É difícil definir qual característica do grafeno surge primeiro à mente: sua excepcional condutividade elétrica, a resistência cerca de duzentas vezes maior que a do aço, ou sua extrema leveza. As possibilidades oferecidas por um material com tais propriedades certamente encantam qualquer entusiasta da ciência e tecnologia. Mas tudo o que se fala sobre o grafeno é real? As tecnologias promissoras que ele representa já se concretizaram?
Para responder a essas perguntas, este texto foi dividido em duas partes. Na primeira, abordaremos o que é o grafeno, seus diferentes tipos e como são classificados — incluindo os aspectos que diferenciam os materiais disponíveis comercialmente. Já na segunda parte, discutiremos suas possíveis aplicações e em que medida essas já se tornaram realidade no mercado ou ainda permanecem no campo da pesquisa e desenvolvimento.
Afinal, o que é grafeno?
Antes de mais nada, é necessário esclarecer o que é grafeno. Teoricamente, o grafeno é uma forma alotrópica do carbono composta por uma única camada de átomos dispostos em uma estrutura bidimensional em forma de colmeia (hexagonal). Na prática, no entanto, o material encontrado tanto em laboratórios quanto na indústria é diferente — sendo este último o foco deste texto.
O grafeno comercial raramente atende à sua definição mais clássica: possuir uma única camada atômica. Para suprir a grande demanda da indústria, o processo de produção mais utilizado é a esfoliação mecânica em meio líquido, devido à sua capacidade de operar em larga escala. Nesse processo, o grafite em pó, disperso em um meio líquido dentro de um reator, é submetido a esforços mecânicos (como agitação ou ultrassom), que rompem as ligações de Van der Waals responsáveis por manter as camadas lamelares unidas. Cada lamela isolada corresponde ao que se conhece como grafeno.

Processo de esfoliação de grafite, que é composto por lamelas de carbono, ligados por Van de Waals. Após o processo, essas lamelas estão isoladas, o que dá forma ao grafeno. Adaptado. Fonte: https://www.goldeagle.com/tips-tools/the-science-behind-graphene-oxide/
Contudo, é importante salientar que esse processo dificilmente gera grafeno de única camada. Ao se caracterizar o material obtido, observa-se que a distribuição de camadas por partícula geralmente varia entre 5 e 15 camadas — um número claramente superior a um.
Apesar disso, tais materiais ainda podem ser classificados como grafeno. A norma técnica ISO/TS 21356:2021, também adotada no Brasil como ABNT ISO/TS 21356-1, define os seguintes termos:
- Grafeno: camada única de átomos de carbono com cada átomo ligado a três vizinhos em estrutura de favo de mel. Também conhecido como monocamada de grafeno;
- Grafeno bicamada: material bidimensional composto por duas camadas empilhadas de grafeno, bem definidas;
- Grafeno de poucas camadas: material bidimensional formado por três a dez camadas empilhadas de grafeno, também bem definidas;
- Nanoplaqueta de grafeno: nanoplaca composta por múltiplas camadas de grafeno, com espessura normalmente entre 1 nm e 3 nm.
Dessa forma, admite-se que o grafeno não precisa, necessariamente, ter apenas uma camada. Isso permite que o material amplamente produzido via esfoliação mecânica seja classificado como um tipo de grafeno — mais especificamente, como nanoplaquetas de grafeno.
Além disso, o grafeno pode ser submetido a modificações químicas e estruturais. O grafeno funcionalizado é derivado do grafeno puro por meio da adição de grupos funcionais em sua superfície ou bordas. Essa modificação altera localmente a estrutura eletrônica e introduz sítios reativos, preservando em grande parte a rede hexagonal de carbono.
Por outro lado, o óxido de grafeno possui uma estrutura altamente oxidada, contendo grupos funcionais como hidroxilas, epóxidos e carboxilas distribuídos de forma desordenada. Esses grupos rompem a conjugação π do grafeno, resultando em uma estrutura amorfa, rica em defeitos e quimicamente ativa.
O óxido de grafeno funcionalizado resulta da modificação adicional do GO, utilizando os grupos oxigenados como pontos de ancoragem para novas funcionalidades químicas. Isso aumenta ainda mais a densidade de grupos funcionais e a heterogeneidade estrutural, originando uma matriz altamente modificada e adaptada para aplicações específicas.

Processo de obtenção de grafeno monocamada, óxido de grafite, óxido de grafeno e óxido de grafeno reduzido. Parte-se do grafite, o qual é esfoliado para formar o grafeno e seus outros tipos. Da oxidação do grafite ou do grafeno, obtém-se o óxido de grafite. Sua esfoliação gera o óxido de grafeno. A sua redução gera o óxido de grafeno reduzido. Adaptado. Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Strategies-of-Graphene-Oxide-via-Hummer-Method_fig1_383101509
Dentro do mesmo tipo, todo grafeno é igual?
O número de camadas certamente é a característica mais proeminente na classificação do grafeno. No entanto, quando se trata de avaliar a qualidade do material comercial para determinadas aplicações, outros parâmetros são igualmente relevantes. Os mais comuns incluem área superficial específica, pureza de carbono, umidade e teor de cinzas.
Para elucidar, tomemos como exemplo as nanoplaquetas de grafeno — o tipo mais comum no mercado. É possível encontrar esse material com áreas superficiais específicas que variam de 15 a 700 m²/g, enquanto o grafeno monocamada ideal apresenta uma área superficial teórica de aproximadamente 2630 m²/g. Essa ampla variação indica que, mesmo dentro de um mesmo tipo (como as nanoplaquetas), as propriedades podem diferir significativamente conforme o método de produção e o controle de qualidade aplicado.
Além disso, é comum encontrar grafenos com alto teor de impurezas, resultado da matéria-prima utilizada (como tipos distintos de grafite) e da eficiência dos processos de purificação. As impurezas mais recorrentes incluem metais residuais, oxigênio, enxofre e nitrogênio, que podem ser introduzidos durante a produção ou funcionalização do material. Tais contaminantes impactam diretamente o desempenho do grafeno em aplicações sensíveis, como eletrônica, sensores e compósitos avançados.
O teor de umidade e o conteúdo de cinzas também são indicadores importantes. Altos níveis de umidade podem comprometer a estabilidade do grafeno, especialmente em formulações poliméricas, tintas ou dispersões. Já o teor de cinzas reflete a presença de resíduos inorgânicos não-carbonáceos, que podem afetar propriedades elétricas, térmicas e mecânicas do produto final.
Portanto, mesmo quando o grafeno é classificado sob o mesmo tipo, como “nanoplaquetas de grafeno”, ele pode apresentar variações substanciais em termos de qualidade e desempenho. Para aplicações industriais específicas, torna-se essencial especificar e controlar esses parâmetros, a fim de garantir a reprodutibilidade e eficácia do material.
Essa primeira parte buscou esclarecer o que, de fato, é o grafeno e como ele se apresenta comercialmente. Entender suas variações é fundamental para avaliar seu potencial. Na próxima parte, exploraremos onde e como esse material pode ser aplicado — e até que ponto suas promessas já estão se tornando realidade.

