Um senhor muito discreto e de sorriso simpático, Warren Buffett é o segundo homem mais rico do mundo, com fortuna estimada em mais de 75 bilhões de dólares segundo a Forbes (só perdendo para seu grande amigo, Bill Gates), e acionista de algumas pequenas empresas como American Express, Coca-Cola, IBM e Apple. Ao contrário de muitos ricaços que esbanjam por aí, Buffett mora em Omaha, Nebraska, na mesma casa que comprou por 30 mil dólares em 1958 (atualmente estimada em 625 mil), e não tem uma agenda cheia. Na verdade, ele nem tem uma agenda, já que prefere passar seus dias lendo jornais, relatórios de empresas e acompanhando as notícias sentado em seu escritório na Berkshire Hathaway. Ele é conhecido como o maior investidor de todos os tempos por ter multiplicado (e continuar multiplicando) seus dólares na Bolsa, e somente nela – Buffett já declarou mais de uma vez não ser fã da renda fixa e que não investe em bitcoins por não entender nada do assunto. Grande conhecedor das finanças e cheio de peculiaridades, a história de Buffett parece destinada ao sucesso desde cedo.

O jovem Buffett

Warren é o segundo filho de Leila e Howard Buffett, o único homem, e nasceu na cidade onde escolhe viver ainda hoje: Omaha, Nebraska. Seu pai era corretor da bolsa, mas perdeu quase tudo – inclusive o emprego – com a crise de 1929. Posteriormente, Howard foi eleito para o Congresso americano pelo partido republicano, mudando-se com a família para Washington, mas o filho não se adaptou muito bem à nova cidade.

Independentemente do cenário ao seu redor, o pequeno Buffett sempre demonstrou uma fascinação pelos números e o faro para os negócios. Desde muito novo, ainda em Omaha, Warren começou a distribuir jornais e vender Coca-Cola de porta em porta e chegou a ter uma sociedade para compra de máquinas de pinball colocadas em barbearias (em pouco tempo ele e o amigo de escola já eram donos de diversas máquinas “caça-níqueis” famosas pela cidade). Ele conta que parte de sua inspiração para o business vem de um livro que pegou emprestado da biblioteca da escola intitulado “1000 formas de ganhar 1000 dólares”, pois foi naquele momento em que ele começou a entender verdadeiramente o valor dos juros compostos, da passagem do tempo e das boas escolhas.

Buffett sempre foi fascinado por números e livros e, antes de mesmo de terminar o colégio, já havia lido toda a biblioteca do pai, comprado ações para si e sua irmã e acumulado mais de 90 mil dólares por seus trabalhos. Ele foi aceito como aluno de graduação na Universidade da Pensilvânia, mas depois de dois anos se transferiu para a Universidade de Nebraska, onde completou todos os créditos com 12 meses de antecedência – ele diz que se formou rápido porque queria logo se livrar daquilo. Depois do diploma, ele tentou ingressar na Escola de Negócios de Harvard, mas, após apenas 15 minutos de entrevista com os recrutadores, foi informado que não tinha chances. Logo depois dessa negativa, ele descobriu que Benjamim Graham e David Dodd – autores de um dos livros que ele devorara na infância – eram professores de negócios em Columbia e escreveu para os acadêmicos dizendo que achava que eles estavam mortos, mas como agora descobrira que estavam bem vivos, gostaria de aprender com eles. Com essa mensagem ele foi aceito em Columbia, onde alcançou o título de mestre em Economia em 1951 – com apenas 21 anos.

Ben Graham se tornou uma enorme influência sobre Warren Buffett (segundo o próprio, seu professor só não foi mais influente que seu pai), já que a atual estratégia de negócios do bilionário é baseada em uma abordagem desenvolvida pelo antigo professor: comprar empresas cujas ações estejam abaixo de seu valor intrínseco. Esse método de analisar ações é atualmente conhecida como “value investing”, e Buffett é seu maior estandarte.

Pavimentando o caminho para a Berkshire Hathaway

Após os estudos, entre 1951 e 1956, Buffett trabalhou no mercado financeiro como vendedor e analista, mas em 1956, após seu mentor Graham desfazer a parceria com o pupilo, Buffett pegou os 174 mil dólares de sua conta e abriu a Buffett Partnership, Ltd, que aplicava o dinheiro de outros sócios angariados pelo caminho. No começo de 1960, Warren Buffett já era um milionário devido às boas aplicações da empresa, e é quando ele decide desfazer todas as sociedades, mantendo apenas o negócio com Charlie Munger.

Naquele momento, o portfólio de Buffett e Munger contava com a Berkshire Hathaway, uma empresa têxtil cujas ações – segundo o megainvestidor – eram bastante baratas, mas um negócio fadado à falência. Em um dado momento, a diretoria da empresa quis recomprar as ações e perguntou a Buffett qual seria o preço justo, para o qual ele respondeu $11.50. Na oferta final de compra, a empresa oferecia $11.375/ por ação – uma diferença de menos de 2% que enraiveceu Warren a ponto dele comprar tantas ações para se tornar o sócio majoritário e ter direito a trocar os gestores – o que ele fez com prazer.

(Para fins de comparação, Buffett pagou US$7.50 por cada ação da Berkeshire, a oferta foi de $11.375, e atualmente o preço unitário das ações está em torno de $650,00).

Este foi o primeiro passo para que Buffett construísse seu império: junto com Munger, eles analisaram e compraram uma infinidade de negócios sólidos, baratos e com potencial de crescimento, tais como seguradoras, corretoras de valores e companhias de aviação. Hoje, aos 87 anos, Buffett ainda é o CEO da Berkshire Hathaway, dá expediente diário no escritório e sua fórmula de negócios está mais viva do que nunca.

Um dos momentos na história financeira dos Estados Unidos que provou a solidez do método de Buffett foi o boom tecnológico do final dos anos 1990. Enquanto Warren insistia que, com as cotações das ações de tecnologia muito acima da realidade, o mercado deveria esperar que os números desabassem sem piedade, os críticos o taxaram de velho, diziam que ele não enxergava a nova fronteira e que teria que se curvar às ações “ponto com” depois que se provassem um excelente negócio. O aumento dos juros básicos americanos no final de 1999, fraudes em diversas empresas do setor tecnológico e um abrir de olhos do mercado finalmente levaram ao estouro da chamada Bolha da Internet em 2000. Tendo sua profecia realizada, Buffett só comprovou ser o maior investidor de todos os tempos e conhecer o mercado financeiro americano melhor do que ninguém.

Vida pessoal e um relacionamento inusitado

Buffett é um homem insólito até quando se trata de sua vida pessoal. Em 1949, ele se interessou por uma jovem cujo namorado tocava ukulele (pequeno violão havaiano) e resolveu aprender o instrumento para impressioná-la – suas investidas não deram certo, mas ele toca o instrumento até hoje. Um ano depois, ele conheceu Susie Thompson, então colega de quarto de sua irmã Roberta na Universidade Northwestern. Warren ficou amigo do pai de Susie e começou a frequentar a casa da família, onde acabou tendo mais contato com a moça. Buffett diz que ele sempre soube que ela era “a” mulher de sua vida, mas que ela demorou para ter essa certeza. Os dois se casaram em 1958 e tiveram três filhos: Susan, Howard e Peter.

Durante os vinte anos seguintes, a relação de Warren e Susie teve altos e baixos, com supostas traições. Mas o que realmente desgastou o relacionamento foi o foco de Buffett quase exclusivamente no trabalho, o que levou a Sra. Buffett a se mudar para São Francisco para investir em sua carreira como cantora em 1977 – mas mesmo morando a quilômetros de distância eles nunca se divorciaram. Seus amigos mais próximos dizem que Buffett sentiu muito essa mudança, e ele mesmo admite que 95% da culpa por ela ter se mudado foi dele. Mesmo depois de se mudar, Susie se preocupava com o marido, já que acreditava que ele não seria capaz de sobreviver sozinho, e por isso pediu a diversas pessoas que ficassem de olho em Warren. Dentre essas, estava Astrid, amiga de Susie que começou a levar sopa, cuidar de Buffett e acabou se mudando para a casa da família cerca de um ano depois.

Se você acha que aqui a história desanda, está muito enganado. Warren e Susie não só nunca se separaram, como continuavam afirmando seus sentimentos um pelo outro e comparecendo a diversas ocasiões sociais juntos. Astrid, mais discreta, preparava a mala de Buffett para as viagens que ele faria ao encontro de Susie, e os três enviam até os cartões de Natal juntos assinando “Warren, Susie and Astrid”. A filha mais velha (cujo nome é Susie por insistência de Warren para homenagear a esposa) diz que a sociedade como um todo achava estranho e torcia o nariz, mas que o arranjo funcionava muitíssimo bem para todas as partes e que o sentimento entre os três era verdadeiro e muito forte.

No começo dos anos 2000, Susie enfrentou uma batalha contra um câncer que a debilitou muito, e neste período Buffett viajava todo final de semana para dar apoio à esposa. Em 2004, durante uma viagem de visita a amigos em Wyoming, Susie passou mal e acabou morrendo em decorrência de um derrame. Inspirado pelo trabalho filantrópico que sua esposa havia desenvolvido em vida, desde 2005 Buffett faz doações anuais para as fundações filantrópicas de Bill Gates e dos três filhos. Ele já declarou sua intenção de doar a maior parte de sua fortuna ainda em vida.

A cereja do bolo? Warren e Astrid se casaram em 2006, no aniversário de 76 anos dele.

De um garoto que calculava a velocidade das bolas de gude na banheira a um dos homens mais respeitados da bolsa americana, Warren Buffett é tudo menos comum e previsível, mas sua trajetória é completamente fascinante. Atualmente com 87 anos e mais ativo do que nunca, Buffett ainda toma café da manhã diariamente no McDonald’s e mantém toda a sua fortuna em ações na bolsa – dois hábitos que podem parecer temerosos ao resto da humanidade, mas que só confirmam a imagem de grande investidor e homem inusitado que Buffett pintou por toda sua vida.

 

 

Para saber mais, Isabela recomenda:

Documentário: Becoming Warren Buffett – HBO (2017)

Livro: Snowball: Warren Buffett and the Business of Life, de Alice Schroeder (Versão em português: A Bola de Neve – Warren Buffett e o Negócio da Vida)