Depois o SciCast #549, nosso amigo Pena levantou um questionamento. Como, afinal, nós exercemos nossos direitos? Como entrar com uma reclamação no PROCON ou Reclame Aqui ou, ainda, como fazer um processo judicial?

Embora tudo dependa de onde você está, vou fazer um texto que acho que pode ajudar a dar um norte a todos.

 

Reclame Aqui: Vamos começar do básico

O site Reclame Aqui é uma empresa privada criada em 2010 com a ideia de um espaço para solução de conflitos de consumo, não servindo apenas como um local de reclamações, mas como um espaço de referência da reputação das empresas para decidir se fazem ou não negócio com essas.

A ferramenta ficou bastante conhecida e tem gerado impacto na percepção pública das empresas, inclusive dando maior visibilidade a órgãos de fiscalização do Poder Público.

Diante disso, os prestadores de produtos e serviços que tiveram sua reputação abalada certamente apresentaram alguma melhora com o tempo, além de ser comum para empresas de maior porte dedicar uma equipe ou escritório terceirizado para prover o melhor atendimento possível às reclamações para contenção de danos à imagem.

Inclusive, é assim que empresas buscam as melhores notas nos rankings de avaliação do site, podendo usar o selo com orgulho.

Fazer uma reclamação no Reclame Aqui é fácil. É necessário fazer um cadastro básico ou utilizar sua conta do Facebook para ingressar.

Imagem 1: Tela de acesso à página de cadastro do site Reclame Aqui (clique para ampliar). Na imagem, uma tela de site com o logo do Reclame Aqui e um cabeçalho escrito “Olá’ crie uma conta no Reclame AQUI – Com você logado conseguimos oferecer um serviço melhor e mais personalizado. Navegue logado e ajude outros milhões de consumidores”. Abaixo um formulário para preencher dados pessoais como “Nome e sobrenome”, “CPF”, “Data de nascimento”, “Gênero”, dentre outros.

Feito isso, você pode procurar por uma empresa específica e clicar no botão “Reclamar” no botão “Nova Reclamação”.

A depender da empresa reclamada, o site fará algumas perguntas objetivas, como se você possui conta num banco ou linha telefônica de uma operadora, por exemplo. Essas informações são privadas e confidenciais, e não são exibidas ao público.

Imagem 2: Exemplo de tela de cadastro de reclamação no site Reclame Aqui (clique para ampliar). Na imagem uma tela do site Reclame Aqui com o cabeçalho escrito “Vamos começar. Conte a sua história: Descreva o seu problema com a empresa”. Abaixo um formulário com os campos “Título da história”, “Conte a sua história” e “Celular”, além da possibilidade de incluir anexos e Classificar a história.

Após isso, o site disponibiliza um campo de texto aberto, onde você pode escrever, com as suas palavras e de forma simples, o problema que aconteceu. Não se recomenda passar dados pessoais nesse caso, pois esse campo é público e ficará registrado nas reclamações de acesso público do site. Ainda, é possível inserir anexos, que também serão privados.

Isso feito, a reclamação é enviada às empresas, com prazo para resposta. Como seus dados são compartilhados com as empresas, é possível que alguém te ligue ou mande mensagens para resolver o problema, diretamente com pessoas que conheçam o que aconteceu e como resolver.

Imagem 3: Exemplo de Reclamação publicada na página do Reclame Aqui (clique para ampliar). Na imagem uma página do site Reclame Aqui com uma reclamação de título “Erros reiterados no corte – Unidade Juventus” e uma classificação de satisfação com um emoji de uma carinha brava de cor roxa com o escrito “Não resolvido”. Abaixo há o nome da empresa (Corte Kids), a cidade, a data e hora da reclamação e o ID além da descrição do problema em forma narrativa.

Depois disso, não há muito o que fazer a não ser esperar a resposta da empresa e avaliar o retorno dado. Porém, pode ser uma boa primeira etapa caso, no futuro, você opte por entrar com uma ação judicial, já que terá alguma base para expor seus argumentos e demonstrar sua boa fé na solução da questão antes.

 

PROCON: Um órgão de fiscalização administrativa

A Lei nº 8.078/1990, o Código de Defesa do Consumidor, criou a Política Nacional das Relações de Consumo, a qual definiu, no artigo 4º, inciso II, alínea ‘a’, a possibilidade de ação governamental por iniciativa direta. Além disso, o artigo 5º, em seus incisos, garantiu a criação de Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor e Associações de Defesa do Consumidor.

O primeiro PROCON, como o conhecemos, contudo, vem antes disso, criado em 1976 pelo Governo do Estado de São Paulo.

Por suas características e definições, os PROCONs não são órgãos do Poder Judiciário. Assim, os registros e acompanhamentos de reclamações não são considerados processos judiciais e não têm o condão de impor condutas específicas às empresas.

Na prática, embora os PROCONs ajudem a população intermediando o contato com os fornecedores, eles são um órgão de fiscalização e punição por meio de multas, cujo valor pode ser destinado ao reforço na fiscalização ou na criação de programas de educação de consumo à sociedade, por exemplo.

Não existe um PROCON federal. O mais próximo disso seria o site Consumidor.gov.br, o qual serve como uma ponte de contato com as empresas. Os PROCONs, assim, são órgãos estaduais ou municipais, e têm procedimentos dos mais variados para registros e atendimentos de reclamações.

Em alguns casos, os PROCONs atendem pela internet ou telefone. Em outros, é necessário ir presencialmente a uma unidade de atendimento para ser atendido. Muitos PROCONs, ainda, fazem audiências para tentativa de solução dos conflitos.

Por isso, é importante que você se informe sobre como é o atendimento e o procedimento do PROCON da sua região, o que pode ser feito pela internet. Além disso, a Ordem dos Advogados do Brasil de cada estado possui atendimento público que, certamente, pode ajudar a tirar algumas dúvidas e te indicar onde ir, caso você prefira buscar atendimento presencial.

De toda forma, por mais que o PROCON possa emitir uma nota favorável ao consumidor, ele não pode obrigar a empresa a fazer ou deixar de fazer nada. Não havendo solução, o PROCON servirá para orientar o consumidor a buscar apoio no Poder Judiciário, quando for o caso.

Mas para que serve o PROCON então?

Para multar, ora bolas!

E por isso que digo que é importante que as pessoas registrem suas reclamações. Apenas com o registro é possível ao PROCON ter dados para impor multas às empresas. E só com multas altas que as empresas terão o mínimo de interesse em parar de gastar dinheiro com o pagamento de multas para implementar melhores práticas e investir em qualidade.

Mas, ainda, temos a última e mais importante etapa, que a judicialização.

 

Poder Judiciário: o famoso Processinho

Como já falamos nos SciCasts #549 e #507, e eu pessoalmente comentei no Spin #2064, o acesso ao Poder Judiciário é um direito das pessoas e pode ser exercido a qualquer momento, mesmo antes, durante ou depois de uma reclamação privada ou administrativa, como no Reclame Aqui ou no PROCON.

Para isso, quando falamos de relações de consumo, você tem dois caminhos, o Juizado Especial Cível e a Justiça Comum.

A Justiça Comum é adequada para casos de maior valor e maior complexidade, quando, por exemplo, for necessária a realização de perícias técnicas, ou quando a natureza do processo peça mais atenção e acesso a recursos.

Os processos da Justiça Comum são mais complexos, e exigem maior habilidade do advogado na redação do caso. Vou deixar aqui um link com um exemplo de um caso pessoal meu para que possam ver como é feita a escrita de um caso.

No entanto, a maioria esmagadora dos casos de relações de consumo são mais simples e podem ser feitas no Juizado Especial Cível, que pode ser acessado com pedidos que somem até 20 salários-mínimos para atuação sem advogado ou 40 salários-mínimos com assistência de advogado.

Se você tiver um advogado, não esquente. Deixe com ele um relato detalhado do seu caso e dê todos os documentos que tiver do caso. Caberá ao advogado decidir o que e como preparar seu processo.

Contudo, se você prefere seguir sem um advogado, basta você ir até um atendimento dos Juizados Especiais.

Cada Poder Judiciário estadual organiza seus Juizados Especiais da forma que é mais conveniente para a administração e acesso ao público. Assim, é possível que ele fique no mesmo fórum da sua cidade, tenha um fórum próprio ou tenha diversas unidades menores espalhadas por toda a cidade, como é o caso da Capital de São Paulo.

No estado de São Paulo, aliás, é possível se cadastrar no sistema eletrônico do Tribunal de Justiça e fazer você mesmo, de casa, seu pedido de processo ao Juizado Especial.

Eu não recomendo, no entanto, que você use essas plataformas se já não tiver tido contato prévio ou o faça acompanhado de alguém da área, ainda que um estudante de direito, para evitar fazer algo que pode atrasar ou atrapalhar o seu pedido.

O mais correto é buscar ajudar de quem já sabe. Vá à unidade de atendimento mais próxima levando com você todos os documentos e um relato por escrito, nas suas palavras, do que aconteceu e o que você está buscando. O profissional vai saber te indicar o melhor caminho.

Pense nisso como automedicação. Você até pode ir na farmácia comprar alguns remédios sozinho, mas tomar remédios sem saber o que está fazendo, não seguir posologia, conhecer efeitos adversos ou os remédios apropriados para sua doença, pode ser perigoso. Por isso, sempre é bom procurar atendimento médico. O mesmo vale para um advogado ou outro profissional do Direito.

 

Concluindo…

Dito tudo o que está acima, o mais importante mencionar é: não deixa a impunidade vencer.

Se você passou um apuro, denuncie ou processe. Não é abuso ou imoralidade perseguir direitos. Precisamos tirar esse preconceito e estigma de que processar significa ser vingativo ou aproveitador.

E, quando o fizer, seja justo. Nada de tentar “arrancar” dinheiro das empresas. Busque aquilo que você tem correto direito. Isso transmite credibilidade e fará com que os juízes tenham melhor visão da sua causa e suas razões.

E bom exercício da sua cidadania, meus caros operadores do Direito.

Até mais!

– Túlio Monegatto Tonheiro “