Texto de Anna Rita Erthal

As mudanças climáticas sempre fizeram parte da história do nosso planeta, antes mesmo de existir homo sapiens. O planeta terra já passou por longos períodos de glaciação, assim como já esquentou várias outras vezes também. Os Sumérios, por exemplo, foram extremamente afetados por umas das piores secas por volta do ano 2200 antes da era comum. O Império Romano teve seu declínio por diversos fatores, e um deles foi definitivamente as extremidades climáticas. Entretanto, nunca na história tivemos um aumento de temperatura de forma tão rápida e drástica, e com um fator tão claro em comum, que nada tem de natural: as ações humanas e a queima dos combustíveis fósseis.

Não é novidade alguma que as mudanças climáticas estão afetando o nosso planeta. O ano de 2016 foi um dos mais quentes já registrados, depois o ano de 2020, depois o de 2021 e por aí vai. Frequentemente, nos deparamos com alguma notícia trágica, seja sobre as fortes chuvas impactando determinada região, o calor extremo, ou até mesmo o preço alto do azeite. As mudanças climáticas já fazem parte do nosso cotidiano. Infelizmente, o futuro chegou.

Mas eu nem quero começar o texto com aquele tom negativo que você provavelmente já tenha lido em algum outro portal. O meu texto, no entanto, é para analisarmos um pouco mais de fora pra dentro. Dentro de nós. Como o aumento da temperatura está afetando o nosso “eu” interior, e talvez você nem tenha se dado conta disso.

Por décadas, cientistas como o Marshall Burke, da universidade de Stanford, e vários outros colegas de estudo buscam entender exatamente essa questão. Para isso, foram realizados vários experimentos que buscaram aumentar a temperatura do ambiente significativamente e comparar com uma temperatura padrão, e ver a diferença no comportamento dessas pessoas. O resultado foi o esperado: a produtividade diminui no calor. O mesmo estudo foi repetido em escolas, e sim, o calor também afetou a performance dessas crianças em testes.

Claro que para os mais privilegiados isso não é um problema, já que o ar-condicionado sempre vai estar presente. Mas pense em pessoas que trabalham fazendo o telhado ou recolhendo seu lixo, ou mesmo pessoas da engenharia civil e até repórteres, todos eles sendo afetados pelas ondas de calor que estão por vir. E toda a sua produtividade sendo diminuída, e a sua vida também sendo colocada em risco (em casos graves) pela desidratação.

O cientista Burke também ficou muito interessado em como o calor pode contribuir para o aumento dos índices de violência. Para isso, ele analisou países como a Nigéria durante uma temperatura considerada padrão, e depois quando estava mais alta que o esperado. Ele notou que, principalmente na época de cultivo, a violência e o conflito aumentaram significantemente durante o período de maior calor. E Burke apontou o mesmo resultado para outros países.

Mas o que acontece no nosso cérebro? Por que ficamos mais violentos durante o calor?

Como tudo na Psicologia, nada é tão simples. Existe sempre uma somatória de fatores, e tanto a genética quanto o ambiente no qual a pessoa cresceu e vive contribui para um risco maior ou menor nos índices de violência. Mas, o que sabemos é que nosso corpo foi biologicamente criado para estar em homeostase, ou equilíbrio. Portanto, em momentos de extremo calor, nosso corpo faz de tudo para voltar à temperatura normal (por volta de 37 graus célsius), como o aumento da produção de suor e a diminuição da urina. O nosso cérebro também entra em ação nesse momento, e ele começa a trabalhar arduamente, mandando muito dos nossos recursos para outras partes do corpo. Então, nesse momento delicado, fica mais difícil para o lobo frontal, responsável pelo nosso julgamento e bom senso, processar nossas emoções efetivamente e controlar nossos impulsos.

A pirâmide de Abraham Maslow já nos ilustrava um pouco desse fenômeno.

Imagem: Pirâmide de Maslow indicando uma hierarquia de necessidades, conforme descrito no texto.

Ela nos mostra a hierarquia das nossas prioridades. Quando se trata de necessidades, as fisiológicas são prioridade, seguidas por segurança, relacionamento, estima e por último a realização pessoal.

Portanto, sabemos que além de todo um processo de catástrofes que podem estar por vir, nosso cérebro e nossa saúde mental e bem-estar também podem ser afetados. Pessoas mais vulneráveis vão sofrer mais com isso, e além de muitos perderem suas casas por conta de enchentes, ou terem que migrar por escassez de alimento, muitos ainda vão estar suscetível ao aumento da violência. É importante falar sobre isso, como um alerta para que possamos mudar esse cenário. Esse é um relato para que possamos acordar, dialogar e buscar mais políticas públicas. Esse é um momento muito delicado que precisa de toda a atenção do mundo, pois ainda dá tempo de melhorarmos. Vamos juntos?

 


Anna Rita Erthal

Terapeuta ABA, formada em Psicologia e cursando pós em Neurociência. Tem como hobby ler, cuidar de seus dois pets e entender sobre o mundo que a ronda, principalmente quando se trata de comportamento humano.