Sejam todos muito bem-vindos à mais um capítulo da Parada dos Museus! Aqui nossos redatores compartilharão com vocês os melhores museus, centros culturais e exposições nas cidades onde vivemos ou por onde passamos. A ideia é compartilhar atividades culturais e nossas experiências e mostrar que museu também é ciência!

Na primeira Parada dos Museus falei do Museu do Amanhã, e hoje vou contar da minha experiência em um outro espaço tão tecnológico quanto o primeiro: o centro cultural Oi Futuro.

O centro cultural Oi Futuro está abrigado onde, em 1918, foi instalado um dos primeiros pontos de telefonia do país – a Estação Beira-Mar. O prédio foi transformado no museu do telefone em 1981 e ao longo dos anos foi ganhando um viés mais contemporâneo e moderno. Minha visita me guiou por experiências tecnológicas e sensoriais, me mostrando o espaço protegido pelos portões de ferro que eu olhei por anos, mas que nunca havia adentrado. No limiar entre os bairros do Flamengo e do Catete, o Oi Futuro é um oásis cultural no meio de uma das regiões mais residenciais da cidade. Mas, acima de tudo, as exposições do Oi Futuro naquela tarde de sábado foram o que todo espaço cultural deveria ser: uma porta para questionamentos, pensamentos e reflexões.

Um dos andares do prédio tem como exposição permanente o Museu das Telecomunicações, que transpassa presente, passado e futuro. Dois dos pontos altos da minha visita a esta exposição foram o domo das redes e a Sala dos Profetas. O primeiro é uma semiesfera presa ao chão com projeções diversas acompanhadas de um áudio sobre conectividade e vida em rede. A ideia da obra é que estamos todos, continua e intrinsecamente, conectados conosco mesmos e com o mundo. O texto que acompanha esta parte da exposição nos faz refletir sobre muitos pontos da nossa atual relação com o mundo e com a tecnologia. A voz no seu ouvido te faz pensar ao sussurrar que “é possível que a primeira forma de comunicação em massa tenha sido o boato”, que “antigamente o ponto mais alto das cidades eram as torres da igreja, mas que hoje podemos dizer que as torres de transmissão são as torres de uma nova religião” e ao fazer uma citação brilhante ao conto “A Última Pergunta” de Asimov. Pessoalmente, foi bastante reflexivo pensar o quão conectada eu estou com o mundo ao meu redor e projetar meu impacto sobre ele (esse pensamento foi multiplicado por mil se considerarmos que minha visita aconteceu na véspera da eleição de segundo turno). Mais do que isso, me levou a questionar se estou tão conectada a mim mesma e às pessoas que eu amo quanto fico conectada à tela que olho ao escrever este texto e à internet que usarei para postá-lo.

A Sala dos Profetas é uma outra super ferramenta disponível aos visitantes. Antes de entrar na sala você seleciona um “profeta”, mas a lista não é bem a que você imagina. Dentre os nome religiosos aparecem Buda, mas o acompanham personalidades como Einstein, Leonardo da Vinci, Platão e até Oscar Niemeyer, já que o entendimento do curadores é que profeta é quem tem uma “visão futurista da humanidade”. Esta atração une projeções, espaço físico e efeito 3D para dar ao visitante a sensação de estar vendo o próprio profeta falar.

H@th0t&$ b0 PP@tu&g0g No momento da minha visita (27 de outubro de 2018), outras duas exposições ocupavam os andares do prédio: Existência Numérica e o Festival Multiplicidades 2018.

No 4oe 5oníveis estão as obras de “Existência Numérica”, cuja idealização circunda a ideia de que a modernidade deu aos artistas mais um material com o qual trabalhar: dados numéricos. As obras transformam informações que todos nós deixamos no mundo (como rotas de GPS, visitas às redes sociais e pegadas online) para criar imagens e projetos incríveis. Alguns dos que mais me marcaram foi “Dendrocronologia de imigração” e “Vasos sanguíneos de Lisboa” de Pedro Miguel Cruz e “Redes de Nós” de Doris Kosminsky e Claudio Esperança.

“Dendrocronologia de imigração” é um trabalho visualmente mágico que transforma os dados numéricos de imigração no mundo e fluxos migratórios para o Rio de Janeiro em imagens que remontam à anatomia vegetal. A obra marca as décadas e volumes de imigração da mesma maneira que os anéis marcam a passagem do tempo para as plantas. Mas, ao invés de seiva e nutrientes, as obras trazem milhares de pontos coloridos que mostram a origem dos imigrantes e indicam visualmente as grandes ondas migratórias da história.

“Dendrocronologia de imigração” de Pedro Miguel Cruz

A peça “Vasos sanguíneos de Lisboa” transforma a capital lusitana num grande coração cujas veias e artérias pulsam no ritmo do fluxo de veículos. Com isso, as imagens são mais lentas e contidas nas horas da madrugada, ganhando velocidade e tamanho nas horas de rush da manhã e do final do dia. O pulsar do trânsito lisboeto me fez pensar em como todos nós somos o sangue da cidade onde vivemos, que o espaço urbano pulsa no nosso ritmo, que ele vive quando a gente vive.

Ainda na galeria do 4oandar está a obra dinâmica “Redes de nós”, em que você digita seu nome e o computador indica quantas pessoas são suas xarás. Foi onde aprendi que o nome “Isabela” começou a se popularizar nos anos 1990 (mamãe pegando tendências cedo), mas que o boom mesmo começa nos anos 2000 com um salto exponencial. [Muitas Isabelas estão crescendo por aí e se eu sirvo de modelo, se preparem, Isabelas podem implodir o mundo.]

No andar térreo, pátio e nível 1 estava Multiplicidades, um festival anual do Oi Futuro que neste ano adotou o tema “Espaços utópicos”. Uma das principais inspirações para essa curadoria vem do enorme empreendimento imobiliário que cresce no terreno ao lado do centro cultural. Eu, que passo na frente do Oi Futuro diariamente, já posso ver os primeiros efeitos do prédio vizinho que sequer foi erguido ainda: a parede externa do centro cultural que servia como uma enorme tela para a exposição de obras já não é mais completamente visível da rua e o pátio de entrada está reduzido a cerca de 40% do espaço normal devido às medidas de contenção contra acidentes e desabamentos. Já dentro do prédio, “Espaços Utópicos” propõe questionamentos mais amplos: “Que novos diálogos são possíveis entre os cidadãos e a urbe?” “Que movimentos territoriais ainda não pensados podem surgir do coletivo?” “para onde caminham as cidades, nesses nossos tempos tão conturbados?”. O prédio vizinho pode ter sido só o estopim de um movimento artístico, mas o centro cultural Oi Futuro é, na verdade, um grande centro de reflexão e pensamento sobre a cidade.

Outra estrela de “Espaços Utópicos” é o coletivo Numen, que montou uma enorme estrutura que desafia o espaço lógico apenas usando fita adesiva. Os visitantes são convidados a entrar na peça e experimentá-la. Não há caminho certo para entrar ou sair, não há movimento certo para se fazer ou não fazer, é uma obra puramente sensorial. Uma continuidade da obra de proporções gigantescas estava montada no prédio anexo, mas já havia sido retirada quando da minha visita (eu a vi quando fui votar, já que ela adornava as urnas eletrônicas no primeiro turno).

Coletivo Numen

Ainda no térreo, a obra “Iceberg” tem como proposta transformar nossas mentes em um enorme bloco de gelo. Os óculos de realidade virtual te permitem “visualizar” a estrutura da sua mente: Acima da água, sua consciência. Abaixo dela (e quase infinita) sua subconsciência. E tudo termina num grande derretimento, já que mentes não são fixas, são fluidas e estão continuamente em construção e desconstrução.

Se o objetivo principal de museus e centros culturais é despertar visões de mundo diferentes do nosso cotidiano, o Oi Futuro Flamengo é uma obra-prima. Desde a exposição permanente sobre a história da comunicação até o engajamento com o ambiente imediatamente externo aos portões do prédio, as exposições me fizeram pensar no espaço que eu ocupo no mundo hoje e naquele que quero ocupar no futuro. Me fizeram enxergar o mundo em rede, ver a mente se derreter porque a impermanência é a regra, não a exceção. Espero que o Espaço Oi Futuro (e qualquer outro espaço cultural) desperte em você tantas outras reflexões e que você saia um visitante melhor do que entrou.

 

Data da Visita: 27 de outubro de 2o18.

Serviço (retirado do folheto de programação)

Centro Cultural Oi Futuro

Rua Dois de Dezembro 63

(21) 3131-3060

Funcionamento: de terça a domingo de 11:00 às 20:00.

Agendamento do programa educativo: [email protected]