Você está vagando a esmo pelas terras internéticas, passeando pela timeline do twitter, facebook, alguma outra rede social, ou portal de notícias quando, de repente, em um encontro aleatório, você se depara com um post intrigante: pesquisadores de algum lugar descobriram, inventaram ou provaram alguma equação ou fenômeno da natureza, ou mesmo alguém desenvolveu alguma tecnologia que vai revolucionar o planeta.

Você lê a notícia, fica interessado chega até o final e se depara com as fontes, ou mesmo antes encontra em algum hiperlink no meio do texto que te leva para o artigo científico. Sua curiosidade é tanta que tal qual o incauto Simba você resolve desbravar essa parte da savana. Pobre coitado, você está perdido e só lhe restará esquecer os problemas, e entender que isso é viver, é aprender, hakuna matata.

Figura 1. Gráfico com resultados superdifícies que só fará sentido em algum outro canto do texto

Figura 1. Gráfico com resultados superdifícies que só fará sentido em algum outro canto do texto

A experiência de ler um artigo científico pela primeira vez é normalmente frustrante. Há uma série de jargões (por normalmente, leia-se que os dados se comportam segundo a curva padrão de Gauss conforme verificado pelo teste de normalidade de Shappiro-Wilk ao nível de 5% … É, acho que você entendeu aonde eu quero chegar), seguidos de uma estrutura de texto rígida, além é claro de figuras que aparecem de uma hora para outra na página cuja a informação só é relevante na página seguinte. Você se sente como a jovem Lara Croft cujo o barco naufragou e agora está em uma ilha desconhecida, cheia de mistérios e com uma série de pessoas estranhas executando rituais sinistros e chamando aquilo de método científico.

A essa altura do jogo ou da leitura, muitas pessoas desistem. “A notícia é até legal, mas o artigo é muito chato” elas diriam e partem então para outra coisa, como vídeos de gatinhos, guaxinins, ou pegadinhas do SBT, talvez até se decidindo então por seguir carreira em alguma área de humanas. Brincadeira, brincadeira, a verdade é que independente da área do conhecimento a leitura de artigos científicos é um desafio, mesmo nas humanas com todas aquelas citações de mil novecentos e livros que ninguém tem (huehuehue brbrbr). Mas há aquelas pessoas que persistem, sofrem e se machucam muito, até que, um dia, surgem vitoriosos como agora intitulados de Tomb Raider.

Por isso, não tema bravo aventureiro, se você realmente se dispõe a ler e entender artigos científicos, esse post está aqui para ajudá-lo. Para alcançar esse objetivo iremos seguir a metodologia do Buzzfeed e listar alguns pontos que lhe são essenciais para sobreviver com seu entusiasmo até o fim do artigo.

  1. Entenda o jogo: artigos científicos são comunicações entre cientistas, publicadas por editoras comumente privadas. Portanto, os textos precisam ser curtos e concisos para se adequar às normas da revista, sendo assim, economizam-se palavras e tudo o que já foi anteriormente descrito por alguém é apenas mencionado na forma de citação. Logo, há muita informação condensada em um artigo, o que dificultará muito o entendimento inicial.
  2. Ler um artigo por completo não é trivial: você pode ter lido a notícia em menos de cinco minutos, mas não espere que o mesmo ocorra na leitura do seu primeiro artigo. Como dito anteriormente, há muita informação condensada em um artigo e para entender é preciso destrinchar cada uma delas. Por isso, ler um artigo em pouco mais de cinco minutos é uma atividade reservada a pesquisadores experientes, pessoas treinadas em gravidade aumentada em 10 vezes, supersayajins, ou mutantes. Sendo assim, separe algumas boas horas, talvez até dias para se dedicar a leitura. Entender cada termo ou equação será uma aventura por si só, como sidequests que você precisa cumprir para adquirir os itens necessário para enfrentar o chefão da fase.
  3. Palavras-chave: o desafio está lançado, cada uma das palavras é um monstrinho que você deve capturar e levar consigo por toda a jornada do artigo. Não se esqueça, para entender o artigo é preciso conhecer bem os termos, muitas vezes isso exigirá de você procurar informações além do artigo. Não desista, siga em frente, temos que pegar todas as palavras-chave.
  4. O caminho mais curto nem sempre é uma linha reta: nem sempre a decisão de ler um artigo científico específico é o certo, principalmente em se tratando de artigos encontrados a esmo por meio de links de notícias. Existem determinados tipos de artigos muito mais propícios para isso, com informações bem mais detalhadas, chamados de revisões de literatura. Eles costumam conter mais detalhes sobre a área do seu interesse. Normalmente são textos muito mais longos (para usar uma escala bem científica seria algo como um textão do Facebook), mas a leitura compensa, muitos jargões encontram-se descritos e isso lhe deixará muito mais preparado para encarar os artigos mais curtos e condensados. É como assistir Game of Thrones já tendo lido os livros, é muito mais confortável e evita-se muito sofrimento.
  5. Desenhe: faça anotações, rabiscos, diagramas, mapas mentais, palácios mentais, mas de alguma forma mantenha registros do que está entendendo. Cada parágrafo é como uma fase de algum jogo de plataforma com encanadores italianos, sempre haverá um power up que lhe será útil para a próxima fase. Além disso, evite passar para o próximo paragrafo sem estar confiante de que entendeu o anterior.
  6. O fim é apenas o começo: as referências de um artigo contêm toda a informação prévia relevante para aquele trabalho, muitas informações condensadas. É como a filmografia do Tarantino, cada um dos artigos científicos parece contar uma história independente, mas estão todos interligados em uma única história e quanto mais conexões você encontrar com as outras histórias, mais divertido fica, tanto para os artigos quanto para a filmografia do Tarantino.

No fim, são passos simples. Na ciência não existem grandes segredos ocultos ou fórmulas secretas que lhe darão acesso instantâneo a todo o conhecimento do mundo. É um processo que exige muito esforço, força de vontade e dedicação, aqueles 99% de transpiração (o 1% pode ser reservado para inspiração ou para o Safadão, fica à sua escolha). O caminho é árduo, mas a vista é bonita e compensa, pois conseguimos enxergar mais longe sobre os ombros de gigantes. Só não se engane, a escalada é tortuosa, mas muito divertida.

Referências:

RUBEN, Adam. How to read a scientific paper. Science, 2016.

PURUGGANAN, Mary; HEWITT, Jan. How to read a scientific article. Rice University, 2004.