No filme de ficção científica de 1966, Viagem Fantástica, um submarino é encolhido e injetado no corpo de um cientista para consertar um coágulo de sangue em seu cérebro. Enquanto o filme é uma obra prima da ficção científica, pesquisadores da Caltech (Instituto de Pesquisa Tecnológica da Califórnia) estão fazendo avanços nesse sentido: eles, pela primeira vez, criaram células bacterianas com a capacidade de refletir as ondas sonoras, bem parecidas com o funcionamento do sonar de um submarino para mapear o fundo do mar.

Cientistas projetam bactérias para refletir sinais de “sonar” como se fosse um submarino.

O objetivo dessa pesquisa é que seja possível injetar bactérias para fins terapêuticos no corpo de um paciente e chegar a um tecido biológico alvo com eficiência, gerando menos efeitos colaterais.

Funciona assim: essas bactérias são injetadas em um indivíduo. Em seguida é usada uma máquina de ultrassom para localizar as bactérias projetadas para emitir ondas sonoras. Imagens são geradas e revelam a localização exata dos micróbios.

As imagens permitiriam aos médicos saber se os tratamentos chegam ao lugar certo no corpo e se estão funcionando adequadamente.

A ideia de usar bactérias como medicamento não é nova. Os probióticos foram desenvolvidos para tratar algumas doenças do sistema digestório, como a constipação e síndrome do intestino irritável. Existem alguns estudos anteriores que demonstraram que as bactérias podem ser usadas para atacar e destruir células cancerígenas. Mas visualizar essas células bacterianas, bem como se comunicar com elas, tanto para coletar informações sobre o que está acontecendo no corpo quanto para dar instruções às bactérias sobre o que fazer em seguida, ainda não é possível, pelo menos por enquanto.

A vantagem dessa técnica é que ela pode penetrar profundamente nos tecidos que serão analisados e abre perspectivas não só de análise e diagnóstico de doenças, mas também no tratamento delas. É um tratamento que funciona ao contrário do antibiótico, por isso é chamado de probiótico.

O pesquisador responsável pelo estudo, Mikhail Shapiro, disse que teve um momento eureka há cerca de seis anos, quando ele soube sobre algumas estruturas proteicas cheias de gás em bactérias que vivem na água e ajudam na comunicação desses micro-organismos. Shapiro levantou a hipótese de que essas vesículas de gás poderiam emitir ondas sonoras de forma que as tornassem distinguíveis de outros tipos de células. De fato, Shapiro e seus colegas demonstraram que as vesículas de gás podem ser usadas em ultrassom no intestinos e em outros tecidos de camundongos.

Um dos desafios da equipe estava relacionado à engenharia genética, pois era necessário transferir genes para produzir vesículas de gás da bactéria encontrada na água para outra espécie de bactéria, a Escherichia coli, que desde muito tempo já é utilizada como probiótico.

A fase da transferência de genes deu certo. Apesar de muitos obstáculos e tentativas fracassadas, os genes responsáveis pela produção de vesículas de gás da espécie bacteriana foi assimilada pela bactéria Escherichia coli.

O gás dessas vesículas possui uma espécie de “assinatura sonora” e assim aparelhos de ultrassom podem identificar o local onde essas bactérias estão com uma precisão incrível.

Apesar de estarmos muito longe da ficção do filme Viagem Fantástica, a pesquisa abre ótimas perspectivas no diagnóstico de doenças através de probióticos, coisa até então inédita no mundo da ciência.

Esse estudo foi realizado pelo Instituto de tecnologia da Califórnia e publicado na Revista Nature, intitulado “Acoustic reporter genes for noninvasive imaging of microbes in mammalian hosts,”


Daniel Pereira. Biólogo, faz especialização em ensino de ciências e matemática. Ama ensinar e aprender. Desde pequeno sua mãe dizia que ele era feito de açúcar, mas depois descobriu que também é feito de proteínas, lipídeos. nucleotídeos e sais minerais. Tudo misturado com água.