Mesmo sabendo que há muita discórdia entre as pessoas na internet, uma coisa que não podemos negar é o fato de que 2020 está sendo um ano peculiar, para não dizer outra coisa. Aquele típico momento em nossas vidas que qualquer coisa pode acontecer e nenhuma delas causa tanta surpresa. Nesse momento da minha vida, com um pouco mais de 40 anos de idade, não imaginava que iria viver uma pandemia generalizada e que muitos de nossos governantes não teriam a menor ideia de como lidar com o assunto.

Apesar do caos que a vida de todos nós está e, mesmo me informando sobre como as coisas estão caminhando, as perspectivas de minimização do problema ou ainda como estamos evoluindo como seres humanos, tenho a forte tendência a ter um olhar positivo sobre as coisas. Fomos forçados a nos adaptar à uma situação super complexa e eu tenho conseguido passar mais tempo ao lado das pessoas que eu amo e que são verdadeiramente importantes em minha vida.

Ultimamente tenho me deparado com inúmeras situações e tenho pensado muito sobre nosso comportamento, não apenas como indivíduo, mas também como grupo, como sociedade. Tenho chegado à algumas conclusões de que, quando estamos com os olhos, e todos os outros sentidos, abertos para enxergar o que normalmente está escondido, temos muitas revelações importantes.

Recentemente estava no escritório (um daqueles momentos inevitáveis mesmo durante a pandemia) e durante as nossas conversas de café, vários assuntos surgiram: política, economia, cinema, trânsito, mulheres, homens, trabalho, filhos… Em um determinado momento, uma das pessoas do grupo estava contando uma história e mencionou um nome de uma pessoa envolvida nesta história. Outra pessoa do grupo, prontamente, perguntou: – Ah, é a Fulana, Diretora do Departamento 123, da Empresa 456? – Essa maneira como a pessoa foi identificada me chamou muito a atenção e comecei a refletir o que leva as pessoas serem identificadas dessa forma.

Tenho muitas recordações da minha infância, dentre elas o fato de que comecei a frequentar a escola apenas aos 7 anos de idade, diferentemente da maioria dos meus amigos. Tinha acabado de me mudar para um bairro novo e não conhecia ninguém. Alguns dias depois da mudança começaram as aulas e, logo no primeiro dia, tive a sensação de que outras crianças já se conheciam e formavam seus grupinhos. Foi um processo difícil de adaptação e aceitação nesses grupos. Ao longo dos meses fui me enturmando e logo fazia parte de um deles: o grupo dos nerds, ou CDFs como chamávamos naquela época. Aos 7 anos o sentimento de pertencimento já estava se manifestando e eu ainda não fazia a menor ideia do que isso significava.

Hoje em dia é bastante comum ouvirmos o termo pertencimento. Mas afinal o que significa esta palavra?

Segundo o portal Dicionário Informal, pertencimento é a crença subjetiva numa origem comum que une distintos indivíduos. Os indivíduos pensam em si mesmo como membros de uma coletividade na qual símbolos expressam valores, medos e aspirações. Esse sentimento pode fazer destacar características culturais e raciais. A sensação de pertencimento gera uma necessidade de sentir como pertencentes a um lugar e, ao mesmo tempo, que esse lugar nos pertence. Assim, acreditamos que podemos, e que vale a pena, interferir nos rumos deste lugar.

Essa sensação é tão intensa que, quando não fazemos parte de um determinado grupo que admiramos, buscamos encontrar meios para que sejamos aceitos nele. Não é raro pessoas buscarem entrar nos grupos a qualquer custo, mesmo que isso signifique passar por cima de alguém ou utilizar-se de meios escusos. Também é bastante comum pessoas ficarem com depressão, simplesmente por não fazer parte de um determinado grupo tão desejado.

Usar uma roupa de marca, nos coloca como parte do grupo das pessoas que estão na moda; ter um iPhone, nos coloca no grupo de usuários de alta tecnologia; viajar pelo mundo, nos coloca no grupo de pessoas que já tiveram a oportunidade de conhecer outras culturas; assistir as séries da Netflix ou da HBO, nos coloca no grupo das pessoas que conhecem sobre House of Cards ou Game of Thrones; ocupar um cargo de diretoria em uma multinacional, nos coloca em um grupo de profissionais, ou de seres humanos, bem sucedidos.

No limite máximo da sensação de pertencimento, as pessoas confundem suas próprias identidades com a dos grupos aos quais elas pertencem. Isso ajuda a explicar o motivo pelo qual as pessoas se identificam, como na história que eu ouvi outro dia.

Para nós seres humanos, é importante que façamos parte de grupos, que pertençamos à algo. Afinal, como disse o filósofo Teilhard de Chardin, “nenhum homem é uma ilha“. É importante para exercitarmos as relações interpessoais e também ter algo com que se importar. Porém, é bastante comum vivermos a confusão entre: SER parte de um grupo e ESTAR parte de um grupo.

SER parte de um grupo, é quando os motivos que nos levaram a ele são aqueles que possuem uma relação bem próxima com a nossa essência: nossas crenças e nossos valores; uma conexão emocional e natural.

ESTAR parte de um grupo, é quando os motivos que nos levaram a este grupo são aqueles que possuem pouca ou nenhuma relação com a nossa essência. Pode ser situacional, temporal, ou por qualquer outro motivo, mas há uma baixa conexão emocional e natural.

E toda essa reflexão surgiu quando percebi que a maneira como nos identificamos tem um detalhe que faz toda a diferença. No lugar de usarmos: “Eu SOU Ciclano da Silva e SOU Gerente de Assuntos Aleatórios, da Multinacional Assuntos Diversos”, a pessoa poderia se identificar como: “Eu SOU Ciclano da Silva e ESTOU Gerente de Assuntos Aleatórios, da Multinacional Assuntos Diversos”.

O uso do verbo SER é perene, assim como é perene participar de grupos dos quais suas causas fazem parte de nossas crenças, ou fazer parte de tribos que nos permitem ser autênticos sem nenhum tipo de preocupação, preconceito ou receio.

Na outra extremidade, o uso do verbo ESTAR é efêmero, assim como é efêmero usar roupas da moda, ter gadgets de última geração ou ocupar cargos importantes, ou não, em grandes empresas.

Meu nome é Marcel Vitorino. SOU careca por falta de opção, pai babão, esportista, curioso, músico, pensador, nerd e normalmente digo que sei fazer algumas coisas gostosas quando me aventuro na cozinha. Muito prazer!!!