Era Outono, o clima incomodava há muito tempo com seus sopros frios e secos. Algumas árvores teimosas ainda tinham algumas folhas, já o chão ali estava cheio delas. A vida começava a desacelerar. Em breve, animais estariam ainda mais famintos e iriam tentar se aproximar mais das fazendas e das criações. 

Luca estava entrando na simpática cidade de Alomar, uma grande localizada no centro do reino, as feiras animadas e repletas de pessoas contrastavam com o clima de preocupação que havia entre os cidadãos de Alomar.  O jovem tinha recebido uma mensagem da Ordem solicitando sua presença para fazer uma verificação.

Entrou em uma taverna para reservar um quarto e deixar seus pertences, além de obter algumas informações antes de ir à prefeitura conforme foi orientado pela mensagem. No centro do local, havia uma grande tapeçaria com a figura de três jovens e um senhor claramente retratados como heróis, eram da Ordem, mas Luca não os reconhecia.

– Hum… – disse Hamza a Luca em pensamentos.

– Você os conhece? – perguntou Luca ao mentor.

Hamza ficou em silêncio. Luca pensou sobre aquilo, o espírito do mentor estava em silêncio por um bom tempo, as pessoas na tapeçaria devem ser importantes. Observou um pouco mais aquilo enquanto esperava por atendimento no balcão.

Passou um certo tempo conversando com o taverneiro, ele sabia de algumas histórias dos fazendeiros, mas nenhum ataque tinha acontecido. Sobre os três, disse que eram um grupo de novatos da Ordem, acabaram com uma grande ameaça na primeira missão deles, foi a segunda vez que a Ordem tinha socorrido aquela cidade.

O jovem paladino foi à prefeitura onde passou quase duas horas escutando as reclamações que os moradores faziam ao prefeito. Luca recebeu uma carta da Ordem com instruções e foi a uma fazenda no norte da cidade, essa ficava no limite da cidade, bem próxima à floresta.

Precisou de quase meia hora para chegar na fazenda determinada, ele conversou com o dono e os trabalhadores ali. O dono era irmão de um membro do círculo interno, os trabalhadores reclamaram que foram atacados duas vezes por um grupo de goblins. Luca não conseguiu identificar que tipo de goblin seria, foi ao local dos ataques, que não era tão distante daquela fazenda, achou uma parte dos rastros e decidiu investigar entrando na floresta.

Por quase duas horas ele continuou procurando pelas criaturas na floresta, então percebeu algo estranho, uma presença sinistra a leste dali. Correu com pressa e pouca cautela naquela direção, então escutou um barulho inconfundível, um rio.

Quando a floresta cedeu, um rio bem agitado estava à sua frente. A espuma da água batendo nas rochas mostrava a força da correnteza ali, porém a beleza do rio era manchada por sangue que vinha da margem, pois,  à esquerda, quatro goblins devoravam um pequeno cervo de uma forma estranha. Enquanto observava a situação sinistra, as criaturas pararam de devorar a carcaça e correram em direção à floresta. Os dois primeiros foram rapidamente abatidos por um golpe circular de um clérigo, os outros foram derrubados em quatro movimentos de um jovem aprendiz que também portava uma maça de guerra.

Luca observou que as roupas e as cotas de malhas que usavam tinham pequenos detalhes em vermelho e laranja, eles eram dos Esclarecidos.

— Saudações! Pensei que tinha sido o único enviado pela Ordem — disse o paladino espantado com a presença de energia estranha que envolvia as criaturas e o estado delas.

Ah! Andarilho! Estou surpreso por está aqui também. Meus cumprimentos! Eu me chamo Louis disse o clérigo com um reverência retribuída por Luca.

Uau! Ele é…

— Depois, garoto! Esse é meu aluno, George — ordenou o mestre censurando seu aprendiz.

Luca observou que o jovem tinha um bocado de cicatrizes, muitas para alguém tão novo. O garoto tinha entre 16 e 17 anos.

— Só ele? — perguntou olhando para o clérigo.

— Infelizmente, foi algo muito triste, não quero tocar em algo tão doloroso, vamos manter o foco — sugeriu o mestre enquanto o garoto tinha um olhar bem triste ao lembrar de algo.

— As criaturas viraram zumbis há algum tempo, estão numa condição lastimável, creio que o controlador não deve estar longe, mas eu não consigo detectar nenhuma fonte de energia sombria por perto — comentou Luca.

— Não sei se o responsável é poderoso, mas sinto uma presença naquela direção — apontou o discípulo para a floresta.

Assim, caminharam com precaução por quase uma hora floresta adentro, não sendo atacados por mais nada. Eles precisaram de algum tempo para encontrar um cemitério abandonado. Tudo ali estava com aspecto deteriorado, o local estava recheado de esqueletos que perambulavam aparentemente sem objetivo por todos os lados.

— Hum…. parecem estar guardando o local, sinto que tem algo se escondendo ali — comentou o mestre apontando para a maior cripta do local.

Eu vou investigar lá, vocês podem bloquear a passagem enquanto desço? sugeriu Luca.

Não gostaria que fosse só, mas o risco de ficar preso sem conseguir sair é considerável, vou concordar com sua ideia respondeu o mestre.

Creio que uma boa ideia é destruir todos que encontrarmos no caminho, correr até a entrada não é bom comentou o jovem discípulo.

Certamente! Os primeiros são nossos, Luca na retaguarda. Vamos! ordenou Louis avançando.

Eles avançaram contra diversos inimigos, os esqueletos animados não eram páreos para os três. Uma a uma as criaturas tombavam com facilidade, assim chegaram à entrada da cripta em poucos minutos. Luca entrou enquanto Louis e George mantinham o restante dos esqueletos afastados. Ficou em alerta ao notar o local bem iluminado. Ao fundo, havia um caminho que descia através de uma escadaria também muito iluminada, enquanto Luca descia, o ar ficava mais espesso, o cheiro que saia das tochas já incomodava consideravelmente.

Luca chegou numa sala bem ampla e iluminada. Quase no centro uma elfa de cabelos escuros com uma robe cinza cheia de detalhes prateados, estava a frente de um altar, algumas coisas estavam sobre ele, mas era impossível identificar naquele momento.

— Bem vindo, andarilho! É um prazer tê-lo aqui! — disse a elfa com voz bem jovem.

Ela levantou uma das mãos, os ossos que estavam no chão e não tinham sido notados por Luca começaram a se mexer, logo três esqueletos estavam inteiros. As criaturas foram chamadas pela mestra que abriu espaço, elas pegaram três espadas curtas, então a jovem fez um movimento de mãos sorrindo e comandou o ataque. Em breve Luca notaria que aquelas armas não eram simples espadas, pois emanavam energia sombria.

O jovem paladino sacou arremessando a adaga, a arma resvalou em um esqueleto, mas acertou quase em cheio o braço da elfa que soltou um palavrão e olhou com ódio, a dor foi tamanha que um dos esqueletos se desfez.

Ele percebeu que uma energia estranha era emitida pelas espadas, mesmo assim executou seu ataque, ele segurou com a mão esquerda o punho que segurava a espada de um inimigo, enquanto esta mão começava a brilhar. Luca desferiu um golpe, partindo em dois o fêmur do outro esqueleto que caiu se espatifando no chão. Quando a mão esquerda piscou, o punho do esqueleto estalou e mudou de cor, se desfazendo. Assim Luca acabou com ele usando um golpe circular que despedaçou o restante da criatura, ele esmagou o crânio da outra e virou-se encarando a jovem elfa.

Ela tinha estancado o sangramento de alguma forma, e continuava olhando de forma ameaçadora. Luca guardou a espada para surpresa da moça e caminhou em direção a ela.

— Você é uma criança, pode escolher outro caminho se quiser, abandone as sombras — sugeriu Luca.

Eu sigo o guia sombrio e apenas ele, eu sou…

Os olhos de Luca ficaram brancos, ele emanava uma poderosa energia que assustou a elfa. Assim, com as mãos levantadas e os dedos separados, ele soltou um vento refrescante que desfez inúmeros fios de energia sombria, esses estavam ligados à jovem elfa, mas sua origem não era possível saber.

A jovem caiu de joelhos e sua mente clareou, Luca estava imóvel com os braços ainda levantados à sua frente. Os olhos que estavam iluminados rapidamente voltaram ao normal. Quando voltou a ter consciência, Luca não lembrava o que tinha acontecido, apenas a jovem elfa estava ajoelhada à sua frente sem emanar a mesma aura maligna de antes.

— O que você fez? O que fez a mim!? Não sinto mais a presença do guia! Para onde o mandou? — gritou a elfa olhando furiosa para Luca.

Ela se levantou e tentou atacá-lo de qualquer forma, mas, sem energia, foi facilmente imobilizada pelo paladino.

— O que você fez comigo? Minha conexão acabou, o guia me abandonou! — gritava a moça agora com os punhos amarrados e outro laço envolvendo os braços junto ao tórax.

— Não fui eu, mas você está livre da influência, acho. Venha comigo, vamos sair daqui — explicou guiando a jovem para fora daquele local.

Durante todo o caminho até a saída, a elfa resmungou e praguejou, mas continuou caminhando para a saída. Do lado de fora, Louis e George estavam rodeados por ossos em todo o lugar, bebiam algo e pareciam aguardar a volta do jovem.

— Saudações, meu jovem! Quando os esqueletos se desmontaram, imaginamos que você tinha anulado o mal que existe ali — gritou Louis bem contente.

— Quem é essa aí? Não pode ser a responsável por tudo isso — indagou George observando de forma desconfiada aquela elfa.

— Ela é a responsável por isso junto com um tal guia sombrio — respondeu Luca.

— Mais respeito com o lorde, seu pirralho da Ordem! — gritou a elfa.

— Bem, nós não deixamos seguidores do mal vivos — disse o aprendiz sacando sua arma.

— Calma, garoto! Ela deve ser interrogada e julgada pela Ordem, precisamos saber sobre esse tal guia sombrio, vou levá-la para os filhos do meu mentor — discordou Luca colocando a mão sobre a empunhadura da espada.

— Hum… Certo, eu concordo.

— Mas… — protestou o aprendiz..

— Eu disse que concordo, ou você está disposto a enfrentar o andarilho, garoto?

— Não, senhor! — respondeu o discípulo.

— Boa viagem, jovem Luca, desejo sorte. Não vai ter boa companhia — disse isso encarando a elfa, que retribuiu com um olhar ameaçador.

— Obrigado aos dois, serão dias longos pelo que vejo — disse Luca olhando para ela.

Assim, saiu do cemitério voltando para a sede da Ordem, desviando da cidade para não chamar a atenção e evitar que a prisioneira fosse apedrejada pelos cidadãos de lá.