“Será que vai chover?” Eu teria ficado rica de verdade se eu ganhasse 1 real para cada vez que ouvi essa frase em contextos variados. Imagem de Pixabay

Hoje quero contar pra vocês o que um aluno do curso de Bacharelado em Metorologia estuda. Se você chegou até aqui porque está pensando em cursar Meteorologia ou porque está apenas curioso, eu vou tentar te ajudar.

Bom, quando eu fui aprovada no vestibular da FUVEST no começo dos anos 2000, eu já sabia que Bacharelado em Meteorologia era uma carreira da área de Exatas porque eu tinha lido isso em um guia de carreiras e também no próprio manual da FUVEST. Eu também tinha conversado com um professor do cursinho. A minha primeira opção na inscrição era Bacharelado em Física e minha segunda opção era Bacharelado em Meteorologia. E essa informação que acabo de dar para vocês já nos deixa algo muito claro: Meteorologia é uma área das Ciências Exatas!

Lembro que no começo dos anos 2000 não havia tanta disponibilidade de informação. Para saber das coisas você tinha que efetivamente perguntar para pessoas que você conhecia, de um modo geral, posso dizer que você tinha que buscar mais ativamente pela informação. Muita gente naquele tempo se interessava por Meteorologia pensando que era algo como Geografia e infelizmente acabava se frustrando, porque toda a parte de Climatologia que os geógrafos aprendem é num caráter mais qualitativo, descritivo. Nós meteorologistas vemos a abordagem quantitativa, então há o uso de muita Estatística.

A letra fria da LEI!

Então já contei uma coisa importante aqui: Meteorologia é Ciências Exatas. Agora vamos falar do nome do curso.  É preciso apenas destacar que Bacharelado em Meteorologia e Bacharelado em Ciências Atmosféricas são nomes diferentes para o mesmo curso. O nome do curso vai depender da instituição de ensino, mas nos dois casos vai formar um meteorologista, profissional com registro profissional no sistema CONFEA/CREA dentro da Lei nº 6.835, de 14 de outubro de 1980 (veja aqui). Ou seja, a profissão de meteorologista é regulamentada e vou destacar o primeiro artigo dessa lei:

 

Art. 1º – É livre o exercício da profissão de meteorologista em todo o território nacional, observadas as condições previstas na presente Lei;

a) aos possuidores de diploma de conclusão de curso superior de Meteorologia, concedido no Brasil, por escola oficial ou reconhecida e devidamente registrado no órgão próprio do Ministério da Educação e Cultura;

b) aos possuidores de diploma de conclusão de curso superior de Meteorologia, concedido por instituto estrangeiro, que revalidem seus diplomas de acordo com a Lei;

c) aos possuidores de diploma de Bacharel em Física, modalidade Meteorologia, concedido pelo Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro e devidamente registrado no órgão próprio do Ministério da Educação e Cultura;

d) os meteorologistas que ingressaram no serviço público mediante concurso público e que sejam portadores de diploma de um dos cursos superiores de Física, Geografia, Matemática e Engenharia;

e) os meteorologistas não-diplomados que, comprovadamente, tenham exercido ou estejam exercendo, por mais de 3 (três) anos, funções de meteorologista em entidades públicas ou privadas, e que requeiram os respectivos registros, dentro do prazo de 1 (um) ano, a contar da data da publicação da presente Lei.

Ou seja, só podem trabalhar como meteorologistas pessoas que se encaixam em uma dessas condições citadas no primeiro artigo dessa lei. Como exemplo, eu tenho um grande amigo que é geógrafo, se formou nos anos 1960 e trabalhou muitos anos em um Seviço Meteorológico. Quando ele começou a trabalhar, ainda não existiam os cursos de Bacharelado em Meteorologia nas instituições brasileiras (que começaram a surgir no final dos anos 1970). Sendo assim, esse amigo meu tem registro profissional do CREA como meteorologista, mesmo tendo se formado como Bacharel em Geografia.

O caso desse amigo é cada vez mais raro, até porque os cursos de Bacharelado em Meteorologia já existem há mais de 40 anos. Portanto, pra ser meteorologista tem que ser Bacharel em Meteorologia. E por falar nisso, vamos ao artigo 7 da lei citada:

Art. 7º – São atribuições do meteorologista:

a) dirigir órgãos, serviços, seções, grupos ou setores de Meteorologia em entidade pública ou privada;

b) julgar e decidir sobre tarefas científicas e operacionais de Meteorologia e respectivos instrumentais;

c) pesquisar, planejar e dirigir a aplicação da Meteorologia nos diversos campos de sua utilização;

d) executar previsões meteorológicas;

e) executar pesquisas em Meteorologia;

f) dirigir, orientar e controlar projetos científicos em Meteorologia;

g) criar, renovar e desenvolver técnicas, métodos e instrumental em trabalhos de meteorologia;

h) introduzir técnicas, métodos e instrumental em trabalhos de Meteorologia;

i) pesquisar e avaliar recursos naturais na atmosfera;

j) pesquisar e avaliar modificações artificiais nas características do tempo;

l) atender a consultas meteorológicas e suas relações com outras ciências naturais;

m) fazer perícias, emitir pareceres e fazer divulgação técnica dos assuntos referidos nas alíneas anteriores.

E esse artigo 7 quer dizer que essas atribuições listadas só podem ser exercidas por meteorologistas. Portanto, nenhum geógrafo, engenheiro, físico, geólogo, etc podem efetuar essas atribuições (a não ser que estejam em alguma categoria listada no artigo 1 que mencionei anteriormente). Se alguma empresa contratar um profissional de outra área para realizar atribuições de meteorologista, está agindo ilegalmente e pode (e deve) ser notificada. Numa ocasião um conhecido que também é geógrafo, me disse que a empresa dele estava pedindo para que ele elaborasse briefings meteorológicos (textos curtos com informações sobre a previsão do tempo) para uma operação de logística. Fiquei bem chateada e disse para ele não fazer isso e orientar a empresa a contratar os serviços de um meteorologista. E claro, ele mesmo sabia que poderia se prejudicar se aceitasse tal proposta!

Mas o que vocês estudam nesse tal Bacharelado em Meteorologia (ou Ciências Atmosféricas)?

Lembra lá atrás que eu contei que eu prestei Bacharelado em Física como primeira opção? Pois então, aqui temos outra pista importante. A grade curricular dos dois primeiros anos do curso de Bacharelado em Meteorologia são praticamente iguais aos dois primeiros anos do curso do Bacharelado em Física. Nós meteorologistas precisamos primeiro aprender e aperfeiçoar algumas ferramentas que nos permitirão compreender todos os processos que ocorrem na atmosfera.

O curso de Bacharelado em Meteorologia conta com disciplinas de Física (Física I,II, III, IV), Laboratórios de Física, Cálculos (I, II, III, IV), Cálculo Numérico, Algebra Linear e Programação.  Essas disciplinas estão distribuídas no primeiro e no segundo ano do curso. Pela minha experiência lá na USP, são essas disciplinas que prendem as pessoas e são responsáveis por muitas reprovações e desistências, lamentavelmente. Eu não vou me aprofundar nisso, mas penso que a maioria de nós tem uma base muito ruim no Ensino Médio e quando a gente chega na Universidade, bem, pode ser um choque enorme.

No terceiro, quarto e quinto ano do curso temos as matérias específicas que nos permitem compreender os processos da atmosfera. Temos Meteorologia Dinâmica, Meteorologia Sinótica, Micrometeorologia, Climatologia, Agrometeorologia, Biometeorologia, Eletricidade Atmosférica, Previsão Numérica do Tempo, Poluição do Ar, etc. São nessas matérias que a gente vai de fato aplicar toda a base que é aprendida no primeiro e no segundo ano do curso.

Então quer dizer que o aluno não tem nenhum contato com aplicações de Meteorologia nos dois primeiros anos do curso? Não! Isso desmotivaria os alunos, sem dúvidas. Há matérias introdutórias (Introdução à Meteorologia e Instrumentos Meteorológicos, por exemplo) que nos permitem ter uma visão geral do curso e aprender os primeiros passos. Ah sim, também temos matérias de Astronomia (Astronomia de Posição e Introdução à Astronomia) que vão nos ajudar a compreender a natureza do Sol, que é o responsável direto por todos os movimentos no nosso planeta.

E onde o formado pode trabalhar?

Hoje o mercado se expandiu muito. Além de trabalharmos em empresas de consultoria de previsão do tempo (que fornecem todo o material de previsão do tempo para as emissoras de rádio, TV e internet), alguns trabalham na área de produção e comercialização de energia elétrica, energias renováveis (solar, eólica), mercado financeiro (a importante base em Matemática pode possibilitar isso), etc. Os empregadores são tanto o setor privado quanto o setor público e o empreendedorismo tem sido muito incentivado nos últimos anos e muitos.

Ah sim, às vezes há concursos nas Forças Armadas. A Meteorologia é uma área estratégica e é necessária para a segurança e sucesso das operações. Conheço um colega que trabalha na Marinha, por exemplo.

Além disso, com essa formação básica pode-se fazer uma pós em muitas áreas relacionadas e atuar como consultor especializado (na área ambiental, por exemplo).  Muitos acabam indo também para a área acadêmica, fazendo Mestrado e Doutorado.

Então não, nós não somos “a moça da previsão do tempo da TV”. A apresentadora ou apresentador da previsão do tempo é um comunicador que recebe o texto e as imagens das mãos dos meteorologistas e ainda há meteorologistas nos bastidores, informando, esclarecendo e garantindo a qualidade das informações meteorológicas transmitidas para a população.

Finalizando

E então, gostaram do curso? Se já pensaram em cursar meteorologia, comentem aí! E eu também tenho vários posts sobre carreira no meu blog, Meteorópole. Por hoje é só!