Feliz Ano Novo, queridos ouvintes, sejam todos muito bem vindos a mais um Spiiiiiiiiin de Notícias, o seu giro diário de informações científicas… em escala sub-atômica. Meu nome é Isabela Fontanella e no dia 7 Auroran  do calendário que ninguém usa, mais conhecido como dia 08 de janeiro de 2021 (o que significa que sobrevivemos a 2020) falei de história, economia e relações internacionais. Sim, tudo junto e misturado.

No programa de hoje vou contar para vocês um pouco da história de Cordell Hull, que apesar de esquecido pela história é o motivo de termos o mundo como conhecemos hoje. Então, roda a vinheta.

Cordell Hull

Hoje falaremos de um nome pouco citado, apesar de ser muito relevante, como eu falei, para a história, as relações internacionais e a economia mundial. Cordell Hull foi um político democrata americano que serviu na Câmara e posteriormente como Secretário de Estado de Roosevelt. Até hoje ele é o que ficou mais tempo no cargo (de 1933 a 1944). Este era um político de muitas facetas: ele que desenhou as leis de imposto de renda federal e estadual nos EUA e era chamado por Roosevelt como o “pai da ONU”.

Por seu esforço na construção das Nações Unidas, Hull recebeu o Nobel da Paz em 1945 – e a justificativa do comitê do Nobel citava também “sua luta contra o isolacionismo americano e seus esforços para criar um bloco pacífico de países no continente americano.” Esse “bloco pacífico” nada mais era que a Política de Boa Vizinhança. Mas mesmo essa política estava baseada na principal ideia que Hull desenvolveu na sua vida política: pare ele o comércio internacional era fonte de paz. Ele basicamente acreditava que nações que tinham comércio entre sim evitariam entrar em guerra.

Para quem não sabe, essa é exatamente a premissa que marca a Comunidade do Carvão e do Aço que uniu França e Alemanha (mais Itália, bélgica, Holanda e Luxemburgo) em um acordo e foi um dos, senão o principal pilar fundamental para a UE como conhecemos hoje. Além disso, esta ideia de comércio e paz baseia a teoria de que ajuda econômica a países ajudaria a combater o terrorismo.

Mas voltando ao Hull, ele já enxergava nos anos 1920 que as medidas protecionistas americanas do pós 1a Guerra Mundial – em especial o aumento exorbitante de tarifas a importações – tinha mais efeitos negativos do que positivos, pois desencadeavam uma resposta negativa dos países cujos produtos tinham dificuldade de entrar no mercado americano. Mas seu ativismo na Câmara foi em vão. Após a Grande Depressão de 1929, a pressão do Norte mais industrializado conseguiu emplacar uma agenda ainda mais protecionista e foi aprovado nos EUA o Smoot-Hawley Act. Nele, basicamente os EUA se entrincheiravam em tarifas que aumentavam muito o preço de produtos importados no mercado americano – o que favorecia os produtores locais. A principal resposta foi um aumento das tarifas por parte da Europa – o que bloqueou as exportações americanas para o velho continente. Vamos lembrar que naquele momento não tinha nenhuma organização internacional sobre o assunto e nem conceitos econômicos mais modernos. O principal manipulador da curva de oferta e demanda para comércio internacional eram as tarifas alfandegárias.

Em 1933 Hull é convidado por Franklin Delano Roosevelt para ser Secretário de Estado e de lá ele consegue aplicar melhor suas ideias. Já no ano seguinte ele consegue uma enorme vitória com a aprovação do Reciprocal Trade Agreements Act (que vou chamar de RTAA para facilitar). Essa lei dava ao presidente poder para negociar acordos bilaterais de comércio com outros países sem a necessidade de negociar com o Congresso. Além de simplificar o processo de negociação, impedia que lobbies regionais afetassem as políticas comerciais a nível nacional. Esse é o primeiro passo para fora do protecionismo americano.

Dois pontos cruciais do RTAA é que ele dificultava que o Congresso revertesse reduções tarifárias negociadas pelo presidente e baseava todas as negociações em reciprocidade. Isto é, os EUA baixariam as tarifas em troca do mesmo para algum de seus produtos – garantiam apoio ao projeto. Vale ressaltar que o RTAA valia só para acordos bilaterais porque nos anos 1930 as negociações multilaterais não eram comuns.

Hull acompanhou diversas outras negociações em tempo de Guerra com os aliados e acabou deixando o governo em 1944 por questões de saúde. Porém, as semestes plantadas por Hull viriam a florescer em sua melhor forma depois de sua saída do governo. Em 1948, começaram as negociações da Carta de Havana – uma das primeiras tentativas de um grande acordo comercial multilateral – que bebeu na fonte direta do Reciprocal Trade Act de 1934 e das ideias de Hull, mas dando um passo em direção ao plano multilateral. As negociações acabarm falhando em criar a Organização Internacional do Comércio, mas deixaram as bases para o que viria a ser o GATT – o General Agreement on Tariffs and Trade.

Para quem não sabe, o GATT fugia aos padrões de organizacões internacionais como FMI, Banco Mundial e ONU, pois funcionava como grande acordo multilateral – com rodadas de negociações – cujo principal objetivo era reduzir as tarifas internacionais e promover mais comércio entre os países. O GATT nada mais é que o acordo que deu base para a OMC como conhecemos hoje.

E para ser ter uma ideia do impacto das ideias de Hull sendo aplicadas no mundo, estima-se que antes de 1934 a média de tarifas americanas no comério era de 46%. Menos de 30 anos depois era de 12%. E com os EUA abrindo as portas, o mundo seguiu.

E nesses tempos em que falamos tantos da Guerra comercial China X EUA, do acordo falido entre Mercosul e UE e da grande dúvida do que será a economia internacional pós-Covid 19, basicamente esquecemos que o mundo como conhecemos hoje – em que você tem um celular fabricado na China, montado nos EUA e vendido no Brasil – tem base nas ideias de reciprocidade e livre comércio de Cordell Hull.

Por hoje é só galera, deixei no post dois links sobre a história e a importância de Hull para o comércio internacional. Vocês não só podem como devem deixar comentários, sugestões ou memes do Trump sendo expulso da Casa Branca. É importante lembrar que esse podcast só existe por conta do apoio dos nossos lindos padrinhos e madrinhas! Para se tornar um deles, basta contribuir para o patronato do SciCast, no Patreon, Padrim OU no PicPay. Um beijo e até amanhã!

 

FONTES:

https://chicagounbound.uchicago.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=8966&context=journal_articles – Cordell Hull, the Reciprocal Trade Agreements Act, and the WTO

https://www.npr.org/2020/11/18/936394032/trade-show-update – Planet Money Podcast – Trade Show