Em uma das várias pegadinhas que se encontram neste mundo maravilhoso que veio para ficar chamado internetuma em particular chama a atenção devido ao seu método para enganar o cérebro. Ela consiste no seguinte procedimento: o indivíduo é posto a observar um braço falso refletido no espelho enquanto seu braço verdadeiro é posto atrás do espelho de modo que possa apenas observar o membro falso, e, após receber pequenos estímulos como de objetos frios e sensíveis por um período de tempo, de repente – BAAAM!!! – uma martelada no membro falso faz com que o individuo assuste e até relata sentir dor.

O que não foi explicado no parágrafo anterior foi que a pessoa que aplica a pegadinha ao realizar o estímulo no membro falso, realiza também sem que o individuo que está “sendo enganado” observe, os mesmos estímulos no membro verdadeiro. A tal reação se dá devido a estruturas encontradas no lobo frontal e parietal do nosso cérebro chamadas neurônios espelhos. Estes, que no momento em que você esta lendo esse texto fazem sentir uma coceira ou bocejar quando vê alguém bocejar. Mas, afinal o que são esses neurônios, e como eles vêm sendo utilizados para tratamento?

Os neurônios espelhos (NE) foram descritos pela primeira vez no início da década de 90, num estudo realizado com macacos, no qual foi observado que os NE eram ativados nos animais quando realizavam uma atividade específica ou quando observavam outros indivíduos realizando as mesmas tarefas. Dentre tantas funções eles estão envolvidos na função do comportamento humano, empatia, comunicação não verbal, dentre outras. E as disfunções estão ligadas ao autismo.

Chegamos então numa técnica que assim como a pegadinha citada acima ativa os NE, intitulada terapia de espelho (TE). A TE é uma terapia de baixo custo e de fácil aplicabilidade, é utilizada de forma similar da pegadinha. Nela, o espelho que é posicionado entre os membros superiores (braço e mãos) do indivíduo de modo sagital. Com a intenção de reeducar o cérebro e promover uma ilusão visual e cinestésica, o indivíduo realiza uma série de movimentos com o membro saudável que é refletido pelo espelho e interpretado como se fossem realizados pelo membro afetado. Ou seja, o individuo que está recebendo o tratamento acaba por enganar o seu cérebro devido aos neurônios espelho, de modo que interpreta como se o membro acometido e impossibilitado de realizar movimentos estivesse realizando.

Usada inicialmente nos anos 90 como no tratamento de dores em Membros Fantasmas (define quando o indivíduo perde algum membro, mas ainda assim sente dores no local). Atualmente a técnica vem sendo utilizada no tratamento complementar de pessoas que sofreram de Acidente Vascular Encefálico (AVE), pois apresentam várias sequelas, como: déficit de equilíbrio, cotovelo em flexão e perna em extensão; de apenas um lado do corpo, geralmente do lado direito, a mão e os dedos encontram-se em flexão de punho e dedos; e isso acaba por impossibilitar o indivíduo de realizar as atividades da vida diária.

feedback visual promovido pelo espelho auxilia na organização dos estímulos perceptuais, visual e na provável reorganização do sistema nervoso central, e também na plasticidade do córtex pré-motor, podendo assim interromper o ciclo da dor, melhorando a força muscular e a incapacidade visual.

Vale lembrar que a Terapia de Espelho é uma terapia complementar, sendo de fundamental importância a fisioterapia no tratamento e recuperação de pacientes de pós AVE.

Enfim, estou aberto à dúvidas e sugestões, segue abaixo alguma das referências utilizadas no texto.

CONCEIÇÃO, L.P ; SOUZA,P ; CARDOSO, L. A;  A influência da terapia por exercício com espelho nas limitações funcionais dos pacientes hemiparéticos: uma revisão sistemática. 2012.

COSTA, F.A;  Silva D.L; ROCHA V.M : Estado neurológico e cognição de pacientes pós-acidente vascular cerebral. Rev Esc de Enferm USP. 2011;45(5):1083-8.

LAMEIDA, A.P; GAWRYSZEWSKI, L.G; JR. P, A : Neurônios espelhos, Psicologia USP, 2006, 17(4), 123-133

PEREIRA, A.F;  SILVA, A.M; REIS, L.M; KOUSUR,C.; SILVA, A.T: Terapia Espelho na Reabilitação do Membro Superior Parético – Relato de Caso, 2013.

SATHIAN K, GREENSPAN A.I, WOLF S..L. Doing it with mirrors: a case study of a novel approach to neurorehabilitation. Neurorehabil Neural Repair. 2000;14(1):73-6.

 Link da pegadinha citada no texto


Antonio Lucas dos Santos

Cearense orgulhoso, Fisioterapeuta, apaixonado por cinema e séries, é apenas uma poeira estelar :-)