A arte de dobrar um  papel, dobrar, dobrar, dobrar aqui também até criar formas geométricas, objetos ou fazer representações de seres é uma criação japonesa com origem em meados de 1600. E, apesar de haver a possibilidade de construir uma estrutura de DNA usando esta arte secular, não é disso que vamos conversar aqui.

Nosso assunto hoje é um origami de DNA,  não o papel dobrado até virar aquela dupla-hélice já bem conhecida, realmente estamos falando das nossas amiguinhas: Citosina, Guanina, Adenina e Timina sendo usadas como peças de lego, empilhadas a ponto de formar uma estrutura desejada. Como isso é feito e o motivo é o que vamos discutir aqui.

Construir estruturas com DNA não é um arte tão nova assim. De acordo com o pesquisador XiaoZhi Lim, fazer origamis com dna veio mesmo antes do sequenciamento do genoma humano, surgindo em 1990 a partir de um simples desejo de trabalhar com máquinas em nanoescala. Sei muito bem que tentar imaginar uma escala tão minúscula pode ser algo complicado e um pouco fora de nossa realidade, assim, para você entender o que é uma estrutura em nanoescala, vamos fazer divisões em uma régua até alcançar este tamanho desejado.

A menor porção medida em uma régua é 1 milímetro (1mm), isso é a distância entre os dois tracinhos pequeninos na régua. Dessa forma, milímetro é a divisão de 1 metro por 1000. Se você dividir 1 metro por 1000000 (um milhão), terá 1 micrômetro e é nessa escala que estão as queridas bactérias, não visíveis aos olhos humanos sem ajuda de equipamentos, porém gigantes frente a escala que queremos chegar: se você pegar aquela menor porção da régua (1mm) e dividir em 1 milhão de partes iguais, chegará ao nanometro (1 nm). E é neste pequeno espaço que trabalharemos aqui, com nossas pequenas escavadeiras e empilhadeiras. É como se a estrutura que queremos construir tivesse tomado muitas pílulas de Nanicolina.  

Voltando ao DNA, se medirmos um giro completo da hélice, teremos 10 nucleotídeos medindo um total de 3.4nm. Assim, as dimensões do DNA e sua flexibilidade são ideais para construção de estruturas. Mas como isso é feito e onde isso vai nos levar? (para saber mais sobre esta linda molécula, recomendo o Scicast #241: a história do DNA).

Figura 1: Estrutura do DNA

Diversas metodologias podem ser aplicadas para construir estruturas usando tijolos de DNA. Uma das primeiras abordagens desenvolvidas foi a utilizada por Paul Rothemund em 2006.   Para construir as nanoestruturas ele utilizou o que chamamos de ssDNA, que são pedaços de DNA de fita simples, DNAs em forma de grampo e uma baita criatividade para decidir quais imagens criar. Aplicando os conhecimentos de complementaridade de bases e de formação de ligações de hidrogênio, Rothemund construiu estruturas bidimensionais (figura 2) e com certeza se divertiu ao olhar o microscópio. Parece bobo e brincadeira de criança, mas com essas carinhas felizes e estrelinhas foi possível aumentar os conhecimentos no campo das “nanoconstruções”.

Figura 2: Origami de DNA para criar formas em nanoescala. Fonte:Nature

A arte de fazer origamis com DNA percorreu um longo caminho, alcançando diversas conquistas e até cometendo alguns erros. Mas em 2016 uma equipe de bioengenheiros do Instituto de Tecnologia da Califórnia decidiu fazer jus ao título “Arte” aplicado para esta área. Liderados pelo mesmo criador dos emojis com DNA, a equipe conseguiu reconstruir um clássico da arte pós-impressionista. E assim, empilhando seus tijolos biológicos eles “repintaram” o   quadro A Noite Estrelada de Vincent van Gogh (Figura 3).

Figura 3: A Noite Estrelada de Vincent van Gogh recriado usando DNA. Fonte: Nature

Tudo lindo, maravilhoso, meio vermelho, ok, mas ainda assim impressionante. No entanto, porque pintar quadros com DNA, no que isso influencia a nossa vida?

Oh caro leitor, seja um deviante, pense além dessas imagens. As formas obtidas com DNA apresentadas aqui são testes da nossa capacidade de “nanoconstrução”, uma das suas potenciais aplicações é a obtenção de “nano contêineres” transportadores de materiais como fármacos e proteínas.

Se você ainda não conseguiu pensar fora da caixinha, vou te ajudar com as “nanocaixas” publicadas na revista Nature em 2009 (Figura 4). Em cinza, estão as representações de caixas construídas com tijolos de DNA. Tais caixas podem ser usadas para transportar medicamentos direcionados a um destinos específicos no corpo. Isto porque a tampa da caixa é fechada com fragmentos de DNA, representados em azul e laranja, que ao entrarem em contato com uma determinada substância, sofrem interferência possibilitando a abertura da tampa, em um local específico, liberando o medicamento de forma eficiente. Evitando perdas e efeitos colaterais.

Figura 4: Caixas de DNA com uma tampa controlável. Fonte: Technologyreview

Mas se depois de todas essas possibilidades de origamis, você ainda quiser fazer seu DNA com papel, é só clicar aqui para obter o modelo e as instruções.

Forte abraço e até os próximos nanoposts comentando os medicamentos que estiverem utilizando esta tecnologia.

 

Créditos:

Imagem da capa: Por Jorge C. Lucero origami-dna

 

Referências:

The architecture of structured DNA

Folding DNA to create nanoscale shapes and patterns

Self-assembly of a nanoscale DNA box with a controllable lid

A Lockbox Built from DNA