamos finalmente em MAIO de 1935.

E aqui decido parar, definitivamente, com essa cronologia. Parabéns se você conseguiu chegar até aqui.

Como eu disse no início da Parte 1, este texto seria em forma de tópicos, então não proponho uma conclusão, ou mesmo uma análise mais profunda de cada tópico. Deixo várias sugestões de livros, vídeos, e até games, no final do texto, para caso alguém queira aprofundar mais.

O intuito destes textos era este: fazer uma cronologia do início da Mecânica Quântica, talvez mostrar o tanto que aparentou ser (e talvez foi?) bagunçado, mas que gerou e tem gerado muita tecnologia para a sociedade. E mais que isso, gerou uma quebra de paradigma completa na ciência.

Forte abraço.

Leo.

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Sugestões de literatura:

FEYNMAN, Richard Phillips. Física em 12 lições. Ediouro Publicações, 1999.
GREENE, Brian. The fabric of the cosmos: Space, time, and the texture of reality. Knopf, 2004.
HAROCHE, Serge; RAIMOND, J.-M. Exploring the quantum: atoms, cavities, and photons. Oxford university press, 2006.
ROVELLI, Carlo. A realidade não é o que parece: a estrutura elementar das coisas. Objetiva, 2017.
HAWKING, Stephen. Uma breve história do tempo. Editora Intrinseca, 2015.
HAWKING, Stephen. O universo numa casca de noz. Editora Intrinseca, 2016.
GLEISER, Marcelo. A dança do universo: dos mitos de criação ao Big-Bang. Editora Companhia das Letras, 2006.
JUNIOR, Osvaldo Pessoa. Conceitos de Física Quântica 1. Editora Livraria da Fisica, 2003.

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Sugestões de artigos científicos e de revisão:

Original de Planck (1)

Original de Planck (2)

Annus Mirabillis de Einstein

Artigo original de Bohr sobre seu modelo atômico

Mecânica Matricial

Artigo sobre Luz comprimida no LIGO(1)

Artigo sobre Luz comprimida no LIGO(2)

Artigo original de Schrödinger

Como pronunciar Schrödinger

Vídeo com experimento real de fenda dupla com elétrons

Sobre o Mar de Dirac

Artigo sobre a interpretação de Copenhagen: Balsas, Álvaro M. R., Videira A. (2013). “Truth by fiat: the Copenhagen Interpretation of Quantum Mechanics”, Revista Brasileira de História da Ciência 6, 2: 248 – 266.

Bringing home the atomic world: Quantum mysteries for anybody

Mapa das interpretações da Física Quântica (Osvaldo Pessoa Jr)

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Sugestões de filmes e série:

Dark, Netflix
Tenet, Christopher Nolan
Rick&Morty, desenho, Netflix
Cosmos (Sagan ou deGrasse Tyson), Netflix (???)

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Sugestões de vídeos:

Radiação de corpo negro
Manual do Mundo (termômetro de TESTA)
Princípio de Incerteza 1
Princípio de Incerteza 2
Princípio de Incerteza (Veritasium)
Princípio de Incerteza (Walter Lewin)

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Sugestões de podcasts:

Scicast #152 Física Quântica 1
Scicast #165 Física Quântica 2

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Sugestão de games:

The Quantum Game
Quantum moves 2
Sprace Game