Ultimamente tenho pensado bastante sobre o futuro da Literatura. Obviamente que não tenho bola de cristal e não posso adivinhar que rumos a humanidade vai tomar, nem na Literatura nem em qualquer outra área. Porém, é inevitável perceber o quanto estamos distraídos com as redes sociais e o quanto isso impacta em nossas vidas. Ler menos (ou pior, parar de ler completamente) me parece um fenômeno bastante atrelado ao nosso vício em celular, principalmente por causa das redes sociais, mas também pelos memes, vídeos do Youtube e séries em alta nas plataformas de streaming, que ganham fácil a disputa com o coitadinho do livro que ficou tomando poeira na mesa de cabeceira.

É comum que muitas pessoas peguem um domingo inteiro para ficar maratonando série. É comum que se perca quatro horas seguidas rolando o feed das redes sociais. Ou então passar horas e mais horas vendo um vídeo seguido do outro no Youtube sobre assuntos aleatórios (úteis ou não).

Fato é que perdemos a noção do tempo com essas mídias, ao passo que pegar um livro parece exigir um nível de concentração que a maioria das pessoas não tem (ou perderam nos últimos anos). Vejo ao meu redor cada vez mais relatos de leitores habituais que não têm mais tempo para leitura, ou (os mais sinceros) dizem não ter a concentração necessária para tal atividade. Até mesmo leitores ávidos, assim como experts na área, têm relatado o mesmo fenômeno.

Além da disposição de tecnologias, que até pouco tempo atrás nem existiam, para competir com o livro, também estamos trabalhando mais, o dinheiro está valendo menos, e a saúde mental comprometida, já que tantas pessoas estão em estado de esgotamento.

Neste cenário, como exigir que depois de um dia exaustivo de trabalho se chegue em casa e se pegue um livro para ler? É compreensível que se renda ao scroll infinito, ou que se escolha qualquer coisa na Netflix.

Assim, me pego pensando se a Literatura vai continuar da mesma forma, com publicações longas, trilogias, livros impressos (já temos o Kindle, eu sei, mas os livros físicos resistem), ou se algumas mudanças virão para que a Literatura continue viva, mas mais adaptada ao nosso mundo frenético.

Já sabemos que as livrarias estão morrendo. Quantas livrarias fecharam nos últimos anos? E a gente sabe que não foi culpa da pandemia, porque antes disso já estávamos comprando nos sites os livros que havíamos visto antes na livraria. Claro, nos sites é mais barato, e por mais conscientes que a gente estivesse quanto ao risco de fecharem as livrarias, se pesou no bolso do brasileiro, já era.

Refletindo aqui sobre novas formas de se consumir Literatura, vejo alguns caminhos. Um deles é o audiolivro. Com o crescimento do podcast, mais e mais pessoas implementaram o hábito de botar um fone de ouvido e ouvir algo de relevante enquanto pegam transporte público, fazem o serviço doméstico ou realizam qualquer atividade enfadonha do dia a dia.

Na carona da febre do podcast, surgem então aplicativos disponibilizando audiolivros, resumos de obras clássicas, áudios curtos ou de contos ou de capítulos mais fragmentados de produções inteiras.

Outra possibilidade de se consumir Literatura nos tempos modernos é de fazer o mesmo por vídeo. A Abelha Rainha Maria Bethânia faz isso tanto nos seus shows quanto nos vídeos que compartilha nas redes sociais. Ela declama poemas, lindamente por sinal, entre uma música e outra. Os excertos dos poemas são disponibilizados e compartilhados em redes como o Instagram. É uma forma de se apreciar poesia.

Deixo um exemplo de um de muitos poemas declamados por Bethânia:

 

Nessa mesma vertente, outros artistas, assim como escritores, literatos e apaixonados por Literatura, podem gravar poemas e outras narrativas curtas em vídeos a serem postados no Instagram, Youtube ou TikTok. Inclusive, a BookTok já é considerada uma grande comunidade dentro do TikTok, com diversos perfis compartilhando leituras, resenhas rápidas e dicas de livros.

Uma tendência que vejo como promissora é a denominada “Microliteratura”. São realmente “micro” textos, por vezes chamados de “nano” textos – nanocontos, por exemplo — poucas linhas acompanhadas ou não de uma imagem. Muitas vezes carregam humor ou ainda trazem uma crítica social, desse modo se assemelham a uma charge, ou ainda, um meme.

Há ainda uma grande discussão sobre memes e o quanto eles podem ou não se aproximar da Literatura, mas deixemos isso para outro momento.

Deixo dois exemplos de trabalhos consistentes dentro do que podemos considerar Microliteratura. Os perfis do instagram: Microliteratura e Microcontando.

A vida está em constante transformação, “Tudo muda o tempo todo no mundo”. É impossível tentar frear essas mudanças todas, tanto na língua quanto na Literatura. Todos os aspectos de nossas vidas influenciam na nossa fala, assim como a escrita e a leitura. Um texto de oitocentos anos atrás, em Português, é muito diferente do Português de hoje. O modo de narrar, e talvez mais ainda, o que se é narrado, muda muito também de uma época para outra.

Por isso acredito que toda essa metamorfose literária pode ser bem-vinda, e sim, textos muito curtos (micro ou nano), textos gravados em áudio ou vídeo, e qualquer outro formato mais adaptado a uma realidade apressada e tecnológica como a nossa, podem ser interessantes como formas de se consumir Literatura.

Mas concomitantemente a tudo isso, eu espero, do fundo do coração, que o tradicional romance, narrativa longa e escrita em prosa, cheia de detalhes e recursos narrativos, continue existindo. A Literatura que instiga, que nos faz questionar, que traz à tona todo o potencial crítico da arte. A Literatura que nos faz viajar para outros lugares, outras realidades, outros eus.