Em menos de um mês (03 de Outubro) saberemos quem receberá os prêmios de 2017. Esse é aquele período que amantes da ciência distribuem opiniões que ninguém pediu. Dizem quem merece e quem não merece ser o ganhador, e reclamam com seus colegas como o comitê do Nobel está degenerado.

Meu palpite para o prêmio Nobel da física é: Kip Thorne, Rainer Weiss e Ronald Drever por suas contribuições para a construção e desenvolvimento do LIGO que levou a descoberta de ondas gravitacionais.

Ano passado, pouco antes do anúncio dos vencedores do prêmio Nobel 2016, eu escrevi no facebook:

Errei… mesmo assim mantenho meu palpite: Kip Thorn será um dos ganhadores.

Como uma notinha de rodapé. Acho que Kip Thorne deveria ganhar outro Nobel por ser coautor da bíblia (1200 páginas) da relatividade geral: Gravitation. Ele escreveu esse livro com Misner e Wheeler. Este último além de ter sido orientador de doutorado do Thorne, orientou também o Richard Feynman e o brasileiro Jayme Tiomno =D.

Gostaria de discutir rapidamente 2 coisas:

  1. Por que causa, motivo, razão ou circunstância o prêmio não foi dado a ondas gravitacionais no ano passado já que a notícia ainda estava quente?
  2. O que virá depois em física fundamental? Que diabos é física fundamental?

Muito provavelmente o prêmio não foi dado para ondas gravitacionais em 2016 pois existe um deadline entre a publicação do trabalho confirmando uma descoberta, a indicação e escolha dos ganhadores pelo comitê. Por exemplo, em 2012 o Bóson de Higgs foi descoberto, mas o prêmio só foi entregue a Peter Higgs e François Englert em 2013. Uma opinião: acho inclusive que o comitê do Nobel foi injusto pois Tom Kibble deveria ter recebido 1/3 do prêmio. De qualquer modo, Kibble entra pra gigantesca galeria de físicos brilhantes, tipo Freeman Dyson e o brasileiro César Lattes (se bem que Lattes ficou meio maluco depois e pela quantidade de besteiras que falou deveria ser suficiente pra ter perdido o prêmio como punição), que foram deixados de lado pelo Nobel.

Tom Kibble e um chapéu igualzinho ao meu

Caneladas a parte, a observação das ondas gravitacionais foi publicada em Fevereiro de 2016 pela PRL, ou seja, menos de um ano antes da divulgação dos ganhadores do prêmio. Acredito que em fevereiro já existisse uma lista com prováveis ganhadores e justamente por isso os físicos mencionados acima não receberam o prêmio no ano passado.

Mas tudo bem, o que vem depois das ondas gravitacionais?

Segmentando um pouco a física, poderíamos dizer que existem dois tipos de pesquisas físicas: Pesquisa de fenômenos fundamentais e emergentes. Explicar o significado de emergente e fundamental é uma tarefa bastante complicada, apesar de não parecer. Em certo modo, essa definição envolve a práxis da física. Ignorando as sutilezas podemos explicar de modo simplificado:

  1. Uma teoria fundamental é aquela que busca explicar os mecanismos subjacentes mais básicos dos fenômenos naturais. Por exemplo, como a interação eletromagnética funciona no nível quântico, como quarks e gluons se comportam, quais a razões que explicam decaimentos radiativos, como a gravidade funciona e etc.
  2. Já uma teoria emergente explica comportamentos que se manifestam quando “somamos” toda a física fundamental. Em outras palavras, fenômenos emergentes são aqueles presentes em escala macroscópica, por exemplo: a viscosidade de fluídos, superfluidez, supercondutividade, dureza de materials sólidos e outros aspectos desse tipo.

Ondas gravitacionais e o Bóson de Higgs são fenômenos da primeira categoria enquanto transição de fases (por exemplo, transição do estado sólido para o líquido) em materiais fazem parte da segunda categoria de pesquisas físicas.

Transição de fases em materiais topológicos foi o prêmio Nobel do ano passado e a tendência natural é que prêmios desse tipo sejam cada vez mais comuns.

Por quê?

Pesquisas fundamentais requerem tecnologias cada vez mais precisas, o que significa tecnologias cada vez mais caras. Além disso, o retorno prático que pesquisas fundamentais dão a sociedade é muito mais disperso. Discuti um pouco sobre isso no meu texto sobre corte de verbas no CNPq.

De qualquer modo, quais são os grandes problemas em física fundamental que estão próximos ao prêmio Nobel?

Diversos, mas uma “norma” para a entrega do prêmio Nobel de física é que esta seja experimentalmente confirmada. Justamente por isso, muitos dos grandes físicos atuais, Edward Witten por exemplo, jamais serão laureados.

Ed Witten: The Big Boss

Então, alguns dos grandes problemas fundamentais em abertos na física hoje em dia que valem (em princípio) um Nobel: Matéria e energia escura, Física de Neutrinos, Supersimetria: SUSY, explicar o confinamento de quarks e gluons, enfim.

Fora isso, acho que os prêmios vindouros serão cada vez mais parecidos com o de 2016, ou seja, pesquisas mais relacionadas a matéria condensada. Muito interessante para físicos profissionais, mas com pouco “impacto” jornalístico.

Anyway, espero que o comitê do Nobel não me faça passar vergonha novamente. De qualquer modo, espero comentar algo sobre o prêmio depois do anúncio.

Alguns links mandatórios:

  1. Don’t Write in Yellow (Tom Kibble) – Sixty Symbol
  2. Hunting for Neutrinos
  3. Particle Fever (Acho que esse documentário ainda está na Netflix)
  4. What is supersymmetry?
  5. Why supersymmetry?

 

Atualização, 27/Set/2017: Na primeira versão desse texto a minha previsão era a de que um dos ganhadores do Nobel de física desse ano seria o Ronald Drever. Descobri posteriormente que, infelizmente, o Drever faleceu em Março desse ano. Desculpem por não ter verificado isso antes, sou Pollyannista e às vezes esqueço que pessoas morrem =(