Recentemente iniciei uma discussão sobre a segurança de alimentos e suas métricas. Eu disse que um dos principais instrumentos para mantê-la é o Manual de Boas Práticas de Fabricação (Manual BPF ou MBPF). Talvez tenham ficado dúvidas sobre como age esse instrumento valoroso e como colocá-lo em prática no cotidiano profissional.

No texto de hoje, pretendo abordar o funcionamento de um dos principais documentos exigidos pela legislação sanitária de serviços alimentícios. Afinal, existe liberdade ao redigir e auditar o documento?

O MBPF é um documento exigido pela legislação 275/2002 do Ministério da Saúde independente do porte, número e complexidade das operações no ramo alimentício [1]. Esse manual serve para que a organização descreva quais são as regras e critérios adotados na execução das atividades, mantendo indicadores de controle e regulando as atividades operacionais padrão.

Ele pode ser formulado tendo por base muitos princípios, mas somente nove são os principais: requisitos higiênico-sanitários da edificação, manutenção e higienização de equipamentos, instalações e utensílios, controle de água, controle integrado de vetores e pragas urbanas, capacitação e treinamento dos profissionais, controle da higiene e saúde dos manipuladores, manejo de resíduos e garantia de qualidade do alimento.

Ele não é um documento estático. Ou seja, deve sempre acompanhar as atualizações em processos e logística organizacional da empresa. Também deve contar com intervalos de tempo para análise e auditoria de pontos críticos de controle. Sendo um documento bem técnico, é ideal que existam profissionais especializados em alimentos na sua elaboração e implementação.

 

Imagem um: Programas de capacitação em Boas Práticas de produção e manipulação fazem parte da prerrogativa do Manual BPF. Na foto, feirantes de Manhuaçu recebem certificação BPF [2]. Alguns bolos estão dispostos na mesa logo embaixo enquanto um homem e uma mulher exibem seus certificados, acompanhados de quatro pessoas.

O principal instrumento de avaliação das conformidades no manual é a auditoria. Ela é feita pela publicação de listas de verificação (checklist) dos diferentes tópicos do instrumento. O método pode ser realizado tanto por auditoria externa – com visita de especialistas de certificação – quanto por interna, pelos próprios profissionais da empresa.

Esse instrumento deve ser realizado apenas por profissionais com capacitação comprovada em técnicas de análise descritiva e ambiental. O profissional precisa estar apto a elaborar o relatório da auditoria e, posteriormente, o plano de ação da empresa para se adequar ao manual.

Podemos ver até aqui a abrangência de controles que o manual mantém, bem como o escopo dinâmico da atuação desse instrumento. Ele foi pensado para ser uma fonte de melhoria contínua e base para insights de melhoria dentro da companhia. Por isso que sua criação é tão importante para o escopo da saúde coletiva.

Os checklists de auditoria são abordagens qualitativas de análise do problema. Utiliza-se quatro níveis de criticidade para observar o grau de atendimento da organização: conforme, não conforme sem afetar segurança de alimentos, não conforme que pode comprometer segurança e de impacto significativo (risco iminente) [1]. Com a adoção de pontuação, temos subsídios para tomada de decisões e priorização de correções.

 

Escala de pontuação adequada ao MBPF

Valor

Criticidade

5 Conforme
3 Não conforme – sem afetar significativamente a segurança de alimentos
2 Não conforme- com potencial de causar dano à segurança de alimentos
1 Não conforme – afeta significativamente a segurança de alimentos

 

Logo depois, o relatório aponta o grau de atendimento aos requisitos por meio de porcentagem. O estabelecimento pode adotar valores mínimos de conformidade aceitável à sua assunção ao risco. Valores mais restritivos são metas à melhoria contínua de empresas preocupadas com a segurança de alimentos.

 

Imagem 2: Gráfico de barras mostrando situação real de uma empresa no ramo alimentício quando auditada sobre higiene pessoal, com os respectivos sub-blocos (requisitos técnicos) apontados abaixo [1]. O potencial de análise de auditorias torna o MBPF instrumento imprescindível para boas empresas.

Com base nesses dados, a empresa terá robustez para agir com eficiência e embasamento estratégico quando for buscar novas práticas. De maneira geral, comportamentos éticos e fatores higiênico-sanitários tenderão a se difundir com mais facilidade com essa adoção.

Porém, para que isso dê certo, é preciso que a empresa esteja utilizando corretamente o instrumento de análise. Buscar difundir os dados de segurança, treinar funcionários para processar dados e abrir a visualização para clientes são algumas das medidas mais interessantes do ponto de vista metodológico. A rastreabilidade quanto aos erros e procedimentos torna-se um dos maiores ganhos com a ferramenta.

Assim, espera-se que ocorra a diminuição de riscos institucionalizados pela própria cultura organizacional. Já reparou se seu restaurante favorito divulga resultados ligados ao MBPF? Sabe informar o motivo desse eventual apagão de dados? Comente sua experiência e até a próxima!

 

Referências
[1]: GERMANO, Pedro Manuel Leal. Sistema de gestão: qualidade e segurança dos alimentos. Editora Manole, Barueri, SP. 1ª Ed, 578 p. 2013.
[2]: SECOM, Prefeitura de Manhuaçu. Feirantes recebem certificado de boas práticas em manipulação de alimentos. Portal Caparaó, 04 fev. 2023.