O soft power, conceito usado amplamente nas relações internacionais, descreve um cenário em que um Estado conquista uma certa influência internacional através da cultura do país. A expressão foi cunhada no final dos anos 1980 pelo professor e cientista político Joseph Nye em seu livro “Soft Power: The Means To Success In World Politics”. Nos últimos anos, a Coreia do Sul vem colhendo os frutos de seu vasto investimento na indústria cultural do país nos últimos 20 anos. Esses frutos traduzem-se, principalmente, na melhoria da imagem do país perante ao resto do mundo, no aumento das exportações e também do turismo. Há 20 anos, muitas pessoas não saberiam apontar no mapa onde fica a Coreia do Sul. Hoje, é um dos maiores expoentes culturais do mundo. Como foi que isso aconteceu? Quais vantagens o soft power trouxe ao país?

Na década de 1990, com o fim da ditadura militar e a recente abertura econômica do país, o então presidente sul-coreano Kim Young-Sam lançou uma nova política cultural. Seu objetivo era, principalmente, tornar a Coreia do Sul mais conhecida na comunidade internacional.

Essa nova abordagem consistia em programas de financiamento e medidas protecionistas na indústria cultural do país. No cinema e na televisão, passaram a existir cotas mínimas para produções sul-coreanas. Isso revelou grandes diretores que fizeram sucesso internamente e internacionalmente com novelas, filmes e séries de TV.

Além disso, o governo investe em produções nacionais e na infraestrutura cultural do país. Em 2020, foram destinados mais de 5 bilhões de dólares para o Ministério da Cultura. Esse dinheiro foi utilizado em programas para formar novos cineastas, desenhistas, atores, cantores e para a construção de um local exclusivo para shows de k-pop.

Quando as políticas foram formuladas, o governo pensou na cultura como mais um produto de exportação. No geral, essas produções incentivadas pelo governo precisam ser inclusivas e acessíveis ao mercado internacional. Por isso, muitos grupos de k-pop possuem membros de diversos países como Tailândia, China, Japão e Austrália. Além disso, algumas músicas possuem partes cantadas em inglês ou são inteiramente feitas em inglês. E essa exigência do governo teve resultado. Entre os idiomas estudados por estrangeiros, o coreano aparece em segundo lugar entre os que mais cresceram no século XXI.

A música e o cinema sul-coreanos

Em 2020, a Coreia do Sul atingiu seu ápice artístico internacionalmente. Em menos de 12 meses, o grupo de k-pop, BTS, estabeleceu diversos recordes de visualizações e tornou-se o primeiros sul-coreano a liderar o principal ranking musical do mercado dos EUA. No mesmo ano, o diretor Bong Joon-ho conquistou quatro estatuetas no Oscar com o seu filme ‘Parasita’: Melhor Filme, Diretor, Roteiro e Filme Internacional. Após a premiação, Marc Raymond, professor do Departamento de Comunicação da Universidade Kawngwoon em Seul, declarou:

Parasita é um filme excelente, feito por uma indústria excelente. Era vergonhoso que nenhum filme sul-coreano tivesse sido ainda indicado ao Oscar. E, de repente, veio uma enxurrada de prêmios. Foi um reconhecimento dos trabalhos feitos há quase duas décadas pelo país.

A política de incentivo à cultura foi um sucesso absoluto no país. Na Coreia do Sul, ao menos um filme nacional é lançado por semana. Todos os anos, quando se olha para os dez maiores sucessos de bilheteria no país, a maioria deles são filmes nacionais. Alguns exemplos de sucessos coreanos são os filmes: Oldboy (2003), O Hospedeiro (2006), A Criada (2016) e Em Chamas (2018). Esses filmes foram bem-sucedidos não só dentro do país como também ganharam grande destaque no mercado internacional. Cada vez mais o país forma novos cineastas, atores, cantores e desenhistas talentosos.

E qual a vantagem do soft power para o país?

A abordagem de soft power da Coreia do Sul é um sucesso indiscutível não só em questão de premiações e no reconhecimento da qualidade da indústria cultural, mas também em questões diplomáticas. Essa política contribui inclusive para a melhoria das relações com a Coreia do Norte, sendo o próprio Kim Jong-un um grande admirador do k-pop. Em 2018, o “k-pop diplomático” atingiu o seu ápice com o presidente Moon levando um show para a sua reunião com o ditador norte-coreano. O grupo Red Velvet e a cantora Seohyun se apresentaram para oficiais do governo em Pyongyang, o que foi um marco nas relações entre os dois países.

Além disso, em 2009, a Coreia do Sul criou centros culturais coreanos em 27 países pelo mundo e esses centros são parte oficial das relações exteriores do país. Calcula-se cada 1 dólar investido no setor cultural rende 5 dólares em exportações de roupas, cosméticos e eletrônicos. Em 2019, o país registrou pelo menos 17 milhões de turistas estrangeiros, esse número é três vezes maior do que o registrado 15 anos antes.

Conclusão

As políticas implementadas pelo governo sul-coreano nos últimos 20 anos mais do que deram certo — são um exemplo a ser seguido. O Brasil tem muito potencial para esse tipo de empreendimento. Nós temos grandes diretores, atores e cantores. O funk, o carnaval, assim como alguns filmes e novelas nacionais fizeram e fazem grande sucesso no exterior. Nós exportamos cultura mesmo sem um projeto amplo de soft power no Brasil.

Que a estratégia funciona, nós já sabemos. O exemplo da Coreia do Sul ao aproveitar o que se tinha de melhor culturalmente e ampliar é inspirador. Isso traz resultados em diversas frentes e melhora muito a imagem do país na comunidade internacional.