A geologia, ciência que estuda toda estrutura e arcabouço do nosso pequeno planeta chamado Terra, foi pela primeira vez citada desta forma no fim do século XVIII, mas como muitos podem ter percebido ela vai muito além dos assuntos que abrangem a mineração e prospecção de petróleo. Tal ciência da Terra está muito mais presente em nosso cotidiano do que imaginamos sendo que praticamente tudo que há a nossa volta teve uma pequena a considerável parcela de participação de um geólogo, um exemplo é a Geologia Médica.

Esta série de textos têm como objetivo principal desmistificar a lenda que o geólogo é aquele “louco” que fica na beira da estrada martelando e quebrando as “pedras” que aparecem nos “barrancos”. Aqui foram separadas algumas áreas das quais pouco imaginaríamos que teria uma participação deste profissional que é pouco ou nunca lembrado pela população em geral.

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Geólogos Trabalhando

Vamos começar com a já citada Geologia Médica que, segundo a CPRM, é definida como a ciência que estuda a influência de fatores geológicos ambientais relacionados  à  distribuição  geográfica  das  doenças  humanas e dos animais. Sempre quando olhamos para o chão, ou para o solo propriamente dito, consideramos que doenças só poderiam vir dessa área por fatores biológicos (bactérias, protozoários, parasitas, vírus, etc.) ou do fator radioativo (contato com minerais radioativos como Urânio, Tório e outros), mas nunca pensamos que elementos que parecem inofensivos poderiam causar males a nossa saúde. Por exemplo, um elemento simples e que é até popularizado como “benéfico” a saúde, o Flúor (F).

A Fluorose, caracterizada por uma mineralização excessiva do esmalte e da dentina do dente que causa, nos casos brandos, linhas esbranquiçadas ao longo dos dentes e, nos casos mais avançados, manchas acastanhadas a amarronzadas e até perda completa da estruturação dental e consequentemente comprometimento da dentição. Tal doença possui pouca participação biológica externa e é associado da ingestão excessiva de flúor provindo de fontes não recomendadas por odontologistas.

Fluorose dentária (Fonte: ident.com.br)

Este flúor, muitas vezes, é provindo da fonte de água potável que chega as nossas casas pela rede de distribuição, mas não significa que devamos parar de beber da torneira exatamente por isso. Todas as companhias de saneamento adicionam flúor na água potável (0,7mg/L a 1,2mg/L) para assim evitar, prevenir e reduzir males dentais que venham a nos atingir, porém, evitando assim apontar como culpado para a fluorose a companhia de água regional, tal pratica não causa esse excesso de flúor na água potável.

Um estudo em conjunto dos departamentos de Geologia (IGC/UFMG) e Odontologia Social e Preventiva (FO/UFMG) realizado no município de São Francisco/MG constatou uma associação entre o consumo prolongado de água subterrânea ao surto de fluorose dentária na região. Foi observado que áreas de águas subterrâneas onde a rocha reservatório pertencia aos calcários do Grupo Bambuí, originados de um ambiente sedimentar marítimo que existia no pré-Cambriano (neoproterozóico). Tais rochas possuem ocorrências comuns do mineral Fluorita (CaF2) que, apesar de possuir solubilidade lenta, são ligeiramente solúveis em águas confinadas por muito tempo (tempo geológico).

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Fluorita roxa (Fonte: hypescience.com)

Claro que o estudo focou-se somente na ocorrência local deste município de tal doença e que o mapeamento efetuado pelos profissionais das áreas de geologia e odontologia permitiu a identificação deste problema.

O alerta não significa que toda água subterrânea possui contaminação por flúor devido a essa característica. A situação de São Francisco/MG foi uma junção de vários fatores como a falta de um controle mais apurado da qualidade química das águas subterrâneas exploradas para consumo próprio unido a uma região onde é comum ocorrer o mineral fluorita nas rochas calcárias que servem de reservatórios para essa fonte de água.

Outros males da saúde já foram identificados em trabalhos conjuntos com geólogos e profissionais da saúde como contaminação por chumbo, mercúrio, alumínio e zinco.

Como curiosidade vale lembrar que os antigos romanos usavam acetato de chumbo, este produzido pela diluição de chumbo no ácido acético (vinagre), como substituto do mel para adoçar os vinhos, o que hoje pode ser associado com o comportamento estranho de imperadores icônicos como Nero e Calígula.

Acetato de Chumbo (Fonte: imimg.com)

Pb2+ + 2 CH3COO(aq) → Pb(CH3COO)2

 

Em breve iremos abordar outras áreas em que a Geologia se faz presente no nosso cotidiano e nem imaginamos.