Os oceanos cobrem mais de 70% da superfície do planeta Terra, e mesmo assim sabemos tão pouco sobre eles. Conhecemos mais sobre o cosmos do que sobre eles. Isso tem uma razão, na verdade três: tamanho, escuridão e pressão. Mas claro que falta de investimentos e prioridade também influenciam, com recursos limitados para a pesquisa e exploração, oceanográfica fica difícil termos grandes avanços.

Por isso, quando se fala em criar colônias para a humanidade, muito se fala em colônias no espaço ou em outros planetas e pouco se ouve sobre colônias debaixo d’água. Porém, se fosse necessário (e pode apostar que um dia vai, do jeito que estamos tratando esse planeta…) seria possível construirmos colônias humanas nos oceanos? Pois esse é o tema que a Ellipse Studios usou para criar seu Real-Time Strategy (Estratégia em Tempo Real) lançado em 2000 para PC’s. Então coloque seu traje de mergulho e vamos aprender mais sobre a colonização dos mares enquanto batalhamos contra alienígenas baseados em silício em Submarine Titans.

O jogo já chama atenção porque, em vez de exércitos em terra ou no espaço, leva a guerra para as profundezas do oceano. O ambiente subaquático não é apenas cenário: influencia totalmente a jogabilidade, já que recursos, mobilidade e até a visibilidade são diferentes de um RTS tradicional. Sua história também é um ponto forte (apesar de boa parte dela estar apenas no manual que vinha com o jogo).

Após o impacto do Cometa Clark em 2047 (que pode ter sido inspirado pelo cometa 71P/Clark, descoberto em 1973 por Michael Clark), a superfície da Terra foi devastada, restando apenas sobreviventes em cavernas e instalações submersas. Enquanto a vida em terra se tornava precária, as colônias submarinas prosperaram, preservando conhecimento e infraestrutura.

No século XXII, duas potências emergiram: os White Sharks, focados em dominação, e os Black Octopi, que buscavam equilíbrio, mas estavam dispostos a lutar por ele. A descoberta do mineral Corium 276, trazido pelo cometa, fortaleceu ambas as facções e intensificou sua rivalidade.

Os Black Octopi, ao explorarem a cratera de um fragmento do cometa, encontraram uma raça alienígena hostil (vindos com o cometa) com tecnologia avançada. Isso os levou a reforçar suas forças militares.

Finalmente, em 2115, os White Sharks, ignorando o crescimento militar dos Octopi, lançaram um ataque preventivo. Surpreendidos pela resistência, os Black Octopi dividiram suas forças entre enfrentar os alienígenas e defender suas próprias bases contra o ataque humano, e é nesse cenário que o jogador é inserido, tendo que escolher qual facção irá defender.

Imagem 01: O menu inicial já traz todo o clima do jogo. A imagem mostra a visão interna de um submarino com as opções do jogo no painel do veículo

Hoje a ideia de criar colônias permanentes debaixo d’água ainda é mais ficção científica do que realidade, mas existem várias tecnologias que mostram que não é impossível. Algumas delas já estão em uso em escalas menores, outras estão em fase experimental, e algumas ainda estão no campo dos protótipos ou propostas. Vamos entender melhor cada uma delas.

Apesar de antes do impacto do cometa já existirem colônias submarinas no universo do jogo, foi o impacto, e com isso o aparecimento do mineral Corium 276, que causou o rápido avanço na colonização dos oceanos pela humanidade. O mineral, um dos quatro principais recursos coletados no jogo (sendo ouro, oxigênio e metal os outros três) é essencial para a vida humana debaixo d’água. Ele é usado tanto para a geração de energia quanto para a construção de estruturas, sendo bem forte e resistente mesmo sob altas pressões. Apesar de não termos um Corium 276 no nosso universo, podemos tomar outros caminhos para seguir com a geração de energia e construções.

Quanto à energia, poderíamos gerá-la a partir de correntes marítimas, turbinas subaquáticas e/ou painéis solares flutuantes na superfície (a Estação Espacial Internacional gera sua energia através de painéis solares). Porém, não podemos esquecer da energia nuclear. Hoje já usamos energia nuclear em submarinos que podem permanecer submersos por longos períodos, meses a fio, pois a reação nuclear não depende de ar para o funcionamento. Claro, o sistema tem suas desvantagens como alto custo e complexidade técnica, além dos riscos e questões associadas ao manuseio de materiais radioativos, mas ainda assim é uma opção.

Imagem 02: O sistema de geração de energia de um submarino nuclear é o mesmo usado nas usinas nucleares. Na imagem vemos o esquema de geração de energia dentro de um submarino nuclear

Já para a construção de estruturas que resistam a um ambiente tão agressivo como os oceanos (quem vive perto de praias sabe o quanto a maresia acaba com metais), a melhor saída provavelmente seria uma liga, ou melhor, uma superliga. A Inconel é uma superliga à base de níquel-cromo com alta resistência à corrosão, oxidação e temperaturas extremas, desenvolvida para ambientes de alto estresse onde o aço e outros materiais falhariam. Sendo já usada em ambientes marítimos como equipamentos de exploração submarina, peças de navios e plataformas de petróleo. Inclusive já temos uma estrutura dessa em construção para pesquisas.

Imagem 03: A Inconel mantém a cor original dos seus materiais de origem (prateada/cromada). A imagem mostra cinco barras maciças da liga Inconel

O Sentinel é um projeto de habitat submarino idealizado pela empresa britânica DEEP, com a missão de permitir que humanos morem e trabalhem debaixo d’água por períodos prolongados.

Ele é pensado para funcionar como uma estrutura modular, escalável, com acomodações, espaços de trabalho, áreas sociais, laboratórios e banheiros, tudo adaptado ao ambiente submarino. Seus módulos são impressos em 3D por um grupo de seis robôs, usando aço reforçado com a superliga Inconel. Testes em águas profundas estão programados para o final de 2026 e a implantação total para algum momento de 2027.

Imagem 04: Uma arte idealizada de como ficará o Sentinel. Na imagem podemos ver estruturas modulares instaladas no fundo do oceano

Outro recurso muito importante em Submarine Titans é o oxigênio. O elemento é extraído da água com a ajuda de uma estrutura especial. Aqui estamos bem perto da realidade, já que fazemos isso muito bem nos submarinos (olha eles aí de novo).

Submarinos produzem oxigênio através da eletrólise da água, um processo que separa as moléculas de água (H₂O) em hidrogênio e oxigênio usando uma corrente elétrica. A água destilada do mar alimenta o sistema, o hidrogênio é liberado no oceano e o oxigênio é armazenado em tanques e libertado na atmosfera do submarino para manter o ar respirável. A reação geral é: 2 H₂O → 2 H₂ + O₂. Para isso, só precisamos de energia, que no jogo vem do Corium 276 e na vida real, pode vir da energia nuclear.

Um ponto que o jogo não aborda é sobre alimentos e água potável, mas também temos soluções para isso. A hidroponia por exemplo é o cultivo de plantas sem solo, em soluções nutritivas. Quando levada para o ambiente submerso, ela aproveita a estabilidade térmica e a pressão da água para criar biosferas ou estufas subaquáticas. Um exemplo real é o projeto Nemo’s Garden, na Itália, onde estufas transparentes em forma de cúpula são ancoradas no fundo do mar. Esse método mostrou que é possível cultivar hortaliças, ervas e até flores debaixo d’água, com produtividade comparável (ou até superior) à da agricultura tradicional.

Imagem 05: O Nemo’s Garden instalado na Itália. A imagem mostra estruturas semicirculares ao redor de uma estrutura no formato de uma de árvore

Para obtenção de água potável, podemos tratar a própria água do mar, com métodos como destilação térmica, eletrodiálise e dessalinização solar, mas com certeza o mais viável seria a osmose reversa.

A osmose reversa é o método de dessalinização mais usado no mundo hoje. Ele consiste em forçar água do mar, sob alta pressão, a passar por uma membrana semipermeável, que retém sal, minerais e impurezas, liberando apenas água doce. Além de ser extremamente eficiente, já é aplicada em larga escala (Arábia Saudita, Israel, Austrália). O ponto negativo é que o processo exige muita energia e manutenção constante das membranas. Se precisássemos, a maneira mais prática hoje é a osmose reversa, mas em um futuro em que colônias submarinas existam, elas podem adotar sistemas híbridos (solar + membranas avançadas) para garantir autonomia.

Imagem 06: Como o processo de osmose reversa é realizado. A imagem mostra o esquema de tratamento de água através do processo de osmose reversa

Por fim, sobre colônias subaquáticas, temos parte da tecnologia necessária (habitats submersos, energia renovável, cultivo submarino), mas o grande problema é tornar isso sustentável, seguro e economicamente viável a longo prazo.

O que temos mais perto disso hoje é o Aquarius Reef Base (ou simplesmente Habitat Aquarius) o único laboratório submarino permanente do mundo, localizado a cerca de 5,6 km da costa de Key Largo, na Flórida (EUA) e ancorado a 19 metros de profundidade. Ele pertence à NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration), mas é operado pela Florida International University. É um laboratório científico submerso que funciona como “estação de pesquisa do oceano”, comparável a uma estação espacial, mas debaixo d’água — um verdadeiro posto avançado para explorar o mar.

Imagem 07: O Habitat Aquarius instalado nas águas da Flórida. Na imagem vemos uma grande estrutura quadrada instalada no fundo do mar com um mergulhador nadando ao seu lado

Submarine Titans, apesar de nunca ter alcançado a mesma fama de gigantes do gênero como StarCraft ou Command & Conquer, acabou se tornando cult pela originalidade e pelo clima tenso das batalhas submersas. Para quem gosta de RTS clássicos e cenários fora do comum, é uma pérola esquecida no fundo do mar gamer.

E você, já conhecia o jogo? Deixe aí nos comentários se já jogou ou ficou interessado (o jogo pode ser encontrado na GOG por preços bem acessíveis). Até a próxima.

Fontes: Wikipédia, Mega Curioso, Reddit, Internet Archive, CNN Brasil, Quora, BBC e Deviante