Atualmente, um tema atravessa grandes discussões a respeito de alimentação e responsabilidade ambiental. Nós, como consumidores, já entendemos que vivemos em um período bem turbulento do ponto de vista ambiental e que nosso consumo pode ajudar a moldar o mundo. Contudo, estigmas como greenwashing tendem a diminuir a efetividade das estratégias ambientais na alimentação.

Caso não conheça o greenwashing, clique no link acima. Pode ser importante ler sobre a “lavagem verde” para entender parte desse texto.

A consciência ambiental é de suma importância nos dias de hoje. Reconhecendo a potencialidade desse mecanismo, somos capazes de saber a viabilidade comercial de projetos ambientais, marketing verde e outras certificações e rotulagens. Antes de colocar essas ideias à prova, precisamos saber se os consumidores cogitam a preservação dos ecossistemas e suas externalidades, incluindo impactos sobre aquíferos, modulação climática e biodiversidade.

Nesse texto, vamos entender o que é consciência ambiental e qual é sua importância para as estratégias de mercado voltadas a produtos alimentícios. Afinal, será que o grau de consciência ambiental do consumidor pode influenciar nessas estratégias? É isso que vamos explorar.

Consciência ambiental é o conjunto de fatores internos e externos ao indivíduo que o faz desenvolver predileção maior por produtos socioambientalmente sustentáveis [1]. Cultura, crenças, valores, convívio e situação social são condições internamente determinantes na situação de compra. Já fontes de informação mercadológicas e não mercadológicas (como amigos e a gastronomídia) se destacam como elementos externos à consciência pessoal.

A postura de comunicação das empresas verdes pode se moldar dependendo do potencial mercadológico vindo desses consumidores. Afinal, são pessoas que estão dispostas a pagar mais por informações mais claras e propostas sustentáveis verdadeiras, como já vimos no texto sobre Rotulagem Climática.

 

Imagem um. Reportagem do The Intercept Brasil indica que, a cada 1º C de aumento de temperatura, decorrente de mudanças climáticas, a inflação no preço dos alimentos é elevada em 0,2%. Políticas como Reforma Agrária podem facilitar melhorias em sustentabilidade, com a desapropriação de grandes fazendas, assentamento de famílias, políticas de extensão, assistência técnica e crédito rural [2]. Na figura, é observado um senhor em uma banca vendendo diversas sementes, nozes e outras oleaginosas.

O consumo de alimentos orgânicos e naturais não é um hábito de somente um perfil de pessoas com consciência ambiental [3]. Relacionamentos, práticas urbanas, escolaridade e comportamentos saudáveis interferem nessa análise. O grau de consciência ambiental apenas pontua o conhecimento dos valores ambientais e seu compromisso com melhorias nos agrossistemas. Assim, esse grau diferencia as pessoas em algumas classes especiais, baseado no perfil de consumidores de alimentos naturais e orgânicos.

Utilizando formulários e ferramentas de score, somos capazes de pontuar o grau de consciência ambiental — CA — de um indivíduo que se alimenta de produtos saudáveis, naturais ou minimamente processados. Munidos dessa informação, eles são caracterizados em certos grupos de interesse ao marketing ambiental. O grau de consciência ambiental diz muito sobre esses grupos de consumidores.

A primeira classe é classificada como individualista, ou egotrip [1]. Neste perfil, destaca-se o estilo de vida pessoal em detrimento de valores ambientais nos hábitos de compra. Sensorialidade, hedonismo e familiaridade ditam mais o hábito de comer saudável-orgânico-sustentável do que os ditos valores ambientais.

Com um pouco mais de consciência, encontramos o consumidor eficiente. Ele é caracterizado por ser bastante cuidadoso com relação aos impactos dos alimentos em seu bolso. Ele costuma procurar preços antes de comprar, zelando pela qualidade dos serviços e produtos que consome. Práticas de greenwashing não são bem vistas por esse público, que zela pela entrega completa daquilo que foi prometido. Apesar de conhecimento moderado dos valores ambientais, ele demonstra insatisfação com assimetrias de informação de empresas não transparentes.

Se a estratégia de uma “empresa verde” é simplesmente colocar um selo de sustentabilidade, sem indicar onde o mesmo foi auditado, ela provavelmente começará a ter problemas com esse consumidor. Não é qualquer rótulo que consegue ganhar esse consumidor, que preza por informações claras e benefícios reconhecíveis.

Com um pouco mais de consciência, temos o consumidor responsável. Ele leva em consideração informações sobre as empresas que consome, podendo deixar de comprar de uma companhia se descobrir malefícios de compromisso socioambiental. Membros desse perfil podem ter deixado de consumir produtos das vinícolas do sul em 2023 depois das denúncias de trabalho escravo.

O consumidor consciente é aquele de último grau na escala. Ele concebe o seu consumo como fio condutor de valores socioambientais, acreditando na possibilidade de mudanças locais e internacionais por meio das escolhas individuais. O entusiasta da dieta planetária, crudívora e até mesmo naturalista se encontra nesta escala.

Isso pode ocorrer pois esse consumidor reconhece os alimentos ultraprocessados como catalisadores de diversos problemas ambientais, que se iniciam no campo e vão até o corpo do comensal. Para muitas empresas, pode não ser tão interessante seus clientes terem tal grau de consciência.

 

Imagem dois. A preocupação com sustentabilidade tem moldado setores importantes, como a gastronomia. Alguns serviços têm buscado práticas de sustentabilidade de olho em um novo público de consumidores [4]. Valorização de produtores locais, respeito pela natureza e economia de energia são os valores observados em algumas novas práticas culinárias. Na figura, observa-se um trabalho gastronômico.

A CA, portanto, é importante para definir diferentes grupos de consumidores, que se agrupam em paradigmas comuns e que precisam de necessidades diferentes na apresentação de produtos socioambientalmente corretos. Com a educação ambiental, novos mercados se desenvolvem de olho nesse repertório cultural.

Reconhecer o grau de CA virou uma necessidade emergente na indústria alimentícia. As empresas estão dispostas a investir em produtos verdes, vegans e sustentáveis até certo grau. Para maximizar suas margens de lucro, contudo, elas não podem deixar que o consumidor tenha tanta percepção dos problemas da cadeia de alimentos.

Com essa dissonância, alinhada ao baixo investimento em educação ambiental, estamos ficando cada vez mais descobertos ao greenwashing. Para piorar, o cenário de regulação de propaganda verde ainda é pequeno, deixando-nos sujeitos a diferentes tipos de práticas de desinformação ou inverdade na produção ou rotulagem de produtos verdes.

Alguns pontos do Código de Defesa do Consumidor são contra a propaganda enganosa, mas as práticas do ambientalismo corporativo conseguem driblar suas penalidades [6]. Assim, podemos encontrar selos ambientais sem auditoria, termos vagos e discursos genéricos que confundem o consumidor, sufocando negócios realmente corretos.

Algumas entidades como o Instituto de Defesa do Consumidor — Idec — articulam um manifesto junto à Secretaria Nacional do Consumidor — Senacon — para proibir de vez o Greenwashing como prática corporativa, aplicando penalidades mais específicas ao crime cometido pelas indústrias infratoras.

A organização deixa um guia para reconhecermos as diferentes fases da lavagem verde e seus malefícios na cadeia de suprimentos (link aqui). Com a criação de decretos e leis sobre o tema, é possível que o ambiente de negócios no Brasil fique um pouco mais limpo dessas mentiras. Alguns países latinos já legislam o tema em seus territórios, mas essa regulação ainda é uma promessa no cenário brasileiro.

Uma sociedade promotora de consciência ambiental de alto grau também ganha outros benefícios [5], afinal novas subjetividades surgem com essas preocupações, transformando paisagens  e criando hortas urbanas e ecoescolas. Termos consciência do que chamamos de alimento será algo cada vez mais imprescindível para delimitarmos que futuro iremos colher juntos. Pelo menos antes que o corporativismo verde crie esse horizonte por nós.

 

Referências
[1]: PRADO, Nágela Bianca do. Perfil dos consumidores de alimentos orgânicos e naturais: greenwashing ou consumo consciente?. Caderno Técnico de Administração Contemporânea, CTAC, v.2, n.2, p.33-48. Ago. 2020. 
[2]: FURNO, Juliane. Por que o preço dos alimentos está subindo tanto?. Portal The Intercept Brasil, 26 fev. 2025. Disponível aqui.
[3]: SAFRAID, Giovana Flores et al. Perfil do consumidor de alimentos funcionais: identidade e hábitos de vida. Brazilian journal of food technology, v. 25, p. e2021072, 2022.
[4]: OLIVEIRA, Adriele. Gastronomia sustentável: qual o impacto no mercado de alimentação?. Portal Educa+Brasil, 13 jun. 2024. Disponível aqui.
[5]: CONCEIÇÃO, Gyselle et al. A educação ambiental como ferramenta para uma alimentação saudável: experiência em uma ecoescola. Conjecturas, v. 22, n. 5, p. 323-339, 2022.
[6]: OLIVEIRA, Rodrigo. Organização propõe decreto para coibir “mentira verde” no Brasil. Portal O Joio e o Trigo, 12 fev. 2025. Disponível aqui.