As frutas venenosas têm capturado nossa imaginação por séculos. O sono da Branca de Neve foi induzido por uma maçã envenenada. Especula-se que a beladona, uma planta com toxinas naturais em seus frutos, foi usada para assassinar um imperador romano . Em outro incidente, uma dose letal de ricina, proveniente de sementes de mamona, foi administrada a um dissidente búlgaro através da ponta de um guarda-chuva.

Mas qual o sentido biológico disso? Por que algumas plantas oferecem frutos venenosos que têm o potencial de prejudicar, ou no mínimo desencorajar, os animais que poderiam dispersar suas sementes?

As plantas precisam espalhar suas sementes para colonizar novos territórios, recuperar a população após distúrbios ambientais, ou evitar os perigos do ambiente atual (por exemplo, se a planta-mãe — a que originou a semente — abriga pragas). Uma maneira de fazer isso é envolver as sementes em polpa nutritiva e chamativa, para que os animais comam a fruta, processem a polpa (digerindo) e, posteriormente, excretem as sementes (e com com uma dose de fertilizante de bônus).

A dispersão de sementes mediada por animais (diferente da dispersão pelo vento ou água) pode ser particularmente útil para levar as sementes a locais específicos, menos “aleatórios”. Por exemplo as plantas parasitas, como o visco (também conhecidos como “erva-de-passarinho”) ou as figueiras estranguladoras, cujas sementes encontram o caminho para os galhos das árvores onde podem prosperar, graças aos pássaros que as levam.

Mas por que produzir veneno? Frequentemente, as frutas verdes (ainda não maduras) são tóxicas, protegendo as sementes imaturas contra ataques ou dispersão antes do tempo. Mas algumas frutas maduras, mesmo com sementes maduras, também podem ser venenosas.

Como explicar que as frutas permaneçam venenosas mesmo quando estão maduras e prontas para a dispersão? Uma teoria é que uma baixa dose de veneno na fruta encoraja os animais frugívoros a se afastarem da planta-mãe (evitando veneno adicional), levando assim as sementes a locais mais distantes.

Em alguns casos, toxinas causam constipação (prisão de ventre), garantindo que as sementes permaneçam mais tempo no intestino e, portanto, aumentem a distância que são carregadas. Em outros casos — como ameixas, mamão — atuam como laxantes para garantir a passagem rápida das sementes com um tempo mínimo de dano durante a digestão.

Há evidências para essas hipóteses, mas elas não respondem todas as dúvidas.

Nem tudo que come frutas é bom para a planta. Os venenos nas frutas podem ser específicos para animais, micróbios e fungos que danificam suas sementes, enquanto são não-tóxicos para espécies que são boas dispersoras de sementes (como no exemplo das pimentas). As frutas da beladona são letais para muitos mamíferos, mas aparentemente inofensivas para algumas aves, e as frutas do espinheiro-alvar são tóxicas para alguns insetos-praga, mas não para aves dispersoras de sementes.

Por fim, a fruta pode ser venenosa simplesmente porque o restante da planta é tóxico. Toxinas que protegem as folhas de herbívoros também podem acabar nas frutas.

Portanto, é necessário considerar a planta como um todo e suas interações com diversos organismos para entender a origem e a função da fruta venenosa.

Vamos então a uma listinha de algumas das frutas que devem ser consumidas com cuidado ou evitadas completamente.

Descrição da imagem: uma variedade de frutas, como peras, ameixas, cerejas e cajás

Maçã (entre outras):

Queridinha entre as frutas, a maçã também já é popularmente associada a veneno, por histórias como a da Branca de Neve. Mas as maçãs realmente contêm em suas sementes uma substância chamada amigdalina, que se divide em cianeto de hidrogênio uma vez que entra em contato com as enzimas digestivas do corpo.

O cianeto pode causar náuseas, febre, dor de cabeça, insônia, sede, letargia, nervosismo, dores e queda na pressão sanguínea, levando à morte. Porém, a concentração de amigdalina presente nas sementes da maçã é extremamente pequena. Pesquisas mostram que o cianeto de hidrogênio é letal quando consumido a partir de 1-2 mg/kg (peso corporal). Assim, para uma pessoa com um peso médio de 75kg realmente ter problemas, precisaria consumir cerca de 20 maçãs com sementes (cerca de 210 sementes).

No entanto, a amigdalina é relativamente comum em sementes de frutas. Ela também está presente nas sementes e caroços de pera, cereja, damasco, pêssego, entre outras. Algumas delas têm quantidades maiores da toxina, e mastigar apenas 3 sementes de cereja já foi suficiente para um inglês ir parar no hospital. Por isso também não é aconselhável bater as sementes junto de frutas ao fazer um suco ou outro preparo para consumo. Ao ingerir as sementes inteiras, as cascas dificultam a digestão e transformação da amigdalina em cianeto.

Frutas de plantas ornamentais, como o louro-cerejo, podem parecer apetitosas, mas também possuem toxinas perigosas, como o ácido cianídrico, cuidado! Descrição da imagem: frutas pretas e redondas na planta.

Carambola:

A carambola, ou fruta-estrela, é muito apreciada por sua forma única e sabor refrescante. No entanto, esta fruta tropical esconde um segredo perigoso. A carambola contém compostos naturais chamados oxalatos, que, em excesso, podem se transformar em cristais nos rins, levando à formação de pedras.

Descrição da imagem: uma carambola inteira e duas carambolas cortadas no seu característico formato de estrela.

Para a maioria das pessoas, consumir carambola ocasionalmente não é um problema, mas aqueles com problemas renais devem evitar seu consumo em grandes quantidades.

Akee:

Morentina ou castanheiro-de-áfrica (Blighia sapida) é uma planta da mesma família do guaraná), com origem na África Ocidental, Costa da Guiné. É típica de clima tropical. Sua fruta é tóxica, principalmente quando verde.

Descrição da imagem: duas frutas chamadas akee penduradas em uma árvore. A fruta é de cor vermelha e uma das frutas está aberta, exibindo suas sementes brancas com as pontas pretas, lembrando olhos humanos.

Ela contém hipoglicina, substância que também é encontrada nas lichias, principalmente verdes. A ingestão de uma única fruta não madura pode causar sérios problemas de saúde, pois a hipoglicina pode causar vômitos, desidratação,  convulsões, coma e até morte.

A intoxicação por ingestão de Akee também é conhecida como “doença do vômito jamaicano”. O arilo, polpa esbranquiçada na base da semente, pode ser consumido quando o fruto está maduro, quando se abre, e é aconselhável cozinhá-lo.

Mancenilheira – A Árvore da Morte:

A fruta da mancenilheira (Hippomane mancinella) é a grande campeã quando se trata de perigo. Ela é tão mortal que ganhou um lugar no Guinness World Records como a fruta mais perigosa do mundo.

A árvore cresce nas regiões tropicais da América Central e Caribe, e seus frutos têm uma aparência atraente, semelhante a pequenas maçãs verdes. No entanto, não se deixe enganar por sua aparência inocente, pois esta fruta é extremamente tóxica. Ela também é chamada de manzanilla de la muerte (pequena maçã da morte) em espanhol.

Descrição da imagem: à esquerda uma foto da árvore da Mancenilheira, uma árvore grande e com a copa bem fechada de folhagem verde. À direita várias frutas da Mancenilheira caídas no chão, pequenas frutas redondas e de casca verde clara.

A toxina presente na mancenilheira é conhecida como hipoglicina A e pode causar sintomas graves, incluindo vômitos, diarreia, convulsões e até a morte. Um único fruto da mancenilheira contém uma quantidade letal da substância. E não é apenas consumir os frutos que é perigoso. Apenas chegar perto da árvore da Mancenilheira já pode causar problemas. O toque na árvore ou nos frutos pode causar sérias queimaduras na pele.

Isso porque as substâncias tóxicas da mancenilheira podem ser liberadas ao encostar em qualquer parte da árvore. Ficar debaixo da árvore durante a chuva, é como tomar um banho de veneno. Cortar a madeira também não é recomendado, já que o veneno pode ser liberado no ar. Sua queima também gera uma fumaça tóxica. Durante séculos, a seiva de mancenilheira foi usada para envenenar flechas de tribos locais.

Felizmente, as advertências sobre a mancenilheira são amplamente divulgadas nas áreas onde ela cresce, e é extremamente raro que alguém consuma essa fruta por engano. Além disso, a mancenilheira não depende de animais para dispersar suas sementes, pois a água do mar cumpre esse papel.