Buzz acorda para mais um dia de trabalho na estação espacial Kelly-42. Já faz 256 dias que ele partiu da Terra, ele sente os efeitos disso. Sua cabeça dói. Ele observa o espelho, o sangue que deveria estar em suas pernas pela gravidade agora está em sua cabeça, deixando-a com um aspecto rechonchudo. Além disso, o reflexo que ele vê no espelho está borrado pela sua visão – o nervo óptico está comprimido pela alta concentração de sangue. Mas o pior de tudo é como esse confinamento está afetando o seu psicológico. Ele se dirige à cozinha para mais um café da manhã no espaço e lá encontra seu companheiro, Neil. Este o recebe com mais uma de suas piadas provocativas. Normalmente Buzz ignoraria, mas hoje ele atingiu seu limite. Em sua explosão de raiva, golpeia Neil. Este é lançado para trás girando pelo ar, até que sua cabeça atinge uma barra de ferro que saia da parede, neste momento ouve-se um crack! Nesta hora, o agitado coração de Buzz gela mais que o espaço fora da estação.

Essa historinha pode parecer roteiro de algum filme ruim de ficção científica, mas não é tão insano pensar que algo assim poderia ocorrer. Não ceder a loucura no ambiente hostil que é o espaço exige grande resistência emocional. A razão de algo assim não ter acontecido é pelo fato de que os astronautas são escolhidos a dedo, avaliando-se não só a suas habilidades como também o seu perfil psicológico.

Mas há um grande problema quando se pensa um pouco mais a frente. Muito em breve não poderemos ter um critério tão alto ao mandar pessoas ao espaço. Isso se deve ao fato de que o turismo espacial está cada vez mais próximo de se tornar realidade.

Em 1960, a ONU formulou um tratado – apelidado de “Tratado do Espaço Exterior” – que foi assinado por mais de 100 países. Este tenta garantir que o espaço seja utilizado apenas para fins pacíficos. Ele proíbe o transporte de armas nucleares, impede que nações reivindiquem algum território fora da Terra e responsabiliza o País por algum dano causado por um de seus objetos espaciais – entre outras coisas. Mas não aborda em detalhes os crimes um pouco mais “banais”, como o do primeiro paragrafo.

Em 1991, um Projeto Para uma Convenção sobres Voos Espaciais Tripulados pôs em prática uma cadeia de comando. O comandante da nave seria responsável por sua tripulação e todos os membros responderiam ao diretor de operações do voo espacial. Algo muito parecido com a legislação sobre a aviação.

Mas talvez isso não seja o suficiente, pois estamos tratando de situações diferentes. Um avião é normalmente utilizado para levar de um território a outro e no caso de uma complicação ele pode, com certa facilidade, realizar um pouso de emergência. Já em um voo espacial, serão realizadas estadias no espaço, além de ser mais caro e complicado fazer um retorno não planejado.

O que aconteceria se um alemão cometesse um crime contra um italiano em um módulo russo? Se seguirmos os acordos que regem a vida na ISS, cada nação estende a sua jurisdição aos módulos que financiarem. Porém, segundo Christopher J. Newman (docente em Direito Público na Universidade de Sunderland, no Reino Unido) esse acordo intergovernamental dispõe também que cada signatário têm jurisdição penal de seus nacionais. Como no caso não há nenhum envolvido russo, a situação se apresentaria como um caso para o direito alemão.

Eu sei, é confuso. Muitos advogados abusariam de brechas assim caso algo do tipo ocorresse. Por isso Newman sugere um novo acordo voltado para o turismo espacial e que preencha os vácuos jurídicos acerca do espaço.

Fontes

Seeker

Esa

Wikipédia