“A essência da nossa espécie é explorar — para encontrar novas respostas e novo significado para quem nós somos.” – Pat McCarthy, diretor GMT

Quando observamos a agenda científica de nossos tempos, podemos observar que algumas dúvidas permanecem, e não apenas porque as tecnologias necessárias para que respondêssemos a essas perguntas ainda não tenham sido desenvolvidas, mas porque as perguntas remetem a motivações essencialmente humanas.

Nessa jornada do desenvolvimento científico e tecnológico algumas perguntas parecem estar mais próximas do que nunca de serem respondidas. A existência de vida fora da Terra é uma das perguntas às quais o projeto que apresentaremos no decorrer desse texto tentará nos auxiliar a responder. Então, vamos lá!

O projeto GMT

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O Telescópio Gigante de Magalhães, do inglês GMT (Giant Magellan Telescope), será o primeiro telescópio baseado em terra cunhado como Telescópio Extremamente Grande (ELT). Ele será construído na privilegiada região dos Andes Chilenos, no sítio Las Campanas. E, sim, ele é realmente grande. Para termos uma ideia do tamanho desse telescópio, a cúpula rotativa que o abrigará terá 61 metros de altura, o que equivale a um prédio de 22 andares!

Esse singelo telescópio contará com sete espelhos primários de 8,4 metros de diâmetro cada e terá também sete espelhos secundários com 672 atuadores por segmento, somando 368 m2 de área coletora. Ele atuará na faixa de operação em comprimento de onda do violeta ao infravermelho (3.200 – 250.000 Angstroms).

Sempre que pensamos nos telescópios atuais, nos voltamos ao tamanho dos seus espelhos. Essa preocupação com a área coletora de um espelho é algo muito comum na astronomia, pois é essa área que define a quantidade de fótons que o telescópio conseguirá captar.

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Para quem ficou impressionado com o tamanho mencionado dos SETE espelhos primários, a dúvida de como eles são feitos lhes surge na mente. Então, vamos falar também sobre esse imprescindível componente do GMT.

Sempre que estamos falando de tecnologia de ponta, nos voltamos ao desenvolvimento dessa tecnologia. E, no caso dos espelhos primários do GMT, os mesmos vêm sendo desenvolvidos pelo Laboratório de Espelhos da Universidade do Arizona (no inglês RFCML).

Você deve imaginar, também, que mesmo tendo uma tecnologia avançada no desenvolvimento desses espelhos, apesar de não ser justo compara-los com a tecnologia antiga, eles devem ser muito pesados. E, sim. Cada um desses tem um peso de cerca de 16 toneladas!

O tempo para construção de cada espelho é significativo. Afinal, seu processo possui várias fases, e cada uma delas tem de ser impecável para que o resultado final desse espelho atinja as expectativas do propósito para o qual eles foram desenhados.

Uma das primeiras fases desse processo é a de modelagem do espelho e seu posterior resfriamento. Essa fase dura em torno de um ano até a sua conclusão. Posterior ao resfriamento, entra a fase de polimento do espelho, a qual leva em torno de mais três anos para a sua conclusão.

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Até aqui falamos apenas dos espelhos primários, mas ainda há os espelhos secundários! E é nesses espelhos que a “mágica” acontece.

Como mencionado anteriormente, o GMT atuará em terra e, para que ele venha a ter a resolução esperada, será necessário utilizar uma técnica chamada de óptica adaptativa.

A técnica de óptica adaptativa faz com que as perturbações atmosféricas que prejudicam as observações possam ser corrigidas em tempo real. Para isso o GMT utilizará 672 atuadores mecânicos em cada um dos espelhos secundários, modelando-os para correção dessas perturbações atmosféricas. E, para que essa técnica funcione, o GMT usará, também, lasers que serão lançados na atmosfera.

Assim, as imagens obtidas pelo GMT terão uma qualidade igual a que se obtém fora da nossa atmosfera. Ou seja, mesmo que o GMT esteja em terra, a qualidade das imagens que ele produzirá será a mesma que as imagens tiradas pelo Telescópio Hubble. Aliás, devido aos aprimoramentos técnicos implementados ao GMT e seu poder coletor 100 vezes maior que o do Telescópio Hubble, espera-se que ele venha a produzir imagens 10 vezes mais nítidas que esse telescópio espacial.

“Mas quando essa maravilha estará pronta? ”, você deve estar se perguntando.

Esse tão esperado telescópio tem a sua primeira luz, forma que comumente se usa em referência ao momento em que o telescópio captará o primeiro fóton, prevista para 2024. Nessa época o telescópio estará atuando, inicialmente, com 4 espelhos.

O Consorcio

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Já entendemos que esse telescópio promete muitas coisas, e começamos a imaginar as cifras que envolvem a sua construção. Quando olhamos as estimativas de custo do projeto, nos voltamos a bagatela de cerca de 1 bilhão de dólares.

Podemos achar que o custo do GMT é bem salgado e na verdade é (dependendo do ponto de vista), mas quando o comparamos com outros telescópios como o E-ELT (do inglês European Extremely Large Telescope, com custo estimado em 1.083 milhão de euros) ou o JWST (do inglês James Webb Space Telescope, com custo estimado de 10 bilhões de dólares), vemos que na verdade ele tem um custo justificável.

Agora, para quem ficou curioso com quem irá arcar com o investimento, ele será custeado por um consórcio internacional que foi formado pelos seguintes órgãos:

I) Arizona State University;

II) Astronomy Australia Ltd.;

III) Australian National University;

IV) Carnegie Institution for Science;

V) FAPESP – The São Paulo Research Foundation;

VI) Harvard University;

VII) Korea Astronomy and Space Science Institute;

VIII) Smithsonian Institution;

IX) Texas A&M University;

X) The University of Texas at Austin;

XI) University of Arizona, e;

XII) University of Chicago.

Isso mesmo, o Brasil está envolvido na construção do GMT através da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), que entrou nesse projeto com um investimento de cerca de 5% do seu valor total (500 milhões de dólares).

O mais interessante para os pesquisadores brasileiros é o fato da FAPESP estar envolvida com esse projeto, pois isso remete a utilização de cerca de 4% do tempo do telescópio por esses mesmos pesquisadores. Ou seja, estudantes brasileiros poderão contar com dados de ponta obtidos pelo GMT, e isso coloca o Brasil em uma posição de destaque no que diz respeito às pesquisas científicas dentro dessa área do conhecimento.

Ambições do projeto

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Já entendemos a grandeza desse telescópio, a amplitude do empreendimento internacional envolto na sua construção, mas o que podemos esperar desse telescópio, na prática?

O projeto GMT tem uma série de ambições científicas. Um telescópio deste porte poderá trabalhar com projetos que vão desde a origem e evolução do nosso universo até a busca de exoplanetas! E para que possamos explorar um pouco da sua capacidade, vamos citar apenas uma dessas áreas tão empolgantes: a busca por planetas extra-solares que possuam as características que favoreçam a evolução de vida.

Quanto a busca de exoplanetas, as previsões teóricas quanto ao nível de detalhes que o GMT virá a produzir nos diz que será possível obter, por exemplo, uma distinção da cor e até mesmo da atmosfera de planetas fora do sistema solar. Ou seja, com esses dados poderemos estudar o universo de uma forma muito mais completa do que hoje é possível com a instrumentação que atualmente nos é disponível.

Para que possamos ter uma ideia da importância desses dados no estudo de exoplanetas, podemos trazer um exemplo das características que encontramos em nosso próprio planeta e que nos dizem muito sobre o que nele há:

Se um observador proveniente de outro sistema planetário extra-solar conseguisse distinguir em sua observação o nosso planeta, a Terra, e conseguisse também observar as características da nossa atmosfera, ao identificar a presença de oxigênio, ele levantaria uma bandeira de atenção. O oxigênio, ele poderia compreender, é um composto quimicamente reativo e só poderia estar presente em grande quantidade na nossa atmosfera por processos que viessem a repor esse oxigênio na atmosfera. Ou seja, ao identificar oxigênio em nossa atmosfera, esse observador poderá dizer que há fortes indícios que o nosso planeta contém vida. E o mesmo pode ser feito por nós.

Principais instrumentos

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E para que o GMT venha a conseguir chegar a essas conclusões outros instrumentos além dos espelhos são necessários: os espectrógrafos. Eles são igualmente importantes aos próprios espelhos, pois é através deles que a luz captada pelos espelhos vem a ser analisada.

E aqui falaremos brevemente de dois desses equipamentos e suas funções. E o mais legal: esses dois equipamentos têm desenvolvimento tecnológico brasileiro:

GMACS: O Espectrógrafo Cosmológico e Astronômico Multi-Objeto é um instrumento que entregará espectroscopia de resolução moderada sobre um grande campo de visão que vai desde o UV próximo (ultravioleta) até regiões de IR próximo (infravermelho) do espectro. Ele será utilizado para estudos de evolução de galáxias, evolução intergaláctica, matéria circunstelar e estudos de populações estelares, entre outras aplicações.

G-CLEF: O Espectrógrafo Echelle de Luz Visível é um instrumento alta resolução, adaptado às observações de velocidade radial de precisão, investigações em astrofísica estelar e estudos do meio intergaláctico. Esse espectrógrafo se voltará em grande parte ao estudo de planetas fora do sistema solar.

Bom… Agora que conhecemos um pouco mais sobre o GMT, suas características e o que podemos esperar dele, creio que a fagulha da curiosidade que está acessa em mim também atingiu você.

Poderíamos continuar apresentando as expectativas que depositamos sobre o desenvolvimento tecnológico futuro, ainda mais quando falamos de projetos os quais muitos de nós veremos ainda em vida. Mas, afinal, além de todos os resultados que já esperamos que o GMT e tantos outros telescópios venham a obter, o que mais me intriga é aquilo que não esperamos descobrir e que, junto aos resultados das pesquisas de fronteira, nos será apresentado.

Até a próxima com mais informações sobre telescópios que podem revolucionar o que conhecemos sobre o universo e “vida longa e próspera”!

“O céu nos chama. Se não nos autodestruirmos, um dia vamos nos aventurar pelas estrelas. ” – Carl Sagan

 

Referências:

Site do Giant Magellan Telescope

Giant Magellan Telescope Scientific Promise and Opportunities

Site brasileiro do GMT, pela FAPESP junto ao IAG-USP

Vídeo de apresentação do projeto feito pela FAPESP

Vídeo do Bláblálogia feito pelo Sérgio Sacani apresentando o GMT

Todas as imagens utilizadas na publicação provêm da galeria disponível no site do GMT

001 – Questões que movem a humanidade

002 – Métodos de Detecção